Fórum Agenda Bahia 2018: Você sabe o que é cidade resiliente?

Conceito define capacidade de adaptação do espaço urbano

Publicado em 7 de agosto de 2018 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Arquivo/CORREIO
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O planeta já entrou no cheque especial do uso dos recursos naturais em 2018 e ainda faltam mais de quatro meses para o final do ano. O lembrete é de Adriana Campelo, diretora de Resiliência da Prefeitura de Salvador, em referência ao ranking anual divulgado no último dia 1º pela ONG Global Footprint Network. Isso significa que a população mundial já consumiu este ano mais recursos do que a capacidade da Terra de renovar-se. E, assim como acontece com quem extrapola o orçamento do mês, se a dívida com o planeta não for quitada a tempo, a Terra vai decretar falência. 

Nas cidades de todo o mundo, os indícios de que as contas do planeta estão no vermelho aparecem nas catástrofes naturais cada dia mais intensas e nas tensões sociais provocadas pela desigualdade econômica. E como é que se resolve essa matemática complicada? Com resiliência urbana, explicam Adriana Campelo, que também é Chief Resilience Officer – CRO do programa 100 Resilient Cities (100 Cidades Resilientes), da Fundação Rockefeller, e Pablo Lazo, diretor da consultoria internacional Arup e professor de Desenvolvimento Sustentável e Resiliência Urbana na América Latina e Europa. 

Os dois vão participar nesta quarta-feira, dia 8, do seminário Sustentabilidade do Agora, que integra a programação do Fórum Agenda Bahia 2018. Adriana vai coordenar um workshop sobre economia circular; enquanto Pablo Lazo fará a conferência de abertura do seminário.

Mas afinal, o que é uma cidade resiliente? Desde 2016, por exemplo, Salvador integra a rede 100 Resiliente Cities, junto com outras 99 metrópoles mundiais. “Ser resiliente é diferente de uma cidade para a outra. Salvador não tem terremoto ou catástrofes naturais. Mas tem o estresse crônico da desigualdade social”, diz Adriana Campelo.

Pablo Lazo conceitua: “cidade resiliente é aquela que tem capacidade para responder, se adaptar e continuar seu desenvolvimento apesar dos impactos agudos e tensões que possam surgir. Após um evento catastrófico, a cidade pode sair mais forte e melhor preparada para o futuro”.

O que é: Cidade Resiliente

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Um plano para Salvador

O plano de resiliência de Salvador ainda está em construção e tem previsão de ser lançado em dezembro deste ano. Segundo Adriana Campelo, são trabalhados quatro eixos no plano: o primeiro, economia resiliente, visa fortalecer os ativos da cidade. 

O segundo, ecossistemas sociais e inovadores, trabalha as formas como poder público, instituições e população se conectam para a cultura cidadã, empoderamento da população mais vulnerável socialmente e desenvolvimento técnico para a criação de um ambiente agradável e inclusivo. 

No terceiro eixo, transformação urbana inteligente, entram economia circular, mobilidade, conectividade, mudanças climáticas, prevenção de riscos, inovação para a sustentabilidade e a preocupação com as ocupações precárias. Já o quarto e último - Salvador informada e governança inovadora - trabalha formas de organizar os dados da cidade para que as políticas públicas sejam definidas com base em necessidades reais e na realidade local.

A Diretoria de Resiliência de Salvador faz parte da estrutura da Secretaria Municipal de Cidade Sustentável e Inovação (Secis). O objetivo é articular todas as secretarias da prefeitura para as estratégias de resiliência. 

Os planos, porém, trazem metas para curto, médio e longo prazos, porque tornar-se resiliente não é passe de mágica, como lembra Pablo Lazo. “É um processo que implica mudanças institucionais, na cultura do cidadão e nas formas como os projetos urbanos são financiados, com parcerias entre os setores público e privado”. Eugene Zapata: 'Podemos controlar como nos preparamos e respondemos aos desafios' Um mundo melhor

Com o rápido processo de urbanização no mundo – calcula-se que até 2050 cerca de 75% da população mundial viverá em cidades -, as pressões globais atuam em escala municipal, lembra Eugene Zapata, diretor para a América Latina e Caribe do 100RC da Fundação Rockefeller. Ou seja, é na vida cotidiana do cidadão que os impactos são sentidos em primeiro lugar.

