Lei determina multa de 50% ao consumidor em caso de desistência de imóvel

Objetivo é unificar entendimento judicial sobre distratos, dar segurança a empresas e garantir prazo de entrega

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  • Victor Lahiri

Publicado em 29 de novembro de 2018 às 06:00

- Atualizado há um ano

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O advogado especializado em Direito Imobiliário, Felippe Cardozo, não acredita que questão da multa não será inteiramente resolvida pela nova lei. (Foto: Divulgação) A relação entre consumidores e incorporadoras imobiliárias está prestes a ser mudada. No último dia 20, o Senado deu um passo importante no projeto de lei que estabelece e fixa  multas ao consumidor que desista da compra de um imóvel. O PL 68/2018, por causa de emendas pontuais, voltou para a Câmara dos Deputados, mas deve ser aprovado sem novas alterações nos primeiros meses do ano que vem. A proposta prevê multas por desistência na compra de imóveis na planta, punição para as construtoras que atrasarem a entrega da obra e prazo de tolerância para arrependimento. O objetivo é oferecer maiores garantias ao comprador e também proteger incorporadoras da ação de especuladores que, segundo especialistas, estão entre os responsáveis pela crise do mercado imobiliário nos últimos anos.

A aprovação do texto vem sendo comemorada entre representantes do setor, principalmente por conta de um dos seus pontos mais polêmico, a multa por distrato. Atualmente, os casos de distrato (como é conhecida a desistência da compra de um imóvel) são resolvidos de acordo com a interpretação de cada juiz. No caso da penalidade por desistência, por exemplo, a maioria das decisões judiciais fixa multas a serem pagas pelo comprador  entre 10% e 25% do valor já pago. O restante é devolvido ao consumidor pela construtora. Em busca de uma uniformidade dos processos, o PL fixa o valor da multa em 50% do valor já pago, percentual que o presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário da Bahia (Ademi-BA), Claudio Cunha,  considera bom, pois vai aumentar o cuidado dos compradores na hora de fechar negócio.“É uma questão de segurança, pois a lei vem inibir a ação dos especuladores que compravam unidades visando o lucro. Mas, com a queda nos preços em função da crise, desistiam do contrato, prejudicando a incorporadora e os clientes que mantiveram os seus contratos, já que o valor das vendas é utilizado na construção” - Claudio Cunha, presidente da Ademi-BA.Em queda ao longo dos últimos três anos, o distrato ainda é um fantasma que segue assustando o setor. Segundo dados da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), 35% dos negócios realizados este ano resultaram em desistência. Esse percentual já chegou a 51% em 2016, gerando grandes prejuízos. De acordo com o CEO da Abrainc, Luiz França, a ausência de regras claras em relação ao distrato contribuiu para o desemprego no país, extinguindo mais de 1 milhão de postos entre 2010 e 2017. “Com as novas regras, o mercado imobiliário se adequa à realidade de outros setores de consumo, pois privilegia o consumidor de boa fé, dando garantias que a obra será entregue no tempo certo. E também favorecerá as empresas, que ganham mais confiança para lançar novos empreendimentos, fortalecendo a economia de um modo geral, já que o nosso setor utiliza matéria-prima e mão de obra local”, aponta.

Jurisprudência Para a Proteste - Associação de Consumidores, as novas regras propostas pela Lei do Distrato levam em consideração apenas os interesses das incorporadoras. Em nota, a entidade destacou que a justificativa dos pontos de maior polêmica prejudica o comprador, por não considerar o cenário de crise econômica que obriga o consumidor a desistir do sonho da casa própria, que será punido em até metade do que pagou.Mas,  para o CEO da Abrainc, a cobrança de uma multa alta é comum nos EUA e alguns países da Europa. “Em países desenvolvidos é comum ver a retenção de 100% do valor já investido. Entendemos que a nova lei é fundamental, pois não podemos permitir que apenas uma pessoa prejudique o anseio da coletividade, e isso exigirá uma maior reflexão e planejamento do consumidor antes de assinar o contrato”, comenta. 

