Das missas às revoltas: conheça um pouco da história dos sinos

Em Salvador, entre os mais antigos estão os sinos da Catedral Basílica e da Câmara Municipal

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  • Luan Santos

Publicado em 11 de maio de 2019 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Marina Silva/CORREIO

Até o início do século XIX, maior parte dos sinos da igrejas no Brasil veio de Portugal (Foto: Marina Silva/CORREIO) Criados na China há mais de 4 mil anos, os sinos foram integrados pela Igreja Católica no século V e, desde então, ganharam uma série de funções e simbologias ao longo destes mais de 1600 anos - desde chamar para celebrações até convocar para protestos e mobilizações. 

Nos primórdios, eles também serviam para avisar às pessoas sobre os horários. "Os sinos são para chamar os fiéis para as missas ou para algum sepultamento. No decorrer da história, o sino servia como 'mensageiro' da guerra, da paz, de boas e más notícias. Em algumas aldeias, assinalavam as horas no tempo em que não havia relógios", conta Irmão Jorge Mendes, vice-coordenador da Comissão de Arte Sacra da Arquidiocese de Salvador.

Ele explica que, para a igreja, o sino é um sinal de chamado. Nesta sexta-feira (10), os sinos da Catedral Basílica de Salvador voltaram a tocar depois de 50 anos em silêncio."Devemos retomar o hábito em nossa cidade do tocar ao meio-dia e às 18h os sinos, e em várias ocasiões especiais. Creio que o badalar dos sinos não só nos desperta para algo, como nos faz parar e não só ouvir, mas voltar o nosso olhar em contemplação para a igreja", diz. Ele lembra que o sino tem toques diferentes para distinguir o momento e o que está sendo anunciado. "A intensidade e o ritmo das badaladas expressam sentimentos de alegria, dor, reverência, saudade, respeito, dignidade, confiança, esperança, zelo, paz e plenitude, entre muitos outros. Anuncia mensagens que alcançam muitas pessoas ao mesmo tempo", afirma. 

Irmão Jorge conta, ainda, que, tradicionalmente, os sinos são badalados todos os dias no horário da manhã, ao meio dia e à tarde, em feriado religioso, uma hora ou meia hora antes do culto, no início e final dos cultos, batismos, confirmações, casamentos e óbitos. "O sinal de três batidas lembra a Santíssima Trindade, ou seja: Deus Pai, Filho e Espírito Santo", complementa. 

Na Bahia Um dos mais antigos de Salvador é o sino que ficava na Câmara de Vereadores. Embora não haja data precisa de sua chegada à capital, sabe-se que ele ficou por lá até 1886 e há registros de que ele já tocava em 1627, de acordo com escrituras do Atlas da Câmara de Salvador.

Segundo o documento, o sino era apontado como um meio para chamar o povo para as mais diversas finalidades, desde as sociais até as religiosas. No livro a Cidade do Salvador, consta que este mesmo sino da Câmara chamou o povo para protestar contra a alta do imposto sobre o sal de 400 gramas, que causou grande revolta na época.  Igreja de São Francisco, no Centro Histórico de Salvador (Foto: Marina Silva/CORREIO) No livro 'A Morte É Uma Festa: ritos fúnebres e revolta popular no Brasil no Século XIX', o historiador João José Reis narra outro fato curioso convocado por sinos. Foi a chamada 'Cemiterada', em 25 de outubro de 1836, revolta de participação popular organizada pelas irmandades e ordens terceiras de Salvador contra a criação do Cemitério do Campo Santo e, principalmente, contra a lei que entraria em vigor proibindo o tradicional costume de fazer enterros nas igrejas. Para convocar o povo, que se reuniu no Terreiro de Jesus, vários sinos foram tocados na cidade. 

No Brasil, até o início do século XIX, a maior parte dos sinos das igrejas era importada de Portugal. Isso só mudou a partir de 1808, quando a família real chegou ao Brasil e, com ela, trouxe o fundidor João Batista Jardineiro. A Bahia, inclusive, é parte importante da história dos sinos no Brasil. Foi aqui que, em 1707, foi realizada a padronização dos toques de sino no Brasil, em acordo formalizado com Portugal, por meio de documento distribuído às demais cidades. 

O baiano João Carreira foi responsável por fundir o primeiro sino da Igreja do Pelourinho, em 1756. No ano seguinte, André Coelho Vidigal fundiu o primeiro sino da Igreja de Santo Antonio da Mouraria. Já Manoel de Vargas Leal foi considerado um dos maiores fundidores da Bahia e do Brasil, sendo responsável pelo sino da Igreja de Conceição da Praia, em 1869, além do primeiro do Bonfim, em 1834.

História Criado na China há mais de 4 mil anos, o sino era utilizado como meio de comunicação, tendo como objetivo contar horas ou avisar aos trabalhadores o horário de início e fim do trabalho. De lá, foi difundido pela Ásia, Oriente Médio e Europa, sendo utilizado como meios de comunicação e como instrumentos musicais. O primeiro documento que cita o sino como instrumento musical é atribuido ao compositor alemão Georg Melchior Hoffmann, que viveu no século XVII. 

O uso pelo Cristianismo é datado do século V, por volta do ano 400, em mosteiros da região da Campanha, no sul da Itália. Justamente por isso, o sino é chamado também de campana ou campainha, além de o local onde fica o objeto nas igrejas ser nominado de campanário. Sino da Igreja de São Domingos Gusmão, no Pelourinho, em Salvador (Foto: Marina Silva/CORREIO) Inicialmente, eram usados apenas para comunicação com monges, especialmente para convocá-los para a realização de orações na capela. Mais tarde, passou a ser usado também para convocar os fiéis para as celebrações e outros atos. Atualmente, os sinos costumam soar suas badaladas às 12h e às 18h, quando os fiéis devem para para rezar a Ave Maria, além de momentos antes e depois das missas.

Em Minas Gerais, o toque dos sinos do estado foi registrado como patrimônio nacional pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). 

Considerado o maior sino do mundo, o Tzar Kolokol, na Catedral de Assunção, em Moscou (Rússia), foi fundido em 1733 e mede sete metros de altura, seis de diâmetro e pesa 201 toneladas. Outros dois sinos russos vêm em seguida entre os maiores: o Boris Gudonof, com 175 toneladas, e o Santo Ivor, com 58 toneladas.