Diferentões: vovós e vovôs quebram o estereótipo e curtem a vida com os netos

Dia dos Avós: veja como o empoderamento, aumento da expectativa de vida, tecnologia e as mudanças nas relações transformaram essa figura nas famílias

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  • Priscila Natividade

Publicado em 26 de julho de 2021 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Arisson Marinho/ CORREIO

Kátia Maltez, tem 57 anos e é enfermeira. Adora corrida de rua, musculação,  kango jump, suas 23 tatuagens, meditação, sol e praia. Tudo isso só não supera o amor pelo seu netinho ‘Gui’, de 3 anos. “Sou uma avó bem diferente da minha e de tantas. Mas, ele é tudo para mim. Literalmente, tudo. Faço de tudo com meu neto. Sento no chão pra brincar, jogo bola, danço, canto, corro, levo para escola, para passear, viro sereia, Branca de Neve e mais o que a imaginação dele pedir. É algo mágico, desde que eu ouvi os seus batimentos no ultrassom. Parece que todo o amor do mundo invadiu meu coração”, conta.

Nesta segunda-feira (26), Dia dos Avós, esqueça o coque e o tricô. Ou, ainda, aquela figura da vovozinha frágil. “Os tempos são modernos e nós também. Sou mãe de dois filhos, tenho uma vida bastante agitada, pois além de todas as atividades da casa, também cuido do meu neto desde o seu nascimento. Me sinto mais mãe que avó. Chego a brincar e digo que somos assim grudados porque foi eu quem cortou o cordão umbilical dele. Gui me vê como uma mulher forte, um porto seguro. Aquela pessoa que passa segurança, que está sempre por perto em todas as situações”, diz Kátia. 'Gui me vê como uma mulher forte, seu porto seguro', afirma Kátia Maltez (Foto: Arisson Marinho/ CORREIO) Esse acolhimento marca presença nas relações de hoje entre netos e avós, como explica a psicóloga e coordenadora do curso de psicologia da UniRuy, Susy Rocha. “Elas têm uma participação social muito diferente. Vão para academia, tem grupos de amigos, estão nas redes sociais e, com isso, conseguem ter um diálogo mais aberto do que os pais têm com os seus próprios filhos. Pais estão cheios de expectativas e os avós já tiveram essas expectativas e, agora, eles querem curtir os netos do jeito que eles são. Então, acabam sendo mais pacientes, flexíveis e com uma cabeça mais contemporânea”, aponta.

É essa a relação que Rosa Guerra, de 61 anos, tem com os netos Maria, de 5 anos, e Guido, de 3 anos. Chef de cozinha e proprietária do Restaurante Larriquerri, ela é quem comanda toda bagunça. “Parece até brincadeira. Ser avó me transformou, me senti mais jovem, pude voltar a ser criança de novo. Muita palhaçada, vou ao shopping, praia, viajo, às vezes faço o que os pais não deixam. Como diz minha neta Maria: ‘uma esculhambação’”, ri. Para Maria e Guido, Rosa Guerra é a vovó da 'esculhambação' (Foto: Acervo Pessoal) Para ela, essa vovó(zona) super descolada é resultado do empoderamento feminino dos últimos tempos. “Graças a muitas conquistas alcançada por mulheres, pelo avanço da ciência passamos a viver mais tempo, nos mostrar mais com menos preconceitos. Eu sou uma avó que foge aos padrões estabelecidos pela sociedade. Gosto de tatuagem, gosto de estar sempre rodeada de pessoas mais jovens e curtir tudo que eles curtem. Sou uma avó sem preconceitos. Acho que por isso, minha cabeça é jovem, não me sinto velha. A velhice está na cabeça”, avalia.

A psicóloga Susy Rocha, concorda: “Essa nova terceira idade vem reconfigurar nossa imagem do que é o envelhecer. Os netos enxergam esses avós mais modernos, como um exemplo de que podem chegar nessa fase de vida tendo muita coisa a conhecer, descobrir, iniciar, transformar”.

