‘Dados abertos são a última fronteira da transparência'

O livre acesso à informação foi discutido em evento em Salvador

  • Foto do(a) author(a) Andreia Santana
  • Andreia Santana

Publicado em 12 de julho de 2018 às 21:55

- Atualizado há um ano

. Crédito: Fotos: Leandro Nunes Santos/CRCBA

Imagine poder acessar todas as planilhas com os gastos de viagens de trabalho dos ocupantes de cargos públicos no exercício do poder, verificando cada valor recebido em diárias e cada despesa feita, item por item. Agora, imagine que você tem acesso ao registro de todas as multas de trânsito aplicadas por radares nas rodovias federais do país no espaço de 24 meses. Para que serve essa quantidade enorme de informações? A resposta é simples: para exercer a cidadania.

No primeiro exemplo, dá para ficar sabendo, por exemplo, se os gestores públicos gastam mais do que devem nas suas viagens, desperdiçando o dinheiro dos contribuintes. Já na segunda opção, é possível verificar se em determinado trecho de rodovia o índice de multas é tão grande porque o local é perigoso e necessita de melhor sinalização – o que pode salvar vidas -, ou ainda se naquele local têm radares defeituosos multando motoristas inocentes.

Tudo isso é possível por causa dos ‘dados abertos’, que corresponde a toda a informação disponibilizada para livre acesso de todos. “Os dados abertos são a última fronteira da transparência, quando as pessoas têm acesso as informações completas, acessíveis, com o máximo de granulidade, ou seja, com o detalhamento de cada item”, afirma George Santiago, do Observatório Social de Santo Antônio de Jesus, que nesta quinta-feira, 12, fez a palestra Controle Social e participação na Era Digital, no Seminário Regional de Participação e Controle Social, que ocorreu no Campus da Unifacs, no Caminho das Árvores. George Santiago, do Observatório Social de Santo Antonio de Jesus, explicou o conceito de dados abertos George Santiago é um entusiasta do uso da tecnologia para permitir o acesso, tratamento e consulta dos dados governamentais abertos. No Observatório Social de Santo Antonio de Jesus, por exemplo, é desenvolvido o Painel de Monitoramento da Folha de Pessoal dos Municípios do Estado da Bahia, ferramenta de fiscalização para cidadãos, organizações não-governamentais e órgãos públicos de controle.“Dados abertos permitem visualizar diversos comportamentos como por exemplo identificar a ocorrência de nepotismo cruzado nas secretarias municipais, que é quando um secretário, por exemplo, emprega o parente do outro e vice-versa” (George Santiago)Outros usos

Fiscalizar órgãos públicos, no entanto, é só uma das muitas utilidades no uso de dados abertos, lembra o editor de inovação do CORREIO e gerente de projetos da Escola de Dados da Bahia, Juan Torres, que também foi um dos palestrantes no evento desta quinta, promovido pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União (CGU), com os apoios do Conselho Regional de Contabilidade do Estado da Bahia (CRCBA) e Academia Brasileira de Ciências Contábeis (Abracicon). Juan Torres, do CORREIO e da Escola de Dados da Bahia, lembrou que os dados abertos tem outros usos além de fiscalizar órgãos públicos Juan levou para a plateia do evento, exemplos bem-sucedidos do CORREIO com o Jornalismo de Dados, como a série Mil Vidas, iniciada em 2011 e que, de lá para cá, reúne e analisa as informações sobre mortes violentas ocorridas, ano a ano, em Salvador e Região Metropolitana, utilizando informações disponibilizadas nos boletins da Secretaria de Segurança Pública.“É importante pensar em dados para além das contas públicas. No jornalismo, por exemplo, existe uma máxima que diz que a notícia está nas exceções. No jornalismo de dados é o inverso, as melhores histórias estão nos padrões”, (Juan Torres) O editor de inovação do CORREIO citou ainda outros exemplos de reportagens especiais do jornal, com a utilização de dados abertos, como uma matéria sobre o suposto baby boom carnavalesco que acabou demonstrando, na verdade,  que a maioria dos nascimentos em Salvador não ocorrem após o Carnaval, como é crença do senso comum, mas nove meses depois do São João.

“Fizemos a análise de 10 anos de informações e descobrimos que os picos de nascimento ocorrem em março, desmistificando a ideia de que as pessoas fazem mais filhos no Carnaval”, contou Juan, que em 8 de agosto irá ministrar a oficina Dados abertos e robôs: a revolução nas cidades pelo cidadão, atividade aberta ao público que ocorrerá no seminário Sustentabilidade do Agora, dentro da programação do Fórum Agenda Bahia 2018, evento realizado pelo CORREIO, com patrocínio da Revita, e apoio institucional da Federação das Indústrias da Bahia (Fieb), Fundação Rockefeller e Rede Bahia.

Os dados abertos representam uma das vertentes do Big Data, grandes conjuntos de dados armazenados, que será discutido no painel Sustentabilidade do Agora: como pessoas e cidades se preparam para Era Cognitiva?, outra atividade do seminário Sustentabilidade do Agora. Para participar, você pode se inscrever aqui.

Cidadão protagonista

Presente ao evento na Unifacs, o superintendente da CGU na Bahia, Ronaldo Machado de Oliveira, afirma que o órgão já vem há algum tempo tentando conscientizar os cidadãos sobre a participação social na gestão pública, disseminação da cultura da transparência e controle social. 

“O cidadão é o beneficiário final das políticas públicas. É ele quem sabe se funciona, não funciona, se atinge o objetivo. E é quem pode sugerir instrumentos. Esse evento serve para auxiliar o cidadão nas ferramentas disponíveis para exercer o controle social, participando ativamente na gestão e políticas públicas e no combate à corrupção”, afirmou Ronaldo Machado de Oliveira. Antonio Carlos Ribeiro, presidente do CRCBA, enfatizou a necessidade de se criar uma cultura da transparência Segundo o presidente do CRCBA, Antonio Carlos Ribeiro da Silva, transparência e controle social estão entre os temas mais discutidos atualmente pela entidade. O Conselho defende que as informações se tornem públicas para que o cidadão seja esclarecido e possa, assim, exercer a cidadania.

“Uma das coisas que considero prioritárias para que esse controle social possa ocorrer, eu chamo de empatia. Tenho de me colocar no lugar do outro. Quem é esse cidadão que está junto com o estado acompanhando o gasto público? Outro item é a experimentação, experienciar as possibilidades para que o cidadão possa ser melhor informado e assim criar a cultura para envolver as pessoas no controle social”, defende o presidente.