“As mudanças climáticas, pandemias, flutuações econômicas e terrorismo apresentam novos desafios e incertezas. Com a população mundial cada vez mais concentrada em áreas urbanas, o impacto econômico, a complexidade e a devastação de ameaças naturais e artificiais continuarão a crescer. Apesar de não podermos prever os próximos transtornos físicos, sociais ou econômicos, podemos controlar como nos preparamos e respondemos a esses desafios”, afirma Eugene Zapata. 

O Programa 100 Resilient Cities foi criado pela Fundação Rockefeller no centenário da entidade, em 2013 e, no mesmo ano, selecionou um grupo de 32 cidades-membro. Em 2015, mais 35 cidades foram incorporadas à rede e, em maio de 2016, houve a última chamada, completando 100 cidades. Desse total, 17 são da América Latina e apenas três do Brasil: Porto Alegre (RS), Rio de Janeiro (RJ) e Salvador (BA).

Ainda segundo Eugene Zapata, o programa ajuda cidades em todo o mundo a tornarem-se mais resilientes diante dos desafios físicos, sociais e econômicos do século XXI. “O programa 100RC apoia a adoção e a incorporação de uma visão de resiliência que abrange não apenas choques extremos, mas também as tensões que enfraquecem o tecido de uma cidade de forma cíclica ou em seu cotidiano, como o desemprego, um sistema de transporte público sobrecarregado ou ineficiente, a violência endêmica e a escassez crônica de alimentos e de água”, enumera. 

O programa oferece às participantes orientação financeira e logística para a contratação de um diretor de resiliência (Chief Resilience Officer, CRO); apoio para que esse diretor lidere diferentes grupos de atores sociais na construção das estratégias de resiliência; acesso a ferramentas, prestadores de serviços e parceiros dos setores público, privado e entidades sem fins lucrativos que podem ajudar a desenvolver e implantar as estratégias; e, uma vez que a cidade integra uma rede, ocorre o compartilhamento de práticas entre os CROs de cada uma delas. 

Dez passos para a resiliência nas cidades:1 – Organizar a aplicação de ferramentas para reduzir riscos de desastres;2 -  Construir alianças entre todos os órgãos envolvidos no atendimento à população em situações de calamidade ou vulnerabilidade social;3 – Ter um orçamento para redução de riscos de desastres;4 - Criar programas de incentivo para a participação de moradores de áreas de risco, famílias de baixa renda, comunidades e empresas no enfrentamento a desastres, mudanças climáticas, desigualdade social, etc.;5 – Manter dados sobre riscos e vulnerabilidades atualizados para que as decisões possam ser tomadas mais rápido e com base na realidade local;6 – Investir em obras de infraestrutura, como drenagem para evitar inundações, e também criar ações de adaptação às mudanças climáticas;7– Avaliar periodicamente a segurança de escolas e centros de saúde da cidade;8 – Criar programas de educação e treinamento sobre redução de riscos de desastres em escolas e comunidades;9 – Proteger os ecossistemas naturais da cidade e seu entorno;10 – Instalar sistemas de alerta e alarme contra desastres e realizar exercícios públicos de preparação. Adriana Campelo vai coordenar workshop no Fórum Agenda Bahia Economia circular

Adriana Campelo, a CRO de Salvador, vai coordenar o workshop ‘Economia Circular: Ecossistemas para cidades do futuro’, que reunirá seis especialistas para debater a transição das cidades para a economia circular, um dos braços da resiliência urbana. 

O workshop é uma parceria entre o CORREIO e a Fundação Rockefeller e acontecerá das 14h30 às 17h30, durante o seminário Sustentabilidade do Agora. O objetivo é reunir os palestrantes e os convidados em seis grupos de trabalho que vão repensar as lógicas de produção e consumo atuais, sugerindo soluções para a transformação de resíduos nas grandes cidades. 

