E-Agro: É muita tecnologia

Feira 100 digital traz para os produtores baianos tendências inovadoras

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  • Donaldson Gomes

Publicado em 8 de dezembro de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação

Lembra da fábula de um menino disposto a trocar tudo por sementes mágicas? Pois aqui na Bahia, agricultores e pecuaristas estão conseguindo produzir a sua própria magia. Sem truques, apenas com  a ciência, produzem com quantidade e qualidade onde antes não dava nada, ou quase nada. 

Chega a ser difícil de acreditar, porém a Bahia produz na região da Chapada Diamantina vinhos com qualidade compatível ao das melhores regiões produtoras do mundo, com a Fazenda Progresso, entre outras unidades produtivas, como é o caso da Confrigo. 

Duas fazendas expositoras da feira, as empresas tem registrado resultados positivos graças aos investimentos em tecnologia e em inovação – tendências cada vez mais fortes no campo  e sempre presentes nas duas edições da feira e-Agro.  

Além de painéis sobre o assunto, a tecnologia e a inovação foi o tema de discussões que antecederam o evento, nas lives preparatórias e esteve presente também numa batalha de pitchs, quando investidores ou clientes são desafiados a apresentar seus negócios num curto espaço de tempo. Além disso, durante a feira o público teve a oportunidade de participar de uma rodada de negócios com a preseça de alguns dos principais fundos de investimentos do setor agrícola brasileiro. 

A inovação é o caminho para que o agro continue a ser a locomotiva econômica por muitos e muitos anos, avaliou a gerente de negócios na área da agricultura de precisão da John Deere, Estela Dias, durante a sua participação em um painel dedicado ao assunto. Em sua apresentação no painel sobre a Agricultura 4.0, ela lembrou que a atividade já caminha em direção à 5.0, notabilizada por um nível cada vez maior de automação. Segundo ela, este processo de evolução está acontecendo de maneira cada vez mais rápida. “A humanidade passou um longo período na Agricultura 1.0, que era marcada pela tração manual. Depois tivemos os motores à combustão, a informação ganhando cada vez mais importância e vamos caminhar rápido rumo à uma maior automatização”.  Para ela, as novas tecnologias estão acessíveis para produtores de qualquer porte. 

O CEO da BovExo, Paulo Dancieri Filho, que por muito tempo comandou a Coimma, eleita pela Forbes como uma das 10 empresas mais inovadoras do Brasil, destacou que a inovação no campo está acessível a produtores de todos os tamanhos. Para Dancieri, ainda é necessário conscientizar o produtor sobre a importância da tecnologia. “É a tecnologia quem vai nos permitir continuar ampliando a produtividade. É muito importante deixar claro que isso vai representar melhores resultados para o produtor”, destacou. Respeito ao meio ambiente Mesmo em regiões distintas e com áreas de atuação diferentes, a Agrícola Cantagalo, produtora de cacau no Sul da Bahia, e o Grupo Ipê, que atua na agropecuária, tem muita coisa em comum. Duas das fazendas modelos da e-Agro, ambas se notabilizam por uma atuação voltada para a sustentabilidade. 

A Agricola Cantagalo é uma empresa familiar que a 58 anos dedica-se à cacauicultura. Possui 14 fazendas com produção de 60 mil arrobas. Mais da metade de sua área é de mata e a produção da matéria-prima para o chocolate se dá no sistema de cabruca – que ajuda a preservar a Mata Atlântica. 

“A viabilidade do nosso negócio e o incremento do valor depende de nós e está em nossas mãos. A Cantagalo vem investindo ao longo dos últimos anos em tecnologia e em genética. Acreditamos que assim melhoraremos a nossa produtividade e agregaremos valor”, destaca Cláudia Sá, CEO Agrícola Cantagalo na apresentação da empresa durante a e-Agro. 

Já o Grupo Ipê, que atua desde 2007 em Santa Rita de Cássia, no Oeste baiano, opera de forma sustentável em todo ciclo da Agropecuária – desde o plantio de insumos para produção de alimento para bovinos, cria, recria, engorda, abate, produção de cortes fracionados, distribuição a atacadistas e varejistas e comercialização direta ao consumidor. 

O diretor de Sustentabilidade da divisão agrícola da Bayer para América Latina, Eduardo Bastos, acredita na necessidade de reunir todos os atores envolvidos no agro para tratar da agenda de sustentabilidade. Para ele, inovação, transformação digital e sustentabilidade são caminhos fundamentais para o agronegócio brasileiro. “O Brasil é reconhecido como uma potência agrícola e ambiental”, destaca. 

