Davi Fiúza: MP-BA fará investigação independente; promotora explica denúncias

Sete PMs são acusados de sequestro e cárcere privado

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  • Bruno Wendel

Publicado em 10 de setembro de 2018 às 16:13

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Foto: Reprodução Embora tenha denunciado sete policiais militares pelo sequestro e cárcere privado de Davi Santos Fiúza, 16 anos, no dia 24 de outubro de 2014, durante uma operação da PM no bairro de São Cristóvão, em Salvador, o Ministério Público Estadual (MP-BA) vai apurar, de forma independente, o paradeiro do adolescente. Para isso, a promotoria decidiu instaurar um Procedimento de Investigação Criminal (PIC).

“Será necessário para que possamos lograr êxito, localizando o Davi vivo ou morto. Existem ainda alguns pontos que precisam ser esclarecidos”, declarou a promotora Ana Rita Cerqueira Nascimento, durante coletiva de imprensa, na manhã desta segunda-feira (10), quando detalhou a denúncia feita contra sete PMs pelo desaparecimento do rapaz.

A promotora preferiu não dizer quais são os pontos que foram levantados pelo MP-BA para não prejudicar a próxima investigação. A única informação confirmada é que a apuração será realizada pelo Grupo Especial de Combate às Organizações Criminosas e Investigações Criminais (Gaeco), do MP-BA.

Caso haja indícios de que tenha havido o crime de homicídio, as provas serão acrescentadas ao processo. “É feito um aditamento às investigações”, explicou Ana Rita.

As acusações formais contra os sete PMs foram feitas na semana passada pela própria promotora e pelo promotor Gildásio Galrão. O processo foi distribuído para a 2ª Vara de Crimes Praticados contra o Menor.

Segundo a acusação do MP-BA, no dia do crime, os policiais participavam de um curso de nivelamento realizado pela 49ª Companhia Independente da Polícia Militar (CIPM/São Cristovão) e pelo Pelotão Especial Tático Operacional (Peto) com prática de incursão nas localidades do Cassange, Planeta dos Macacos e Vila Verde, dentre outras.

Provas Durante a coletiva, a promotora Ana Rita Nascimento justificou por que foi de encontro com a investigação da Polícia Civil, que indiciou no início de agosto 17 PMs por homicídio qualificado – em outro momento, a Polícia Civil havia indiciado 23 PMs. 

Segundo ela, faltam provas que apontem que os acusados tenham matado Davi Fiúza, e também há ausência de perícias que poderiam mudar o entendimento do MP-BA. “Pelo menos nos autos encaminhados para mim não constam as perícias das viaturas e armas dos policiais, importantes para a investigação do caso”, declarou a promotora.

De acordo com o MP-BA, além do GPS das viaturas que colocaram os policiais no local do desaparecimento de Davi Fiúza, os relatos de uma testemunha que residia no local dão detalhes da abordagem dos PMs ao adolescente.

Ele foi abordado na Rua São Jorge de Baixo por quatro policiais armados e sem fardamento, que o colocaram com as mãos na nuca e de joelhos, próximo a um veículo azul e branco. Os outros três policiais fardados desceram até a rua através da Travessa Pitangueiras, indo ao encontro dos demais. Uma testemunha passou pelo grupo para ir à casa de uma vizinha e, no retorno, viu o veículo passando e os policiais fardados retornando andando. Foi a última vez que o adolescente foi visto na comunidade.

“Dentro desse arcabouço, não se tem, até aqui, como falar como crime de homicídio. Até agora o que nós temos, até aqui, com o relato da própria testemunha, nenhum ato de violência”, declarou a promotora.

Ela também falou em responsabilidade ao explicar a redução no número de denunciados. “Ao contrário do que a autoridade policial informou no inquérito, que não é possível individualizar a conduta, e indiciando 17 policiais por homicídio, nós oferecemos com responsabilidade denúncias de crime de sequestros. Temos como demonstrar que os policiais estavam no local, porque o GPS os colocam lá quando o menino é abordado. Todos são da 49ª CIPM”, comentou.

A testemunha citada no processo está num programa de proteção. “Ela vê o momento abordagem. Ela procura não olhar muito diretamente. Ela não queria identificar rostos e vai na casa de uma vizinha por medo. Em suas declarações, ela diz ‘não vi mais’, ‘não quis ver, deixei ele lá falando com eles’. A testemunha está inserida num programa de proteção à testemunha. Não foi ameaçada, mas ela ainda morava lá e por prudência achamos por bem colocá-la no programa. Ela não está mais aqui (em Salvador)”, detalhou a promotora Ana Rita.

Abordagens No dia em que Davi Fiúza desapareceu, policiais militares realizaram uma operação do curso de nivelamento da 49ª CIPM, feita em conjunto com o Peto, tendo sido escolhidas as localidades de Vila Verde, onde o adolescente morava, Cassange, Planeta dos Macacos, dentre outras, através de instrução prática na forma de incursão nos locais a 165 pessoas, entre abordagens em veículos e pessoas.

“Nos depoimentos, eles (policiais) disseram que nunca tinham abordado Davi Fiúza. Inclusive os policiais que foram denunciados com base na testemunha e no GPS. Eles negaram tudo”, disse a promotora.

Entre os sete denunciados da 49ª CIPM, quatro são do Serviço de Missões Especiais (SME). Alguns policiais ouvidos disseram que os PMs da SME não participaram da abordagem ao adolescente, mas o depoimento de um PM da unidade – uma das seis testemunhas ouvidas no inquérito –, disse o contrário, colocando os PMs da SME na cena do crime.

“É um caso que teve grande repercussão no estado. Já tem quatro anos. Só que ainda faltavam algumas diligências a serem feitas. O inquérito voltou no final de junho para mim com 11 volumes”, concluiu a promotora, que aguarda a pronunciamento da Justiça. Esta vai decidir se acata ou não a denúncia. Não há previsão de que essa decisão seja divulgada.

Posicionamento A assessoria da Polícia Militar ainda não se pronunciou sobre a denúncia feita pelo MP-BA contra os PMs, com base na investigação dos policiais civis.

O CORREIO também procurou a Polícia Civil para falar sobre o assunto. O posicionamento veio através da Secretaria da Segurança Pública (SSP-BA), que informou que “não comenta sobre inquérito que está em outra instância”. A pasta informou ainda que qualquer solicitação, de órgão competente, para novos procedimentos, será atendida. “Por fim, acrescenta que, após envio do inquérito, nada foi requisitado”, conclui o comunicado.