Ivo Borré deixa legado de persistência e trabalho

Fazenda Progresso é uma das principais produtoras de alimentos da Bahia

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  • Donaldson Gomes

Publicado em 17 de junho de 2021 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação

A Chapada Diamantina transformou tanto a vida de Ivo Borré, 63 anos, quanto o agricultor – gaúcho de Porto Xavier e baiano por adoção – ajudou a remodelar o desenho socioeconômico da microrregião baiana. Quando chegou lá, em 1985, tentou reproduzir a experiência que tinha com a produção de grãos no Rio Grande do Sul, mas foi com a produção de batatas que Seu Ivo iniciou a saga da Fazenda Progresso para que a Chapada se tornasse um dos grandes polos para a produção de alimentos do Nordeste. 

Nestes 37 anos, a estrada foi repleta de curvas, mas nenhuma foi capaz de fazer o agricultor, que morreu na última terça-feira (dia 15) desistir do destino que traçou: viver da terra. Deixou o Rio Grande do Sul, junto com o pai – Pedro Hugo Borré – sonhando com o Centro-Oeste do Brasil, ou mesmo com o Oeste da Bahia, mas os custos elevados para a aquisição de áreas trouxe a família para a Chapada Diamantina. 

Chovia no verão de 1984 e o sertão todo verdinho, nas margens da Serra do Sincorá, fez o agricultor imaginar que poderia manter aqui a tradição de plantar soja, trigo e milho nas terras em que os Borré investiram tudo o que tinham, inclusive a caminhonete que os trouxe do Rio Grande do Sul. Tinha que dar certo, mas não foi o que aconteceu. 

Primeiro plataram soja, depois feijão. Além do clima não ter favorecido o cultivo de grãos, os agricultores ainda enfrentavam a falta de infraestrutura. “O sentimento era de estarmos conhecendo ainda uma parte do Brasil colonial”, contou Ivo Borré numa entrevista publicada pelo CORREIO em outubro de 2019.“Não havia telefone, televisão, energia elétrica, as estradas eram de terra e o isolamento era grande. O maior desafio naquele momento era acreditar que este panorama poderia ser mudado, que valia a pena investir e que o trabalho poderia alterar aquele cenário”, explicou. Depois de quase cinco anos, a família decidiu arrendar uma parte das terras para um grupo de japoneses. Os arrendatários chegaram dispostos a investir na plantação de batata inglesa e o cultivo deu certo. Depois, ao receber as terras de volta, os Borré também passaram a plantar batata. O primeiro plantio foi realizado com a sobra do legume deixada no solo pelos japoneses.

De lá para cá, a Fazenda Progresso não parou de inovar, investir em tecnologia, qualificação de mão de obra e novos cultivos. Depois da batata, eles começaram a produzir cafés especiais, tomate, cebola e uvas viníferas. A propriedade tem um corpo funcional fixo com aproximadamente 500 colaboradores. Em época de safra de café costumam ser adicionados entre 200 e 300 trabalhadores, a depender do ano safra. A vinícola já conta com uma equipe de 60 funcionários, considerando o campo e a indústria. A estimativa é que este contingente seja elevado para algo em torno de 200 pessoas com o funcionamento de todo o complexo: vinícola, hotel e restaurante.

Persistência O diretor-executivo do Agropolo Mucugê-Ibicoara, Evilásio Fraga, conta que conviveu com Ivo Borré desde 1987. A perseverança e o respeito à palavra eram as características mais marcantes na vida dele, acredita. “Participei de algumas negociações duras com ele. Era alguém que valorizava demais o fruto do seu trabalho, mas era tão fiel à palavra dada que a partir do momento em que ele apertava a sua mão, acabou”, lembra. 

Junte-se a isso um espírito de liderança natural, mesmo sem gostar dos holofotes.“Ele acordava cedo e passava o dia inteiro trabalhando, mas fazia isso com um enorme prazer, não por obrigação”, diz o executivo do Agropolo. “Para mim o grande legado dele foi a fé de que era possível fazer, realizar. Ele era um homem que não desistia”, destaca. Fraga lembra que em um momento de grandes dificuldades, no início da década de 90, o produtor rural estava com tudo certo para retornar ao Sul, mas optou por insistir mais um pouco. Os preços da batata estavam muito ruins. “Ele tentou mais uma vez e foi aí que ele deu a virada”, diz Evilásio Fraga. Seu Ivo apostou pesado, mesmo quando todo mundo queria que ele desistisse. “Para mim isso é marcante porque vivemos num mundo em que as pessoas desistem fácil. Ele não era o tipo que escolhia o caminho fácil”, explica. 

Quando recebeu o título de cidadão baiano, em 2017, disse que vivia uma emoção tão grande que lhe faltavam palavras para agradecer. “Sei que muitas outras pessoas são merecedoras dessa honraria. É uma grande emoção lembrar dos momentos que vivi ao longo desses 33 anos na Bahia”, agradeceu durante a cerimônia na Assembleia Legislativa da Bahia há pouco mais de quatro anos. “É uma perda irreparável. Ele foi uma das pessoas que ajudou a transformar a Chapada Diamantina em um celeiro agropecuário, deixou uma marca que ninguém nunca vai conseguir tirar”, acredita o deputado estadual Eduardo Salles, ex-secretário da Agricultura da Bahia. O parlamentar destaca o pioneirismo como uma das principais características de Ivo Borré. “Ele estava sempre buscando inovar, era um visionário”, afirma. Salles conta que Ivo liderava a família constantemente em busca da inovação. “Eu conheci a Fazenda Progresso já como destaque na produção de muita coisa. Eles resolveram produzir café gourmet, depois torrar, exportar o café cru e agora querem exportar o café torrado. Vão conseguir porque essa foi a visão que Ivo passou para a família”, destaca. 

O produtor João Lopes, presidente da Associação dos Produtores de Café da Bahia (Assocafé) destaca a seriedade e o empenho de Ivo Borré em tudo o que fez na vida. “Quando decidiram investir no café, criaram o Latitude 13, que é um produto de altíssima qualidade. A Fazenda Progresso faz tudo com muita perfeição e este foi um traço que Ivo passou para a sua família”, destaca Lopes. 

Ele diz que outra coisa que sempre chamou a atenção é a união da família Borré.“Ivo era o patriarca, mas com o passar dos anos começou a delegar as funções e tudo aconteceu de maneira muito cordial. É um grande exemplo de empresário”, acredita. Ivo Borré deixa mulher, filhos e netos.