Cofacilitador da Coalizão, Brasil, Clima, Floresta e Agricultura e Diretor-executivo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), André Guimarães destacou a importância da temática. “Não é que é possível, é imperativo caminhar na direção do desenvolvimento agrícola de maneira sustentável. Estamos recebendo os sinais da sociedade, do mercado, do meio político neste sentido”, diz. Ele acredita que assim como setores da indústria, geração de energia e transportes precisam se desenhar, o mesmo se dará no campo. 

O presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) Marcelo Brito destacou que nenhum outro país do mundo possui os compromissos ambientais que os brasileiros. “A soja brasileira leva consigo para fora 35% de reservas legais”, diz. “Nós temos uma complementariedade em nossa produção que nos dá o direito de falar que somos um país agroambiental”, avalia. 

A coordenadora de Sustentabilidade do CASC na Cargill América do Sul, Renata Nogueira, destacou a importância de trazer mais diversidade para se encontrarem novas soluções para a busca de sustentabilidade. “O agro brasileiro já se destaca em relação à sustentabilidade e tem agricultura de ponta em diversas áreas”, ressalta. “Tem muita coisa boa acontecendo, que traz um impacto para o meio ambiente”, diz.  

Segundo ela, o avanço em relação à sustentabilidade passar por conhecer mais a cadeia. 

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Produção cada vez maior  O robusto crescimento previsto para o agronegócio brasileiro neste ano, apesar do cenário adverso, pode ter surpreendido muita gente, menos o homem do campo. Há muito tempo a agricultura e a pecuária do país fizeram uma escolha por se tornar cada vez mais tecnológica e sustentável. Agora, ano após ano, colhe os frutos desta decisão.  

E o caminho para se manter neste ritmo passa por manter a receita de sucesso. Com ela é possível produzir mais, na mesma área e com o uso de menos recursos. 

Nos últimos anos, a produtividade no campo cresceu mais de 400%, com um aumento de área no mesmo período quase dez vezes menor, destacou a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, durante a sua participação na e-Agro Bahia – Feira de Inovação e Tecnologia Agropecuária. Ela e o presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), João Martins, foram alguns dos destaques do evento, que reuniu produtores, representantes do setor público e algumas das mais importantes empresas que atuam no setor. 

“A nossa agropecuária, há muitos anos, tomou a decisão de andar sozinha, de se modernizar e cresceu”, ressaltou a ministra Tereza Cristina durante a sua apresentação. Ela destacou o avanço no volume da produção agropecuária do país que deve atingir R$ 848 bilhões este ano e se aproxima da casa do R$ 1 trilhão. 

Perspectivas O analista e consultor de mercado Alcides Torres e o especialista em planejamento e gestão estratégica Marcos Fava Neves apresentaram a perspectiva de um bom 2021 para quem vive do campo. Eles participaram do painel Cenário e Tendências do Mercado para Agropecuária, mediado pelo jornalista Jose Luiz Tejon.  Torres avaliou que a crise fez a pecuária brasileira dar um salto em 2020, movimento que deve se repetir no próximo ano, apesar de algumas dificuldades pelo caminho. “A preocupação é com o clima no próximo ano, que pode nos prejudicar. A seca apertou a janela de plantio do milho. A segunda safra ficou apertada e estoque de passagem, curto. Os preços elevados devem afetar custos de produção de suínos, frangos e bovinos”, avalia. 

“Estamos num ciclo de alta de preços e isso leva à retenção de fêmeas e matrizes. Há uma busca de proteção do capital. Existe uma expectativa de crise e o sujeito tende  a se defender neste cenário. No caso da pecuária de corte, comprando animais de reposição”, explica. O mercado de grãos também tende a permanecer aquecido, acredita. “Temos 60% da soja e 40% do milho da próxima safra comercializados”, conta. 

Fava Neves lembra que tudo muda muito rápido no agro. “Temos três Vs na agricultura”, brinca. “Variáveis variam violentamente. As nossas fábricas estão a céu aberto”. Ele lembra que as expectativas em 2020 se deterioraram muito no primeiro semestre, mas o cenário foi diverso do esperado no setor. “Houve um estímulo exportador”, lembra.

Uma feira de negócios Além de uma importante fonte de conhecimento sobre inovação e sustentabilidade, os três dias de realização da e-Agro foram marcados por intensas oportunidades de negócios. Desde os tradicionais leilões, até rodadas de negociações com investidores, passando pela inovadora Green Friday – onde fornecedores de produtos e serviços apresentaram ao mercado ofertas melhores que as encontradas na última Black Friday. 

No dia 27, a rodada de investimentos com startups reuniu alguns dos mais importantes fundos de investimentos do país, que puderam conhecer projetos inovadores de empresas de tecnologia. 

