Efeito covid-19: Escolas de Educação infantil começam a perder alunos

Após recomendação do MP-BA que orienta os pais a suspenderem a prestação dos serviços escolares, a Escola Kurumi já registra 15% de suspensões de contrato

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  • Priscila Natividade

Publicado em 28 de abril de 2020 às 07:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Divulgação

Escolas de educação infantil estão preocupadas com os efeitos da recomendação publicada pelo Ministério Público do estado (MP-BA), na última semana, que orienta o abatimento das mensalidades por conta da pandemia. Nos cursos de educação infantil, a orientação vai além do desconto, quando o MP-BA defende a suspensão da vigência dos contratos até o término do período de isolamento social, caso os pais não concordem com proposta de desconto ou compensação futura. 

No colégio Kurumi, localizado no bairro da Federação, a taxa de suspensão de contratos, por exemplo, já chega a 15% em menos de uma semana após a publicação da recomendação, como pontua a diretora da escola de Educação Infantil, Harmonia Ferri. Antes da pandemia, a escola tinha 70 alunos matriculados. A mensalidade custa R$ 1,2 mil, porém, foi dado um abatimento de 20%. 

“É uma situação bem delicada. A escola não para e corre o risco sim de muitas escolas de ensino infantil fecharem. É uma irresponsabilidade orientar a suspensão. O que é preciso entender é que o valor pago é referente a uma anuidade dividida em parcelas. Não é o serviço do mês. Todas essas aulas serão repostas. Isso não quer dizer que estamos deixando de cumprir os contratos”.

A diretora argumenta ainda  que é possível usar o ambiente virtual para manter a interação com as crianças nesse momento de pandemia. “Eles estão tratando tudo isso dizendo que as escolas não podem ter educação a distância, mas o que estamos fazendo hoje é o contato remoto. As crianças precisam que esta interação aconteça mesmo que virtualmente. O trabalho da escola de educação infantil abrange muita coisa além do conteúdo. É uma relação que precisa ser mantida, principalmente nesse trabalho de acolhimento”, afirma. 

Ainda que a escola não esteja trabalhando os conteúdos formais, Harmonia destaca que a Kurumi optou por trazer neste momento conteúdos que trabalham a dimensão humana. “A gente não vai nesse momento bombardear as crianças de conteúdos, mas também não estamos deixando de prestar o serviço seja com músicas, contação de histórias, comunicação via mensagens, vídeos de yoga e dicas também para os pais nesse momento de quarentena”, acrescenta. 

A escola ainda não demitiu nenhum funcionário, mas precisou reduzir a carga horária de uma parte da equipe que conta com 20 profissionais. “Se eu demitir esse funcionário hoje, essa criança quando voltar não vai encontrar mais ele no colégio. Se a escola de educação infantil quebrar todo processo de aprendizagem que iniciamos aqui também vai ficar comprometido. O medo é muito grande de que outros pais também façam essa suspensão do contrato”. 

Resposta ao MP

A Kurumi é uma das escolas que Grupo de Valorização da Educação (GVE), coletivo que reúne outras 60 instituições particulares de Salvador, Lauro de Freitas e outros municípios do estado.  O GVE divulgou na sexta-feira (24), um comunicado em resposta a orientação do MP. No documento, o grupo diz que vai protocolar oficialmente um pedido de audiência ao Ministério Público para discutir os pontos da recomendação.

As escolas argumentaram a favor do contrato firmado no início do ano letivo e dos investimentos que foram feitos em tecnologia para a inserção no ambiente virtual diante da necessidade de isolamento social. O coletivo também disse que a manutenção do quadro de professores e demais educadores representa cerca de 75% dos custos de qualquer escola, justificativa que, segundo o GVE, inviabiliza a redução de gastos durante os dias que as escolas estão fechadas.

No caso dos cursos de Educação Infantil, ainda de acordo com a carta, se a orientação do MP de suspensão de contratos for seguida, o grupo enxerga um risco muito grande destas instituições serem obrigadas a fecharem as portas.  “A orientação do MP precisa ser outra: de preservação dos pagamentos mensais, utilizando-se da economia da redução de jornada dos colaboradores para descontos para as mensalidades”, escreveu. 

Posição das escolas

Apesar de não divulgar a lista com o nome de todas as escolas que integram o Grupo de Valorização da Educação, o coletivo afirmou que a grande maioria das escolas particulares da Bahia, sobretudo, as do segmento de Educação infantil, já concederam descontos que variam de 10% a 50% nas mensalidades enquanto durar a pandemia. Porém nem todas as instituições que fazem parte do grupo vão ofertar algum tipo de redução no período. 

A recomendação do Ministério Público não obriga as escolas a seguiram as orientações. No entanto, representa a posição do órgão com relação as queixas que chegarem nas promotorias do Consumidor, caso os pais optem por acionar a Justiça no pós-pandemia. 

“O inteiro teor da presente recomendação será seguida em todos os casos concretos noticiados nas Promotorias do Consumidor da capital e em outras várias Promotorias do Estado, como parâmetro de atuação”, destacou o MP.

Ao CORREIO, o grupo disse que está aguardando uma resposta do Ministério Público sobre o agendamento da audiência e que irá protocolar um pedido oficial hoje (28).  Também está agendada para esta terça-feira, uma reunião virtual do coletivo com a Secretaria de Educação do Município. O Ministério Público não respondeu a reportagem até o fechamento da edição.

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PRINCIPAIS RECOMENDAÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Ensino Médio e Fundamental

*Abstenção por parte da escola de cobrança de juros e multas em caso de atrasos da mensalidade por prejuízos financeiros provocados pela pandemia. 

*As escolas deverão buscar todos os modos de conciliação para a manutenção do contrato, no sentido de se evitar a judicialização destas situações. 

*Apresentar para os pais a planilha de custos referente aos meses do período de suspensão das aulas, bem como a relativa ao ano letivo de 2020, elaborada sem a previsão na pandemia de covid-19.

*Conceder aos seus consumidores um desconto proporcional no valor da mensalidade de março, relativo aos dias em que não houve a prestação dos serviços, devendo esse desconto ser concedido na mensalidade do mês de abril, caso a mensalidade de março já tenha sido paga.  O mesmo procedimento deve ser adotado nos próximos meses enquanto durar a pandemia do coronavírus. 

*O valor do desconto deve ser proporcional a diminuição dos custos com a atividade presencial suspensa. Prestar esclarecimentos sobre a consequente modificação do calendário de aulas e de férias, informando também se fará a reposição integral das aulas presenciais ou se serão contabilizadas nas horas-aula as aulas não-presenciais.

*Envio de uma proposta de revisão contratual para vigorar durante o período de suspensão das atividades presenciais, com a previsão de atividades escolares de forma remota e valor mensal adaptado de acordo com as planilhas de custos referentes ao período de suspensão das aulas presenciais.

*Redução imediata do valor e suspensão de contratos acessórios, como atividades extracurriculares, alimentação e transporte, dentre outros serviços cobrados separadamente

*Não haverá cobrança de qualquer taxa ou multa por rescisão de contrato educacional durante o período da pandemia. 

Educação infantil

*A escola deve negociar uma compensação futura em decorrência da suspensão das atividades e/ou apresentar a planilha de custos, aplicando desde já o desconto, considerando as diferenciações da educação infantil.

*Caso o consumidor não concorde com a proposta, o MP recomenda que as instituições suspendam a vigência dos contratos até o término do período de isolamento social, negociando a devolução dos valores quando for o caso.

*O consumidor também poderá rescindir o contrato sem pagamento de qualquer encargo.