Para o advogado especializado em Direito Imobiliário, Felippe Cardozo, a questão da multa não será inteiramente resolvida pela nova lei e os tribunais poderão confrontar as regras a partir do Código de Defesa do Consumidor. “A constestação, por parte do consumidor, ainda será possível. Acredito que só após a aprovação veremos como a Justiça vai reagir. Entendemos que o Brasil é um país que sofre mudanças econômicas a curto prazo, à parte dos especuladores, é possível que a pessoa que desistiu por uma questão de desemprego ou emergência por causa da saúde possa ter a sua situação flexibilizada”, afirma.

Positivo

Apesar das críticas de órgãos de defesa do consumidor, o advogado André Torres enxerga um pleito legítimo por parte das incorporadoras, e acredita que a principal mudança se dará na forma como o consumidor encara o planejamento para adquirir um imóvel. “Agora, entendendo as rápidas mudanças no cenário econômico, as pessoas precisam se planejar. Estamos ainda em um quadro de recessão, mas as pessoas seguem pensando no consumo não planejado. Prova disso é a Black Friday, que parou a cidade na última semana”, diz. Ele aponta que o ideal é iniciar o planejamento com uma poupança que acumule o máximo possível para dar como entrada, reduzindo os juros e a extensão do prazo de pagamento. “Além disso, é preciso reconhecer que os hábitos de consumo não poderão seguir em alta. O comprador deve cortar algumas mordomias para acomodar melhor o peso de uma prestação de financiamento”, complementa. Não menos importante que analisar bem o orçamento familiar, na opinião do advogado, é analisar bem todas as opções de financiamento e buscar uma assessoria financeira que ofereça a melhor opção para evitar que um sonho resulte em prejuízo.

Entenda a Lei do Distrato

Multa por Desistência da CompraComo é hoje Ao comprar a unidade na planta e desistir do negócio, o consumidor tem parte do investimento devolvido. Alguns contratos preveem a retenção de até 90% do valor já pago como forma de intimidar o cliente, mas a Justiça tem interpretado essa cláusula como abusiva e tem fixado a multa ao comprador em valores entre 10% e 25%. Com isso o compradore recebe uma quantia entre 90% e 75% do que investiu, incluindo valores dados na entrada e nas prestações mensais.

Como vai Ficar Por determinação da lei, a multa a ser cobrada do consumidor que devolver o imóvel poderá chegar a 50% do valor da compra.  

Prazo para a Desistência da compra Como é hoje A partir da assinatura do contrato, o cliente firma um compromisso com a incorporadora e, em caso de desistência, parte dos investimento já realizado será retido como multa. Não há prazo para desistência.Como vai ficar O comprador passa a ter um prazo de até  sete dias para voltar atrás e desistir do negócio, recebendo a totalidade do que já foi pago, inclusive a taxa de corretagem. 

Multa por Atraso na entrega do imóvelComo é hoje Uma das principais dores de cabeça do comprador, é o atraso na entrega. Atualmente, parte dos contratos diz que se construtora não entrega o imóvel no prazo pactuado, ela renova a data-limite por 180 dias sem indenização ao cliente. Se o atraso for mais longo e o cliente desistir da compra, a Justiça normalmente determina que a construtora devolva os valores pagos com correção e multa.

Como vai Ficar A construtora terá tolerância fixada em 180 dias de atraso sem ônus, porém, se esse limite for ultrapassado, o cliente pode cancelar o negócio e receberá tudo o que pagou de volta, com direito a multa, em até 60 dias. Se ele for à frente com o negócio, a empresa precisará indenizá-lo em 1% do valor já pago para cada mês de atraso.

Taxa de CorretagemComo é Hoje Quando o distrato ocorre por atraso na entrega (acima de seis meses), a  construtora terá que devolver a taxa de corretagem (6% do valor do imóvel). Porém, em caso de desistência do cliente, a Justiça determina que ele perca a taxa de corretagem.Como vai Ficar A decisão atual fica mantida por norma.