Excesso de mangas faz preços caírem até 40% no mercado

No Mercado da Sete Portas o quilo está sendo vendido por até R$ 2

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  • Georgina Maynart

Publicado em 29 de setembro de 2019 às 13:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: (Foto: Alex Dantas / Divulgação)

Saborosas, cheirosas, suculentas e mais baratas. As mangas, que estão entre as frutas mais apreciadas pelos baianos, registraram queda de até 40% nos preços nas últimas semanas na região metropolitana de Salvador. 

Na Central de Abastecimento de Simões Filho, a caixa da manga Palmer caiu de R$ 70 para R$ 45. A Tommy, que custava R$ 65 agora está sendo comercializada por R$ 40. E a Rosa, que chegava a ser vendida por R$ 105 nos últimos dias não passa mais dos R$ 80. 

A diminuição no atacado se reflete com mais força no varejo. No Mercado da Sete Portas o quilo está sendo vendido por até R$ 2, e em alguns grandes supermercados caiu para até R$ 3,50. 

E seja a Palmer, a Tommy ou as tradicionais Rosa ou Espada, elas devem continuar com as cotações reduzidas em outubro. De acordo com o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), a tendência de queda é nacional e vários fatores estão influenciando nas reduções, principalmente o excesso de frutas no mercado.

“A oferta está mais expressiva na maior parte dos municípios produtores, as vendas mais lentas e as exportações para a Europa ainda estão abaixo do esperado. Além disso houve uma retirada maior de mangas fora do ponto ideal de maturação, o que também limitou o escoamento”, diz o relatório do Cepea. 

Nesta época a colheita está em ritmo intenso em São Paulo e no norte de Minas Gerais. Na Bahia, os principais produtores estão concentrados no Vale do São Francisco e no sudoeste do estado, na região do perímetro irrigado de Brumado. Em Livramento de Nossa Senhora, o quilo da fruta que já chegou a custar até R$ 2, não tem passado de R$ 1 faz várias semanas. E já tem até agricultor adiando a colheita.“Quem pode está deixando no pé à espera de um melhor preço. Esperando um pouco mais para ver se melhora. Neste momento não compensa colocar no mercado interno. E vamos torcer para as exportações melhoram em Petrolina e Juazeiro”, afirma Ricardo Ribeiro, secretário de agricultura de Livramento de Nossa Senhora. No município existem cerca de 500 produtores de manga que mantêm pomares irrigados e direcionam mais de 95% da produção para o sudeste do país.

Já no Vale do São Francisco, responsável por 90% da manga brasileira enviada para outros países, os preços chegaram a cair mais de 10% nas últimas semanas. Os produtores rurais esperam aumentar o fluxo das exportações até o fim do ano, quando os preços poderão voltar a subir. Segundo o Cepea, as exportações estão lentas devido a concorrência com outros países produtores. No ano passado, os produtores do Vale enviaram 9 milhões de caixas da fruta para os Estados Unidos, segundo maior comprador das mangas brasileiras depois da Europa.

Produção de mangas no Brasil inclui uso de tecnologias avançadas e cultivo de diversas variedades. ( Foto: Georgina Maynart) TECNOLOGIA

Muito além das mangas colhidas nas zonas urbanas, nos quintais das casas ou em pequenas chácaras da zona rural, o cultivo da fruta evoluiu muito nas últimas décadas e hoje conta com pomares comerciais cada vez mais tecnificados e produtivos.

Enquanto a área de manga não cresce muito no Brasil, no Vale do São Francisco ela quase triplicou entre 2015 e 2018. O aumento gigantesco na oferta está sendo possível graças a um conjunto de estratégias de produção.

As técnicas envolvem, por exemplo, o uso de equipamentos com infravermelho. Ele permite medir o nível de maturação da fruta ainda no pé, para evitar a colheita tardia. O equipamento é capaz de determinar o ponto ideal de colheita para que a fruta atinja a qualidade de consumo apenas após 20 dias, quando chegar no destino final.

