Katia Guzzo fala sobre idade, vidas, planos e amores

São quase três décadas no ar. A apresentadora Katia Guzzo nunca passou pela reportagem de rua: estreou na bancada e não largou o posto. Saiu do Rio de Janeiro natal para a Bahia, onde se firmou como um dos mais populares rostos da TV

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  • Da Redação

Publicado em 25 de novembro de 2012 às 13:03

- Atualizado há um ano

Salvatore [email protected]

Se um dia quiser agradar  Katia Guzzo, não gaste tanto no presente e foque no embrulho, com um belo laço azul. É tudo que ela deseja. Não que falte ambição à popular jornalista da TV Bahia, que completou intensos 55 anos dia 8. Qual a magia do lacinho?

“Eu era ótima aluna na escola, só tirava notão. Mas, de comportamento, não era muito boa. Aprontava muito. Nunca ganhava o lacinho azul, de bom comportamento, para colocar na roupa”, conta a apresentadora - do BA TV - sem papas na língua, que não vê problemas em passar da medida com a bebida entre amigos, chora até em comercial de margarina e nunca quis ser mãe.

Mas talvez tenha sido justamente esse espírito irriquieto (“pé de vento”, como ela mesma diz) que tenha levado tão longe a jornalista, nascida em Campos dos Goytacazes, no Estado do Rio, mas com alma baiana. Alma e documento, aliás. Em 2004, recebeu o título de cidadã soteropolitana. Nada mais justo para quem ‘chegou chegando’ por aqui em 1981 e, exceto curtos períodos, não quis ir embora nunca mais.

Só na pose E já diz a gramática: quem chega, chega de algum lugar. Katia nasceu em 1957, em uma família classe média alta. O Guzzo herdou da mãe, de família simples italiana. Sempre foi exibida, não podia ver uma câmera na frente – na TV Bahia, existe até a pose Katia Guzzo (“Você gira o rosto pro lado, finge que volta, para, levanta o queixo e abre o sorriso, mas sem franzir os olhos”).

Katia era uma moleca, dessas de subir – e cair – de árvores no quintal. Vivia colada aos dois irmãos mais velhos – que, por sua vez, recebiam os tais lacinhos azuis. Nunca brincava de ninar ou dar mamadeira a bonequinhas. Preferia bonecas com formas adultas. Assim, imaginava engenheiras ou professoras: “Todas bem- sucedidas”. Uma menina prafrentex, em suma. Quando chegou a hora do vestibular, não teve muita dúvida: Comunicação na cabeça. E lá vai a adolescente para a efervescente capital. Foi aprovada na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Até então, telejornalismo nem passava pela cabeça da comunicativa estudante, cuja fama de namoradeira era maior que a cama – o cabelo, hoje curtinho, ia na linha do biquíni, como ela mesma diz. O primeiro estágio foi em uma agência de publicidade. Katia também chegou a trabalhar na editora Vecchi, como chefe de arte. “Adoro desenho, editoração. Tenho uma visão espacial, tudo meu é milimetricamente arrumado. Chega a ser TOC (Transtorno Obsessivo-Compulsivo)”, brinca.

Professora Em 1980, aos 23 anos, casou com o engenheiro químico Sergio Bastos, 57. No ano seguinte, o marido recebeu um convite para trabalhar no Polo Petroquímico de Camaçari. E aí começou a história de Katia por aqui. Bahia, até então, só mesmo nas músicas.

Nos primeiros anos, Katia foi professora de inglês – até hoje tem marmanjão na rua chamando-a de teacher (professora, em inglês) e como modelo fotográfica. “Inaugurei o Shopping Piedade”, diz, entre risadas, lembrando da campanha publicitária.

E foi circulando nesse meio que, em 1983, acabou indicada para um teste na TV Itapoan. A emissora queria uma cara nova para o programa Mulher Total, uma mistura de jornalismo, entrevistas e variedades. Ia ao ar das 9h às 11h, ao vivo, em uma época sem ponto eletrônico no ouvido ou teleprompter para projetar o texto a ser lido. Aprendeu na raça.

Abrindo a roda  A estreia de Katia na Itapoan competia com o TV Mulher, famoso programa global apresentado, entre outras, por Marília Gabriela e Marta Suplicy. “E a gente ganhava aqui, pois mostrávamos uma versão local”.

Foi lá que Katia passou a amar a Bahia. “Quando cheguei, achava tudo atrasado. Era má vontade minha, não estava olhando pro lado certo”, diz. O encanto surgiu quando ela teve contato maior com a cultura baiana. “Na TV, vi Luiz Caldas começando, Sarajane que nem sabia pra onde ir, o Chiclete, com Bel, que nem era o vocalista”.