Os seis palestrantes do evento são: Ana Mascarenhas, Gerente de Eficiência Energética do Grupo Neoenergia; Ilan Cuperstein, vice-diretor do C40 para a América Latina; Jorge Cajazeira, presidente da Conselho de Sustentabilidade da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb); Nilson Sarti, presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção; João Resch Leal, subsecretário de Cidade Sustentável e Inovação de Salvador; e Paulo Gomes, professor da UFBA e pesquisador associado da Cátedra Unesco de Sustentabilidade da Universidade Politécnica da Catalunha. 

Adriana vai falar sobre economia circular pela ótica da resiliência. Segundo ela, após os painéis com os especialistas, os grupos vão receber perguntas para discutir desafios e oportunidades. “O resultado será agregado à estratégia de resiliência de Salvador, com indicativos e sugestões. A ideia é criar um documento-base que sirva, entre outras coisas, para buscar financiamentos dentro e fora do país para a implantação de estratégias de resiliência”, revela.

De acordo com a CRO, Salvador atualmente tem nove consultorias buscando respostas para questões levantadas na época da criação da Diretoria de Resiliência, em outubro de 2017. A cidade também foi contemplada no acordo entre o FOMIM - Fundo Multilateral de Investimentos do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e Fundação Rockefeller para o desenvolvimento de empreendimentos de impacto social em quatro cidades da América Latina. No final do ano, o acordo deverá lançar editais que somam US$ 1 milhão.

A capital também participa do Proadapta - Projeto de Apoio ao Brasil na Implementação da Agenda Nacional de Adaptação à Mudança do Clima, junto com Santos (SP). O objetivo do ProAdapta é estimular a resiliência climática em todo o país. O programa é financiado pelo governo alemão por meio da GIZ - Cooperação Alemã para o Desenvolvimento Sustentável.

Dez cidades resilientes no mundo: Copenhague (Dinamarca) - A cidade tem baixíssimos índices de emissão de CO² por habitante e cerca de 40% dos cidadãos usam bicicleta como meio de transporte. Curitiba (Brasil) – Também tem baixos índices de emissão de CO² por habitante e ainda colhe os louros pelo plano contra enchentes implantado nos anos 1970, que criou parques ao longo de rios e canais. Barcelona (Espanha) - O governo local milita na causa da energia solar e novos projetos de residências são incentivados a adotar sistemas de aquecimento solar para a água Vancouver (Canadá) – Pretende reduzir as emissões de gases do efeito estufa em 80% até 2050 e usa 90% da energia de fontes renováveis.

São Francisco (EUA) – Também quer reduzir a emissão de gases do efeito estufa em 80% até 2050 e desenvolve projetos para expandir o uso de energia solar. Estocolmo (Suécia) - A cidade se destaca pelo comprometimento do governo local em criar áreas verdes e reduzir a emissão de gases do efeito estufa Tokio (Japão) – O destaque se deve ao plano de ação contra mudanças climáticas. O governo local também incentiva bastante que a iniciativa privada desenvolva tecnologias limpas. Paris (França) - Mais de 100 mil árvores foram plantadas nos últimos anos e outras 20 mil recobrem os telhados da cidade, que também investe bastante em transportes sobre trilhos Nova York (EUA) – Se destaca entre as cidades resilientes pelo sistema de metrô e pela criação de áreas verdes e parques. Londres (Inglaterra) - Criou a segunda maior barreira móvel do mundo contra enchentes e também implantou uma 'Zona de Congestionamento', que diminuiu o fluxo de carros pequenos e aumentou o de transporte público O Fórum Agenda Bahia 2018 é uma realização do CORREIO, com patrocínio da Revita e Oi, e apoio institucional da Prefeitura de Salvador, Federação das Indústrias da Bahia (Fieb), Fundação Rockefeller e Rede Bahia.