Outra tecnologia que fez a diferença é o tratamento hidrotérmico. A técnica foi desenvolvida há cerca de duas décadas por uma rede de pesquisa liderada pela Embrapa. Durante o tratamento, as frutas são mergulhadas em água aquecida a 46 graus por 75 ou 90 minutos. O processo mata ovos ou larvas de insetos que porventura estejam na manga, entre elas a temida mosca-das-frutas.

 “Foi a solução encontrada pelo setor para entrar em mercados exigentes como o americano. O maior receio deles era que, nos oito a dez dias de transporte até lá, houvesse a possibilidade de que os frutos levassem os ovos ou as larvas da mosca”, afirma o engenheiro agrônomo José Eduardo Brandão Costa, diretor executivo da Abrafrutas. 

A técnica é utilizada por todos os 40 produtores exportadores de frutas do Vale do São Francisco, instalados nos municípios de Juazeiro, Casa Nova e Petrolina. A estratégia de tratamento através da temperatura deu tão certo que se transformou em modelo de certificado fitossanitário para outros países. A solução técnica abriu mercados para as frutas brasileiras em países como Argentina, Chile, Coreia do Sul, Estados Unidos, Japão e União Europeia.

Os agricultores também adensaram as plantações. No início dos cultivos, eles plantavam no máximo 100 mangueiras por hectare. Agora existem pomares com até 1.200 pés por hectare.

Foram tecnologias como esta que permitiram à Bahia se tornar uma das maiores produtoras de manga do mundo. O segmento agrícola gera mais de 200 mil empregos diretos apenas no Vale do São Francisco. A comercialização da fruta movimentou no estado mais de R$ 422 milhões em 2018, segundo o IBGE.

ANÁLISE DE MERCADO

Para os especialistas, o cultivo de manga vai além da simples produção de alimentos. Abrange uma cadeia produtiva extensa, com amplas consequências na economia nacional e que conseguiu atingir taxas de rentabilidade superior a 200% nos últimos anos. Em entrevista ao CORREIO, o pesquisador da Embrapa Semiárido, João Ricardo Ferreira de Lima, doutor em economia aplicada, analisa as perspectivas do segmento.

Pesquisador João Ricardo Ferreira de Lima, da Embrapa Semiárido, analisa perspectivas do cultivo de manga no Brasil. ( Foto: Ascom Embrapa) *Como explicar o gigantesco desenvolvimento da produção de manga no Brasil?

Esta rentabilidade da mangicultura tem algumas explicações, entre elas o aumento da produtividade dos pomares, a melhoria da qualidade das mangas e aumento do volume exportado. Este aumento da rentabilidade tem uma consequência imediata, que é o aumento do número de empresários dispostos a investir na cultura e também o desejo dos atuais produtores de aumentar suas áreas com manga. Este dado é preocupante se o aumento desta oferta de manga não tiver a contrapartida do crescimento da demanda. Se isto ocorrer, os preços vão refletir o desequilíbrio, apresentando redução nas suas médias. 

*Quais os tipos de manga mais valorizados no mercado?

No mercado interno, por exemplo, manga rosa, manga espada vermelha, bourbon são consideradas mangas exóticas, com mercado restrito e excelentes preços por quilo. A manga Tommy Atkins tem bastante demanda por sua coloração, mistura de amarelo com vermelho que chama a atenção do consumidor. É uma manga fibrosa e por muito tempo foi a mais comercializada em São Paulo, que sozinho consome 10% de toda a manga produzida no país. Atualmente, porém, a Tommy perdeu espaço para a variedade Palmer. Esta já passa a ser encontrada em maior volume, com preços semelhantes ao da Tommy, mas ela não tem fibras. Muitos consumidores ainda não sabem diferenciar as variedades de manga. Mas após experimentar as variedades sem fibra, não querem mais consumir as outras com fibras. A Haden, produzida mais em São Paulo, também tem bom mercado. No caso dos Estados Unidos, a Tommy é a variedade mais exportada. No caso da União Europeia, são preferidas as mangas sem fibras, como a Palmer, a Kent e a Keitt. Dentre estas, a Kent é considerada a "manga do mundo" pela produção total do conjunto de países e seu volume comercializado. Contudo, já existem novas variedades sendo testadas que estão vindo do México, da Espanha e de Israel, por exemplo, mais em pequenas áreas, até o momento.