Nos três dias de evento, 3147 acessos foram registrados na plataforma, que permanece disponível até o final de janeiro. Foram 19 empresas expositoras, quatro fazendas modelo e-Agro (Agrícola Cantagalo, Fazenda Progresso, Fazenda Confrigo e Grupo Ipê), diversas startups da Bahia e outros estados brasileiros. 

O presidente da FAEB Humberto Miranda já fez lançamento do e-Agro 2021. “Este é um evento de negócios, não apenas de informação, para que ele se torne autossustentável, pague seus custos e faça parte do calendário do setor por muitos e muitos anos”, ressaltou. 

“O empresário rural é o responsável pelos grandes números que a economia tem hoje”, destacou Miranda. Ele ressaltou a importância de contar com a parceria do Sebrae no projeto, além das empresas patrocinaram a feira.  “Temos um setor agropecuário que representa mais da metade das exportações da Bahia, mais de 20% do PIB, mais de 30% dos empregos. O setor interfere na movimentação econômica inclusive dos outros setores e tem um grande poder de impacto”, completou Humberto Miranda. 

Ele explicou que a e-Agro atende uma demanda do setor agrícola não apenas na Bahia. Humberto Miranda lembrou um dado da Fundação Getúlio Vargas, de que 70% dos empreendimentos que obtêm êxito incorporaram tecnologia e inovação para alcançar o resultado.  

Aproximação O evento, que está em sua segunda edição aconteceu pela primeira vez em um formato 100% digital, em virtude da pandemia do novo coronavírus. Superintendente do Sebrae-Bahia, Jorge Khouri destacou a importância de o poder público se aproximar do setor neste momento de dificuldades. “Temos na agricultura a nossa principal atividade econômica. É importante fazer um trabalho tanto com o grande produtor quando com  os que vivem da agricultura familiar e o médio produtor”, acredita. 

Khouri cita uma pesquisa realizada pelo Sebrae nacionalmente para lembrar que  mais de 80% dos produtores já trabalham com uma visão digital.  “Meu pai dizia que o comércio só vai bem se a safra for boa. Pode ser diferente em alguns estados brasileiros, mas aqui na Bahia a principal atividade é a agricultura”. 

O presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), João Martins, destacou a importância de se discutirem políticas que permitam ao Brasil se consolidar como o grande fornecedor de alimentos para o mundo. “Nós ainda temos um país desigual. Ainda temos uma coisa em torno de 650 mil produtores que detêm mais de 80% da renda da agropecuária brasileira, enquanto mais de 4 milhões de pequenos produtores que são alijados do processo de riqueza”, destacou. 

Para o presidente da CNA só é possível fazer com que o pequeno produtor brasileiro ganhe dinheiro com o uso da tecnologia. Ele destacou um projeto do Ministério da Agricultura, com 28 mil produtores, para fornecer assistência técnica e gerencial para os produtores. 

As delícias culinárias que têm a cara da Bahia A castanha de cajú substitui perfeitamente o pinole, tradicional na culinária italiana.  “Gente, dá pra fazer até pesto de coentro”, avisa o chef. A produção agropecuária baiana oferece uma rica variedade de ingredientes capazes de agradar alguns dos mais respeitados chefs de cozinha do mundo. Foi o que o mostraram Tereza Paim e Fabrício Lemos nas realizadas durante a e-Agro. 

Depois de passar 14 anos nos Estados Unidos, onde se graduou na respeitada Le Cordon Bleu, o soteropolitano Fabrício Lemos decidiu voltar à Bahia para conhecer melhor a culinária do seu estado natal. “Descobri que o que a Bahia tem vai muito além do dendê, e olha que eu amo o dendê. É o único estado brasileiro com cinco biomas ativos – Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga, Zona Costeira e Marinha”, diz. 

Cada um destes ambientes oferece uma enorme diversidade de ingredientes, ressalta. “A missão desta live é mostrar que é possível fazer receitas fantásticas com os nossos ingredientes locais”, destacou. Fabrício Lemos explica que em todos os seus trabalhos busca o fortalecimento da agricultura familiar, a formação de pessoas e divulgar o potencial da Bahia. “É muito legal não ficar refém de outro estado”, diz. 

Tereza Paim, se diz uma apaixonada pelos saberes e sabores da Bahia. Na sua live, lançou mão do palmito, hoje facilmente encontrado pronto, lembrou. Mas contou também com queijos baianos. “Gente, na Bahia tem muito queijo bom. A região da Chapada é um ótimo exemplo. Alias, a Chapada está dando show em tudo”. 

O toque especial veio com o molho à base de um café, também da Chapada, o Latitude 13. Aí, o acompanhamento foi uma farofa sertaneja, com o típico licuri, um “produto genuinamente baiano”, lembrou a chef. “É muito importante consumirmos os produtos da Bahia. Quanto mais fizermos isso, mas riquezas iremos gerar para o nosso estado”.