Faltou carisma e sobrou estratégia no BBB22

Reality mais popular e lucrativo da Globo, programa deve coroar Arthur Aguiar em edição aquém das expectativas

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  • Da Redação

Publicado em 24 de abril de 2022 às 11:01

- Atualizado há um ano

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Na próxima terça, o público se despede da vigésima segunda edição do Big Brother Brasil. Me lembro, como se fosse ontem, da estreia do BBB. Não deste, mas o primeiro, há 20 anos. Era 29 de janeiro de 2002, e eu trabalhava na produção da TV Bahia. Me disseram: “Hoje você fica até mais tarde”. À noite, lá estava eu, na festiva residência da família de Adriano Luiz Ramos de Castro, o Didi. O artista plástico era o único representante baiano naquela que passou a ser ‘a casa mais vigiada do Brasil’. Adriano era um participante estrategista. Essa característica, em especial, incomodou os telespectadores na época. O rapaz saiu no sexto paredão. O escolhido como primeiro campeão do reality foi o bonachão Kleber ‘Bambam’. 

Corta para 2022. Dizem que esse BBB ‘flopou’. No popular: deu ruim! Começamos, então, a questionar se, após 21 edições, a fórmula não está desgastada. Ou foi o elenco escalado este ano que não deu liga? Ou viemos de uma edição anterior tão boa que, com o sarrafo lá em cima, não conseguiram nos entregar um programa à altura? Ou tudo isso? Com personagens menos vibrantes, por medo do cancelamento do público (Karol Conká e Lumena não me deixam mentir), o reality entregou pouco. 

Mas o público que cancela é o mesmo que pede intensidade dos participantes. As reclamações começaram já nos primeiros dias. Nas redes sociais, diante de um Tiago Abravanel ‘cantante’, de um Pedro Scooby ‘good vibe’, de uma Brunna Gonçalves apática, exigiam emoção, briga, barraco. O povo queria ver sangue (sinal dos tempos em que vivemos?). Queria ‘fogo no parquinho’, expressão cunhada com sucesso pelo apresentador anterior, Tiago Leifert, e que deu o tom das edições mais recentes. Conhecida por ter batido panelas e aprontar altas confusões no BBB2, Tina faria sucesso agora. Na edição que participou saiu na segunda semana. 

Faltou carisma Olhando em retrospecto, o Big Brother era um programa que primava pelas relações, com seus atritos e afetos (que aconteciam naturalmente com a convivência). A gente gostava disso. Os brothers e sisters garantiam a diversão apenas sendo. A edição atual vem para quebrar esse princípio. Na falta de personagens carismáticos, surge um ponto de luz no fim do túnel: Arthur Aguiar. Já conhecido por trabalhos como o Diego, de Rebelde (2011/ Record), e Duca, de Malhação (2014/ Globo), com um fã-clube consolidado, é ele quem determina que o BBB não é parque de diversões, mas um JOGO.

E vai repetindo até que, bem articulado em sua oratória, convence os telespectadores. Dessa forma, o que era condenável no baiano Adriano, lá na primeira edição, passa a ser não apenas aceitável, mas imprescindível. 

“Joga y joga”, comentavam nas redes sociais, referindo-se a Arthur. Era um elogio. Jade Picon, do grupo Camarote (os participantes famosos), pegou birra pelo ator e virou sua principal rival. Foi estrategista, fria, calculista. ‘Jogou y jogou’, mas pesou a mão, o que fez com que Arthur fosse ficando ainda mais forte diante do público. Ele sustentava o argumento de que estava sozinho na casa (mesmo aliado a Paulo André, Pedro Scooby, Douglas Silva e Gustavo Marsengo). E, mais uma vez, convenceu a audiência. Bora combinar que a gente adora um coitadinho, né? Cuidar, acolher, defender. O ator virou uma versão masculina de Juliette, vencedora do ano passado. Sem o carisma da paraibana, mas com fãs ardorosos, dispostos a tirar todo mundo que atrapalhasse o crescimento do Pão (como ficou conhecido, por comer o alimento como se não houvesse amanhã).  

Assim aconteceu com todos os outros que se colocaram no caminho do jogador. Saiu um a um. A maior parte, com rejeição. E eu me tornei a pessoa que mais temia: aquela que assistia ao programa e o analisava, traçando um paralelo com o comportamento da sociedade e os tempos em que vivemos. Não dá para ignorar a diferença de tratamento dado pelo público aos jogadores (homens) e às jogadoras (mulheres). Quando Jade saiu, “cobra”, “soberba”, “prepotente”, “falsa” foram apenas alguns dos adjetivos direcionados a ela no Twitter e Instagram. Mas, por que o ator foi considerado exímio jogador e a influencer gerou as piores reações? E por que o grupo das Comadres, formado por Lina (a única travesti da casa e segunda na história do BBB), Natália e Jessilane não descia para os telespectadores, enquanto a amizade dos homens da casa foi vista como “fofa”, rendendo suspiros nas redes sociais? Percebi um traço de machismo aí. 

Ok. É preciso dar o braço a torcer. Arthur merece muitos aplausos:  por ter sido um bom jogador (apesar de eu preferir as pessoas que manifestam suas emoções sem medo), ter feito as alianças certas, pela coerência no discurso (nem sempre no comportamento), pela atenção aos detalhes do jogo, por ter feito os fãs conservadores esquecerem sua vida pregressa, mas, sobretudo, por nunca ter traído. E aqui eu me refiro às expectativas da torcida. Ele jogou pra galera e conseguiu sua cumplicidade. 

O público, por sua vez, reagiu à altura: foi fiel ao seu comandante, fez as movimentações necessárias para favorecê-lo fora da casa, observou a postura de cada antagonista em potencial, boicotou o programa quando achou que deveria, ‘votou y votou’. Talvez não seja exagero dizer que o público, sim, merece o primeiro lugar desta edição. Pro bem e pro mal, foi o grande protagonista do BBB22. Hoje, quatro homens estão na final do BBB, fato inédito na história do programa. Eram os mais carismáticos? Não sei, mas souberam se proteger, ganharam as provas. E o público quis assim. 

Quanto ao flop desta edição, preciso te contar que, mesmo com a audiência abaixo daquela do ano passado (média de 27 pontos no Ibope, em 2021, e 23 pontos, este ano), o reality lucrou bastante. Antes mesmo de começar, o programa já havia batido recordes como sua edição mais lucrativa. Apenas com patrocinadores, o BBB22 já tinha cerca de R$ 700 milhões de faturamento. Enquanto isso, o prêmio de 1,5 milhão está sem reajuste há 12 edições e os funcionários fazem vaquinha para realizar uma festinha de despedida. Que loucura, hein?