Ex-jogador da dupla Ba-Vi acusa shopping de conduta racista: 'muito constrangido'

João Marcelo registrou queixa após ser seguido por seguranças

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  • Vinicius Nascimento

Publicado em 19 de outubro de 2018 às 02:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Fotos: Antenor Pereira e Luiz Hermano/Arquivo CORREIO

João Marcelo esteve nos momentos mais importantes da história de Bahia e Vitória: em 1993, com o rubro-negro, e em 1988, com o tricolor (Fotos: Antenor Pereira e Luiz Hermano/Arquivo CORREIO) Campeão brasileiro pelo Esporte Clube Bahia em 1988 e vice-campeão nacional pelo Vitória em 1993, o ex-zagueiro João Marcelo afirma que foi vítima de racismo em um shopping da capital baiana. O ex-atleta publicou em uma rede social que foi "seguido e constrangido dentro do Shopping Barra, um ato claro de racismo e discriminação racial" que aconteceu em pleno Dia dos Pais, em agosto.

Ao CORREIO, o ex-zagueiro explicou a situação envolvendo dois seguranças do centro comercial e disse que denunciou o caso tanto à polícia quanto à Secretaria estadual de Promoção da Igualdade (Sepromi).

Segundo João Marcelo, ele foi ao Shopping Barra com sua esposa para trocar alguns dólares em uma casa de câmbio do local e depois disso foi ao cinema. Após o casal sair da sessão, os dois se dirigiram ao guichê de estacionamento, onde ocorreu a perseguição por parte de dois vigilantes. 

Enquanto a esposa de João efetuava o pagamento, ele conta que ficou ao lado do guichê. Poucos instantes depois, afirma que viu um vulto próximo a ele, o qual descreveu como “um rapaz branco e de terno azul”.

João Marcelo contou que ao perceber a situação, tentou disfarçar e olhou para a sua esquerda, onde avistou outro homem olhando para ele. Após sua mulher realizar o pagamento, os dois saíram em direção ao carro que estava estacionado e, ao olhar para trás, percebeu que a dupla acompanhava visualmente todo o seu trajeto.

Sem resposta O campeão brasileiro informou que retornou ao shopping no outro dia e procurou o Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC) do Barra para abrir uma reclamação e solicitar as imagens das câmeras de segurança.

Segundo o atleta aposentado, o responsável pelas imagens de segurança informou que “iria olhar as imagens, mas não poderia falar nada, nem mostrar as imagens, exceto em caso de ordem judicial”.“Aquilo ficou em minha cabeça. Para mim, ficou claro o que aconteceu, mas eu quero ter acesso às imagens para ter certeza”, explicou ao CORREIO.No dia 16 de agosto, o ex-zagueiro foi até a 14ª Delegacia (Barra), onde registrou Boletim de Ocorrência (B.O.). O jogador afirma que a Polícia Civil solicitou as imagens das câmeras para o Shopping Barra, mas que até hoje – dois meses após a ocorrência – o centro de compras ainda não disponibilizou as gravações.“Eu fiquei muito constrangido na hora. É chato demais porque é um shopping que eu gosto muito e frequento bastante até pela proximidade com minha casa. Tomo café, almoço, desço lá pra tomar sopa e faço compras até muito caras. Sempre via as pessoas me olhando e achava que era por me reconhecer, já que fui jogador, mas agora eu vou pensar o quê?”, desabafou.A ocorrência foi registrada pela delegada Carmen Dolores Bittencourt como ameaça, com base no artigo artigo 147 da Lei 2.848/40.

Racismo Aos 52 anos, o racismo não é uma novidade na vida de João Marcelo. Antes, durante e depois de sua carreira de sucesso nos gramados ele enfrentou casos de discriminação. Hoje morador do Corredor da Vitória, uma das áreas mais ricas da capital, o ex-atleta lembra com detalhes de uma situação que enfrentou há 45 anos, quando ainda criança percebeu "senhoras apertando a bolsa" por conta de sua presença. Foto: Reprodução/Instagram Os casos de racismo seguiram na adolescência do jogador com familiares de antigas namoradas afirmando que João Marcelo é “muito preto” e o acompanharam durante a carreira de atleta. Um destaque dessas situações, segundo ele, foi quando jogou no Grêmio, clube pelo qual foi campeão gaúcho em 1990 e fala com carinho, apesar das memórias de casos de discriminação no Rio Grande do Sul.Apesar de saber que se tratavam de casos de discriminação, João Marcelo falou que “na época achava normal” e que “não precisava gritar porque achava que as coisas simplesmente eram daquele jeito”.Exemplo Foi após encerrar sua carreira e iniciar uma trajetória com crianças – para quem dá palestras contando sobre sua trajetória e as dificuldades enfrentadas na vida – que o ex-zagueiro “percebeu a necessidade de gritar e ensinar que as crianças também gritem e percebam quando passam por esse tipo de situação”.

“Eu me posicionava de uma forma errada lá atrás porque tinha outras preocupações. Temia por minha carreira, mas hoje eu sou referência para essas crianças e preciso dar o exemplo”, explica o campeão brasileiro. Denúncia feita à Sepromi sobre o incidente no shopping (Foto: Reprodução) Além da polícia, João Marcelo também acionou a Sepromi para ajudar na reivindicação de seus direitos. Ele contou que um advogado da pasta já entrou com uma ação no Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA).

O CORREIO tentou entrar em contato com a assessoria do shopping, até o fechamento da reportagem não obteve retorno.

*Com supervisão do editor João Galdea.