Maioria das cidades baianas faz contratos temporários e metade terceiriza serviços

Pesquisa da CNM aponta que na Bahia elas ocorrem mais nas aéreas de conservação, limpeza

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  • Mario Bitencourt

Publicado em 14 de janeiro de 2019 às 11:45

- Atualizado há um ano

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Estudo da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) aponta que 55% das cidades da Bahia (233, dos 417 municípios) possuem funcionários com contratos temporários e que ao menos metade delas (208) tem algum serviço terceirizado.

Esses números poderiam ser até maior, já que ficaram de fora da pesquisa 158 prefeituras que preferiram não responder aos questionamentos da CNM, realizados entre 29 de agosto e 11 de outubro de 2018.

Para a CNM, a contratação de serviços temporários e a terceirização dos serviços, previstos em alguns casos pela Constituição Federal, se tornaram “comuns na Administração Pública”, por possibilitar a redução de custos e a especialização na prestação dos serviços ou fornecimento de bens.

Mas o Ministério Público da Bahia (MP-BA) e o Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) observam certos exageros das Prefeituras nas contratações e terceirizações, muitas delas realizadas em atividades fim, quando a prioridade deveria ser para atividades meio.

O Tribunal observa que “nem sempre o número elevado de contratações temporárias/terceirizações significa a prática de irregularidade pelo gestor, até porque a própria legislação permite – em casos específicos – essas modalidades de contratação”.

Em relação à contratação temporária, a Constituição Federal (art. 37, IX) estabelece que os casos de contratação por tempo determinado devem obrigatoriamente atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.

Desta forma, quando as contratações forem realizadas fora das hipóteses permitidas pela Constituição serão consideradas ilegais.

Já na terceirização, os contratados, em regra, não poderão atuar em atividades finalísticas e permanentes da administração, tendo como foco de atuação a atividade meio.

Os MP-BA e o TCM relatam que tão comum quanto o ato de terceirizar ou contratar servidores temporários são os processos judiciais e multas decorrentes de exageros praticados pelas gestões municipais.

Onde ocorrem os contratos A pesquisa da CNM mostra que os contratos temporários de servidores em prefeituras da Bahia estão ocorrendo mais nas áreas da saúde (217 prefeituras), educação (193), assistência social (122), administração (95) e áreas específicas (advocacia, contabilidade, etc.) por parte de 74 prefeituras.

“Só em casos excepcionais poderia se justificar contratações para essas áreas, e num período curto, uns seis meses”, disse a promotora pública Heliete Rodrigues Viana, da 4ª Promotoria de Justiça da Cidadania. “Mas muitas vezes, elas são estendidas por muito mais tempo”.

Ela observa que as contratações temporárias foram incentivadas na Bahia pelo próprio Estado, quando há quase 20 anos criou brechas na legislação estadual para permitir a contratação dos famosos Redas – regime especial de direito administrativo.

“As prefeituras, pela sua autonomia administrativa, também fazem algo parecido, e muitas vezes para beneficiar parentes, grupo político, etc, para desempenho de funções em cargos efetivos. É uma burla para não fazer concurso público”, disse.

Com relação às terceirizações, que são permitidas em atividades como de limpeza, manutenção patrimonial e segurança, a promotora informou que elas ocorrem também onde não deveriam.

“São inúmeras ações que temos aqui por cauda desse problema”, ela disse, sem citar números, devido à falta de tempo para buscá-los. “Há prefeituras que criam leis específicas para este fim e depois dão uma interpretação muito extensiva, fazendo com que as contratações ou terceirizações durem muito mais que o tempo ideal”.

As prefeituras que responderam à CNM justificaram as contratações temporárias devido a necessidades surgidas em calamidades públicas (7 delas), serviços especializados (198) ou as duas situações anteriores (25). Três não responderam.

Outras justificativas dadas são a demanda superior à capacidade do quadro de funcionários atual (138 prefeituras), a necessidade de suprir cargos vazios por licenças, afastamentos, suspenções, etc. (155), a difícil fixação de um profissional na cidade (67), a transitoriedade de programas federais (74) e outros motivos (17).

