Em dez anos, volume de royalties da mineração na Bahia triplica

Novos produtos impulsionam desenvolvimento da mineração brasileira

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  • Donaldson Gomes

Publicado em 14 de agosto de 2019 às 04:31

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Carla Ornelas/GOVBA
. por CORREIO Gráficos

Em dez anos, o volume de royalties pago pela atividade de mineração na Bahia triplicou. Em 2009, foram arrecadados pouco mais de R$ 18 milhões com a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM). No ano passado, o volume arrecadado no estado foi um pouco acima dos R$ 53 milhões, de acordo com dados da Agência Nacional de Mineração (ANM).

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Os números, a despeito da crise que se abateu sobre a economia brasileira nos últimos anos, mostram a força da atividade, mas ainda estão longe de fazer justiça ao potencial que a Bahia tem para a mineração. Em cinco anos, entre 2013 e 2017, a comercialização da produção mineração baiana manteve-se praticamente estável, com um crescimento de 1,1%. 

Em 2017, a mineração baiana comercializou R$ 2,6 bilhões e registrou um aumento de quase 24%, após dois anos de queda, segundo dados da Secretaria de Desenvolvimento Econômico da Bahia (SDE). A secretaria estima que a atividade tem uma participação de 2% no total do Produto Interno Bruto (PIB) da Bahia. 

A atividade é responsável por pouco mais de 30 mil postos de trabalho formais e informais na Bahia, segundo levantamento da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (Pnad). A estimativa é de um total de 574 empresas em atividade. 

Entre 2013 e 2017, foi contabilizada a comercialização de 52 bens minerais lavrados na Bahia. Ouro, cobre, níquel, cromo, juntamente com produtos utilizados na construção civil e as rochas ornamentais, lideraram o ranking de produção. Mas a expectativa é a de que este desenho se modifique com a implantação da logística necessária para o escoamento de minério de ferro e outras reservas identificadas, principalmente no Sudoeste da Bahia.  “A Bahia tem diferenciais importantes em relação ao Brasil pela sua diversidade mineral e porque está se estruturando para ter uma logística eficiente”, destaca o secretário de Geologia, Mineração e Transformação Mineral do Ministério de Minas e Energia (MME), Alexandre Vidigal.  

Para o  superintendente de Atração de Negócios da Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SDE), Paulo Guimarães, a mineração está entre as atividades que tem o maior potencial de crescimento na Bahia. “Nós temos uma quantidade enorme de projetos sendo descobertos e passados para a iniciativa privada”, destaca.

É fácil explicar o potencial de crescimento da mineração. “Tudo é mineral”, resume o Rinaldo Mancin, diretor de Sustentabilidade do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram). “Para ter essa conversa por telefone, estamos utilizando praticamente toda a tabela periódica”, diz a quase 1,5 mil quilômetros de distância.  “O ser humano consome produtos minerais da hora em que ele nasce até a hora da morte”, complementa. Nos medicamentos, tem o cálcio, magnésio, ferro, lítio e por aí vai. A agricultura se tornaria uma tarefa praticamente inviável sem os suplementos. “A verdade é que toda vez que existe algum tipo de avanço na qualidade de vida, a mineração é mais demandada”, acredita.

Hoje, representantes do setor discutem o futuro da atividade. A Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM) e a Secretaria de Ciência Tecnologia e Inovação da Bahia (Secti), promovem, com o apoio do CORREIO, o 1º Fórum Internacional de Inovação e Sustentabilidade na Mineração, que tem como patrocinadores a Companhia Vale do Paramirim, Bahia Mineração (Bamin), Sindicato das Indústrias Extrativas de Minerais (Sindimiba) e a Vanádio de Maracás S/A. 

Entrevista: Paulo Misk Paulo Misk é presidente da Vanádio de Maracás (Foto: Divulgação) ‘O melhor vanádio do mundo é produzido aqui’ Em Maracás, no interior da Bahia, produz-se o vanádio de melhor qualidade no mundo. O material, praticamente desconhecido pelos menos ligados na tabela periódica serve para tornar o aço mais resistente, é útil para a indústria aeroespacial e pode ser usado para baterias de última geração. “É o mineral do futuro”, projeta o engenheiro de minas Paulo Misk, presidente da Vanádio de Maracás e do Sindimiba (associação que representa as empresas de mineração da Bahia). Além falar sobre a produção na cidade baiana, ele conversa sobre perspectivas para a mineração baiana. 

O que é o vanádio e pra que é que ele serve? É um metal, tá lá na tabela periódica. A principal função dele é reforçar o aço. Hoje, 90% do consumo dele tem essa função. Se você coloca um quilo em uma tonelada de aço, você tem um aço 80% mais resistente. Na China, eles colocam vanádio no vergalhão das construções, para tornar mais seguras. Agora, se colocar em um carro, além de aumentar a resistência, pode deixar a estrutura do veículo mais leve e aí você pode economizar combustível também. Se todo o aço do mundo tivesse vanádio, isso reduziria em 45% a poluição da cadeia produtiva do aço. As outras funções são para a fabricação de peças críticas de aviões, em ligas de titânio e alumínio. Tem uso na indústria química também. Mas uma aplicação mais recente é em baterias de vanádio, para armazenar grandes capacidades de energia.  