*Quais as tecnologias mais avançadas disponíveis hoje para cultivo desta fruta?

Diversas tecnologias são utilizadas para produzir uma manga de qualidade. A irrigação é a principal de todas, sem água não se tem produção. A cada dia o manejo da irrigação se aperfeiçoa. O sistema mais utilizado no Vale do São Francisco é o de gotejamento e os microaspersores. Em muitas áreas o controle é todo automatizado, com sistema que liga e desliga automaticamente nos horários programados. Além disso, através da fertirrigação é possível aplicar os insumos que a planta precisa de forma mais eficiente, além de ajudar a reduzir os custos de produção, como horas de trator e mão de obra. O processo de indução floral, visando cessar o crescimento vegetativo, é fundamental para programar o período de colheita de uma área e o consequente escalonamento da produção. Outra tecnologia fundamental está relacionada com o transporte das frutas dentro dos contêineres, considerando um processo de atmosferas controlada, para que o fruto possa chegar ao seu destino com a melhor qualidade possível, mesmo em mercados mais distantes. 

* Até que ponto as condições climáticas do Vale do São Francisco e da região sudoeste da Bahia favorecem o cultivo de manga nestas duas áreas do estado? 

Estas duas regiões possuem condições climáticas extremamente favoráveis, como a alta radiação solar, a luminosidade, baixa pluviosidade, que leva a menores problemas com praga e doenças. Estes fatores, em união com um conjunto de tecnologias disponibilizadas ao produtor, fazem com que se possa produzir mangas de elevado padrão de qualidade ao longo de todo o ano, de forma escalonada. Assim, é possível abastecer o mercado em qualquer período do ano. 

*Qual a estratégia indicada para aumentar ainda mais as perspectivas deste mercado no futuro?

A demanda interna e das exportações têm crescido, mas não no mesmo ritmo. Assim, deve-se ter cuidado para que se tenha uma superprodução de mangas e os preços levem a uma forte queda da rentabilidade. Os produtores devem se unir e pensar em estratégias para aumentar a demanda por esta fruta saborosa e saudável. O exemplo pode vir do abacate (avocado), na qual uma forte estratégia global de marketing fez desta a fruta da moda, com demanda crescente. Além disso, os mesmos devem atentar para uma forma de planejar a produção nacional e evitar concentração de produção em algumas semanas, nas quais os preços praticamente acabam se igualando ao custo de produção e, por outro lado, se tem semanas com baixa oferta e preços muito elevados. Esta volatilidade poderia ser reduzida com planejamento nacional de produção.

VARIEDADES

Existem no planeta mais de 500 variedades de mangas. A fruta chegou ao Brasil ainda no período da colonização, trazida pelos portugueses que plantaram os primeiros pés trazidos da Ásia. As mais comuns são a rosa e a espada, de cheiro e sabor mais fortes. Mas ao longo das últimas décadas, a tecnologia facilitou o cultivo de variedades diferentes. Foi assim que muitos produtores brasileiros passaram a cultivar as variedades Tommy Atkins, Palmer e Keitt. Menos fibrosas, e cada vez mais doces, elas vêm ganhando o gosto do consumidor. De acordo com os nutricionistas, a manga é rica em açúcar, proteínas, vitaminas e minerais, principalmente ferro. A fruta tem propriedades digestivas, antioxidantes e anti-hemorrágicas.

Algumas variedades cultivadas no Brasil:.