Foi amor à primeira vista com a TV. Mas o trabalho do marido levou Katia, por dois anos, para uma pequena cidade inglesa. Katia, sempre pé de vento, largou tudo e se jogou. Fez cursos, foi dona de casa, viajou muito. Enfim, viveu.

Quando voltou ao Brasil, acabou o casamento e estreou na bancada do jornal de meio-dia da TV Bahia. O ano era 1986 e o destino sorria para Katia, que sorria de volta. “As coisas foram acontecendo. Agradeço a Deus todo os dias”.

Amor imenso  Na nova emissora, Katia Guzzo assumiu, na hora do almoço, o Bahia Agora, que atualmente é o Bahia Meio Dia. Nessa época, ela conheceu o famoso radialista Baby Santiago (1947– 2001). Ficaram juntos até a morte de Baby.

Em 1987, a jornalista foi convidada para assumir, provisoriamente, o jornal da manhã, que ia ao ar pouco antes das 7h. Acabou ficando lá até 1991, para desespero de Katia, que nunca escondeu gostar de uma boa farra. Acordar cedo era um suplício. “Uma vez, não acordei mesmo. E não menti”, afirma.

Nesses quatro matutinos anos teve de tudo. Atrasada, já bateu carro, atropelou gente na rua da emissora – a vítima não morreu, vale dizer. Como não existia celular na época, socorreu o atropelado e mandou avisar na Redação que não a esperassem. “E, às vezes, ia fazendo a maquiagem no carro, quando parava no sinal”. Entrar no estúdio colocando o microfone enquanto a vinheta já estava no ar também consta no currículo.

Katia nunca sentiu o frio na barriga que as entradas ao vivo costumam dar em alguns jornalistas. Tudo em um ao vivo conspira ao erro, diz. “Se está um caos segundos antes e na hora dá tudo certo, então valeu”, afirma.

Dessa forma, Katia foi levando a vida. E a mulher que nunca quis ser mãe acabou sendo a asa protetora dos dois filhos pequenos de Baby. Em meados dos anos 90, o radialista teve um diagnóstico tardio de hepatite C. Nos últimos anos, entrava e saía do coma.

“Foi um fim doloroso, ele teve isquemia cerebral (quando o oxigênio não chega corretamente ao cérebro). Baby foi o grande amor de minha vida, aprendi muito com ele”. Mas Deus foi generoso, afirma. Foi justamente o período que Katia mais trabalhou. A cabeça ficou no lugar.

Mas nem só de dor foi feito o convívio com Baby: “Era a voz mais bonita do país, me apaixonei logo”. Como era um homem do rádio, o convívio de Katia com artistas foi intenso - Chacrinha, Alcione, Amado Batista... A lista foi longa e eclética.

Que beleza  Hoje, Katia está com o freio puxado para festas. Já foi muito baladeira, mas agora gosta de coisas mais calmas. Prefere sair no início das semanas e pequenas reuniões. “Quero poder ficar bêbada em paz, ser levada até a cama pelos amigos”, diz, reclamando da patrulha sofrida por pessoas públicas. “Se ri mais alto, tomou todas. Se beijou, está namorando. Se trocou de paquera, é piriguete”.

Há 12 anos, mora sozinha e curte a solteirice. Prefere cada um na sua casa. Já teve namorado com metade de sua idade. Sem grilo. A idade não pesa na vida de Katia.

“A TV é cruel, engorda. A de tubo já engordava. Essas flat, então, esticam tudo. Só as magérrimas aparecem magras. Mas não me devo nada, está tudo certo. A beleza dos 20 anos é uma, a de 30 anos é outra, a dos 55 é outra, e assim vai. Lógico, a pele não é mais a mesma, mas sou bonita com minha idade. Envelhecer é libertador. Posso tudo”.

Alma gay Katia nunca fez terapia. Talvez por falar pelos cotovelos no dia a dia, cogita. “Sou meio over mesmo. Acho que, se nascesse homem, ia ser drag. Tenho a alma gay”, brinca, levantando para alinhar um livro na estante da sala de sua casa, na Barra. No móvel, repousa uma edição ainda não lida de Cinquenta Tons de Cinza, de E.L. James.

Ela não gosta muito de planejar o futuro, mas sabe que os dias de bancada não serão para sempre. “Quem sabe faça que nem Fátima Bernardes, vá ter um programa meu. Ou saia por aí fazendo matérias que goste”, afirma, deixando claro, mais uma vez, o lado pé de vento. Katia não gosta de saber o que há do outro lado da esquina. Mas ama dobrá-las.