Pode ser usado para fabricar energia limpa? Sem dúvidas. Em geradores eólicos, em geradores solares... Na Bahia, a geração eólica é gerada em grande quantidade à noite, quando ninguém consome. Hoje, o sistema consegue equilibrar isso, mas no futuro, a bateria de vanádio vai ajudar a armazenar a eólica durante a noite e a solar durante o dia para o uso em momentos de maior consumo. O vanádio é alinhado com uma vida mais limpa, verde. É o metal do futuro. 

Como está a operação de vocês? Aquela ocorrência foi descoberta ainda na década de 70, pela CBPM (Companhia Baiana de Pesquisa Mineral). Durante muitos anos se tentou desenvolver este projeto, mas por diversos motivos não foi adiante. Em 2006, Largo Resources, uma empresa canadense, investiu em pesquisas e em 2012 começou a construir a planta. Em 2014, começamos a produzir. Estamos fazendo cinco anos de operação. Hoje temos uma produção maior que a capacidade do vanádio de melhor qualidade do mundo, a um dos menores custos, feito por baianos, por gente nossa. No ano passado, iniciamos uma expansão, de 800 mil toneladas por mês para mil e no último mês de julho alcançamos um recorde de 1.042 toneladas.   Qual é o impacto da atividade para Maracás?  Nós falamos com orgulho que estamos levando desenvolvimento para o interior da Bahia. Estamos numa região carente, de caatinga, com dificuldades de empregos e poucas oportunidades. Para você ter ideia, 75% das nossas compras no ano passado foram na Bahia. Mais de R$ 130 milhões. A grande maioria de nosso efetivo, 78%, é da Bahia. A grande maioria é de Maracás mesmo. Isso é prioridade. 

O que explica resultados tão bons?   Nós temos o melhor teor de vanádio do mundo, mas só o teor não produz benefício nenhum. A riqueza da mineração só gera benefício quando a gente tira ela. 

Como é que a questão do escoamento impacta a atuação de vocês? A parte de infraestrutura é fundamental para desenvolver oportunidades de mineração. No nosso caso não é tão necessário, porque temos uma movimentação de mil toneladas por mês. Colocamos em bigbags, ou tambores, dentro do pallet e já sai no caminhão para o porto. Agora, é importante ressaltar que a gente agrega valor à nossa produção lá na mina. A gente não faz só a mineração. Eu costumo dizer que a mineração em si corresponde a 25% da nossa atividade toda lá. Depois disso tem um tratamento pirometalúrgico, um processo químico, uma metalurgia depois. Tudo isso lá em Maracás. A gente produz um vanádio com 99,6% de pureza. Não é do mesmo jeito que sai do solo. Estamos gerando riquezas e agregando valor dentro da Bahia. 

Mas como a logística atinge a cadeia mineral no estado? Tem associados do Sindimiba que querem viabilizar operações de ferro no Sudoeste da Bahia que dependem da Fiol (Ferrovia de Integração Oeste-Leste), do Porto Sul. O que o estado puder ajudar, com parcerias público-privadas, para desenvolver projetos em que a iniciativa privada possa investir para viabilizar não apenas a mineração, mas um corredor de exportação de grãos também, precisa ser feito. Isso vai trazer riquezas até de outros estados, com uma boa logística. A mineração precisa movimentar grandes volumes. O curioso é que, até para compensar essas dificuldades, as empresas na Bahia agregam muito valor ao produto. Olha o exemplo da Vanádio... Se você olhar o exemplo da Magnesita, faz um beneficiamento muito intenso e gera um produto de alto valor. Olha o exemplo da cromita, com a Ferbasa, que produz ferro-cromo. Na etapa seguinte já é a produção de aço-inox e não dá para tocar. Mas agrega valor. Várias indústrias fazem esse papel, inclusive na parte ambiental e social. 

Além da logística, quais são os outros gargalos do setor no estado?  A mineração precisa de agilidade em seus processos. Precisamos de pesquisas contínuas, sondagens, etc. E às vezes, você pra fazer um furo de sonda espera um ano aguardando uma licença. Isso dificulta o desenvolvimento, a abertura de outra jazida. Se o licenciamento puder ser mais ágil, ajuda muito. Um outro fator é a questão de impostos. Toda empresa quando compra paga o ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) e credita. Quando paga o imposto, desconta. Mas quem importa não tem a oportunidade de compensar, então a gente acumula e não tem a condição de compensar. Se o estado puder criar uma condição para as empresas utilizarem este crédito, ajudaria muito. Nem falo em devolver dinheiro para a empresa, mas através da possibilidade de usar o crédito numa expansão, para a compra de máquinas e equipamentos. 

Como a gente dimensiona o impacto que a mineração tem? A gente não tem uma estatística para o impacto como um todo. Podemos falar do quanto produzimos, quantos empregos geramos, mas isso não mostra tudo. Quando digo que maioria de nossas compras são locais, isso movimenta uma quantidade de empresas enormes. Lá em Maracás, só em massa salarial, são R$ 3 milhões por mês. O dinheiro começa a circular na cidade. Você vê restaurantes novos, pousadas, supermercados enormes. O comércio inteiro funcionando. Como minerador, me sinto orgulhoso em ser minerador. Nossa empresa banca 50% da educação dos filhos de nossos funcionários. Pagamos 70% da mensalidade de cursos técnicos. Estamos contribuindo para que pessoas tenham uma vida melhor.