A advogada e ciclista Vânia Reis, de 48 anos, se tornou avó no ano passado, quando o pequeno Samuel nasceu em janeiro. Agora, a filha Kaori está grávida do seu segundo bebê. Até fevereiro do ano que vem, o amor de avó vai dobrar.“Posso afirmar que Samuel é a prova de que o amor não conhece limites. Eu pensei que não poderia haver amor mais profundo do que aquele que sentimos por nossos filhos. Mas, a chegada de um neto redimensiona os afetos, dando uma sensação de que, através deles, nos perpetuaremos. Para mim, Samuel é renovação”, afirma. A advogada Vânia Reis acredita que as avós passaram a ser mais protagonistas na vida dos seus netos (Foto: Paula Fróes/ CORREIO) Apesar da rotina de trabalho demandar muito, estar com Samuel é sempre um momento único. “As pessoas estão envelhecendo de forma diferente. Os seus interesses deixaram de ser apenas envelhecer dentro de suas casas, elas reivindicam protagonismo social, o que muda também a sua forma de se relacionar com os seus netos. E com isso, nós acabamos por participar de forma mais efetiva do crescimento dos nossos netos. Com mais vigor, energia e parceria", afirma.

Novas relações Mas, nem todo mundo gerou uma vida que gerou outra. Existem as avós de coração como a aposentada Ana Cristina Pereira, 94 anos. É torcedora de paixão pelo Bahia, mantém as orações em dia para ver os netos e bisnetos protegidos, além de não abrir mão da sua cervejinha – segundo ela, o segredo de não ter doença nenhuma. “O único remédio que eu tomo é Dorflex”, diz. 

Dona Nenzinha, como é conhecida, cuidou a vida inteira de Eduardo, desde que ele nasceu. Hoje, ele tem 59 anos. Dedicação que dividiu com os outros irmãos dele - Ricardo, Leonardo e Bernado – quando saiu da plantação de café para trabalhar na casa da família. Há 4 anos, ela mora com ‘Dudu’, como o chama, carinhosamente. É avó de Mariana, Lalila, Cadu, Mateus, Bia e Henrico e bisavó de João, Pedro, Luma e Kiara.  Dona Nenzinha: 'minha cervejinha me deixa ótima' (Foto: Arisson Marinho/ CORREIO) Os filhos e netos criaram até um perfil no Instagram para ela (@vovo_da_nova_era), onde Nenzinha mostra um pouco da sua relação com os filhos e com toda a família. Recentemente, ela pintou o cabelo de azul, com a tintura que encontrou no quarto de um dos netos para ficar ainda mais na pegada moderninha.“Eu gosto de dançar, brincar, conversar. Sou muito feliz com meus filhos e netos, graças a Deus. Ave, Maria. Amo todos eles”, conta.Não é só a avó que deixou de lado a pantufa. O avô já não é mais o mesmo. Na casa de Daniele Coni, de 44 anos, quem acompanha os meninos no surf é o avô, José Eduardo de Coni, 76 anos. Ele é tão bom velhinho que, não por acaso, é o Papai Noel do Shopping Barra no Natal.

“Rafael e Daniel, de 16 e 14 anos, são a minha vida. Meus companheiros. Se ter filhos é bom, ter netos é melhor ainda. Gosto de ir a praia pra surfar, sair para comer um acarajé, passar um dia em Praia do Forte e ver jogos de futebol e Fórmula 1. Eles me veem como um avô 'maluquinho' e que adora aventuras. No passado, avós tinham um perfil de 'idosinho' mesmo que fossem jovens. Hoje, a dinâmica é diferente, sou amigo dos meus netos”, revela.   'Hoje a dinâmica é diferente, sou amigo dos meus netos', pontua José Eduardo de Coni, avô de Daniel e Rafael (Foto: Acervo Pessoal) A psicóloga Susy Rocha destaca, ainda, que o efeito mais importante dessa mudança é uma relação melhor entre os pais, crianças, jovens e os avós. “Eles se tornam inspiração. A figura dos avós é muito importante para os netos, porque eles conseguem ver as diferenças entre gerações e o quanto é necessário você perceber as mudanças com amor, acolhimento e compreensão. É mais um porto seguro, mais alguém para contar e, inclusive, uma ponte na relação pais e filhos”, completa a especialista.