*Manga Tommy: Casca mais puxada para o amarelo ou vermelho arroxeado. Teor médio de fibras. Manga Tommy Atkins. (Foto: National Mango Board) *Manga Palmer: Casca vermelha ou arroxeada. Pouquíssimas fibras e caroço pequeno. Manga Palmer. (Foto: National Mango Board) *Manga Keitt: Casca verde amarelada, frutos médios e polpa menos fibrosa..  Manga Keitt. ( Foto: National Mango Board) PALADAR

Além do consumo fresco, in natura, as mangas estão se transformando em ingrediente de receitas mais elaboradas, seja em sucos, saladas e pratos doces ou salgados. O COREIO traz abaixo duas receitas práticas e fáceis de preparar.

Salada de manga temperada

Ingredientes:  Duas mangas grandes cortadas em cubos 1 cebola cortada em cubos 1 suco de limão Folhas de coentro picadas

Modos de preparar: Misture todos os ingredientes, decore com folhas de hortelã e sirva imediatamente. Salada de manga temperada. (Foto: divulgação) Tartar de Salmão com Manga

Ingredientes:  1/2 manga cortada em cubos 200 gramas de salmão cortados em cubos  1 cebola cortada em cubinhos Suco de ½ laranja Suco de 1 limão 3 colheres de sopa de azeite 1 pimenta dedo de moça sem sementes e cortada em cubinhos 1 folha de acelga 1 erva doce fresca Sal a gosto

Modo de preparo:  Junte o suco da laranja, o azeite, o suco do limão, o sal e a pimenta dedo de moça. Em uma vasilha, misture o molho ao salmão, a manga e a cebola. Guarde na geladeira. Na hora da montagem, coloque toda a mistura em cima da folha de acelga, em formato de concha. Decore com um ramo de erva de doce e sirva. Tartar de Salmão com Manga. (Foto: divulgação) BAHIA SEDIA CONGRESSO BRASILEIRO DE FRUTICULTURA

A partir de hoje (30/09) até sexta-feira (04/10), a produção nacional de frutas, inclusive mangas, vai ser o tema principal do XXVI Congresso Brasileira de Fruticultura, que será realizado no Vale do São Francisco, em Juazeiro (BA) e Petrolina(PE). Mais de 900 pesquisadores brasileiros e de outros países vão discutir os desafios e oportunidades de desenvolvimento da fruticultura de precisão. “Veremos estudos sobre as culturas ancoradas em grandes negócios como citros, uva, manga, maça. Mas não só. Há trabalhos acadêmicos muito bem conduzidos voltados a frutas nativas como umbu, buriti, cambuí e que ajudam na formação de mercados e a propagar o consumo. A ciência e a extensão estão firmando as frutas brasileiras como fonte de riqueza importante para o país”, afirma o pesquisador da Embrapa Paulo Roberto Coelho Lopes, coordenador do congresso.   Fruticultura Brasileira é tema de congresso na Bahia. (Foto: Abrafrutas) Mais de 800 trabalhos científicos vão ser apresentados sobre assuntos como biotecnologia, botânica, segurança alimentar, genética, colheita, defesa sanitária e mercado. O evento inclui ainda palestras, visitas a fazendas e centro de pesquisas da região. O congresso contará também com profissionais de empresas públicas e privadas que atuam no agronegócio em mais de 15 países da América Latina, África e Sudoeste Asiático.

A Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas) estima que o setor cresça cerca de 5% ao ano, beneficiada pelo aumento da demanda internacional por frutas e pelo clima favorável do país. Mas apesar de ser o terceiro maior produtor mundial em volume de frutas, o Brasil ocupa a 23 ª posição no ranking internacional de países exportadores.

Serviço:

O QUE: XXVI Congresso Brasileiro de FruticulturaQUANDO: De 30 de setembro e 04 de outubroONDE: Juazeiro (BA) e Petrolina (PE)