Outro dado da pesquisa é que 180 cidades baianas possuem acima de 40 funcionários contratados, 16 administrações estão com 21 a 30 funcionários, 10 delas têm entre 131 a 40 servidores contratados e nove estão com até 10 servidores não concursados.

Prestação de serviços No que se refere à terceirização, a pesquisa da CNM aponta que na Bahia elas ocorrem mais nas aéreas de conservação, limpeza e manejo de resíduos sólidos (127 prefeituras), transporte escolar (131), informática (80), telecomunicações (42), manutenção de prédios (38) e vigilância patrimonial (21).

O presidente da União das Prefeituras da Bahia (UPB), Eures Ribeiro (MDB), prefeito de Bom Jesus da Lapa, foi procurado para comentar a pesquisa, mas a assessoria de comunicação da entidade informou que ele estava em viagem e não conseguiu contato.

Ao comentar sobre os contratos temporários de servidores, o TCM informou que “promove mensalmente – através das suas Inspetorias Regionais de Controle Externo – o acompanhamento das contratações de pessoal realizadas pelos jurisdicionados”.

Caso se identifique alguma irregularidade, o gestor é notificado para apreciação e apresentação de esclarecimentos. Se persistir a irregularidade, “a matéria segue para julgamento no bojo da prestação de contas anual, o que pode causar a imputação de penalidade pecuniária (multa e ressarcimento) ao gestor, assim como representação ao MP-BA ou Ministério Público ou Federal.”

Dependendo da gravidade da situação, os auditores também podem lavrar de imediato um termo de ocorrência para apurar especificamente a irregularidade, informou o TCM.

Prefeitura da Bahia contratou mais de 5 mil sem concurso Em um dos casos mais excepcionais da Bahia no que se refere a administração municipal, a prefeitura de Dias d’Ávila, no Recôncavo Baiano, contratou 5.362 servidores sem concurso público.

O caso considerado de contratação ilegal foi constatado pelo TCM, em análise de processos durante a gestão de 2013 a 2016 da prefeita Jussara Nascimento (PT), que foi reeleita.

A auditoria constatou que “durante o período analisado, foram identificadas irregularidades na contratação de pessoal sem a realização de concurso público ou processo seletivo simplificado, bem como não ficou demonstrada a existência de situação emergencial e de excepcional interesse público a justificar as contratações temporárias”.

A gestora foi multada em R$ 25 mil e teve representação encaminhada ao MP-BA, a quem cabe apurar a eventual prática de ato ilícito pelo gestor. Em contato com a prefeitura de Dias d’Ávila, foi informado ao CORREIO dois celulares da secretária de Administração Maria da Paixão, mas os dois estavam desligados.

Sobre terceirização, um caso de destaque na Bahia ano passado foi o da prefeitura de Poções, na gestão do prefeito Leandro Araújo Mascarenhas (PTB), que contratou duas cooperativas para exercer atividades fins, o que contraria a Constituição.

As contratadas foram a Cooperativa de Trabalho e Serviços do Oeste da Bahia (COOTRASEO-BA) e da Cooperativa de Trabalho e Prestação de Serviços Gerais Específicos (COOPSERVA).

O gestor foi multado em R$ 40 mil e teve a determinação de formulação de representação ao MP-BA. Procurada, a assessoria de comunicação não deu retorno.

O mesmo ocorreu com o prefeito de Catu Geranilson Dantas Requião (PT), que teve o Termo de Ocorrência nº 53220-15 julgado procedente, em razão de irregularidades na contratação da COOFSAÚDE – Cooperativa de Trabalho no exercício de 2014.

O TCM considerou que a cooperativa também foi contratada para exercer atividade finalística. O gestor foi multado em R$25 mil e o processo foi encaminhado ao MP-BA. A assessoria de comunicação de Catu também não respondeu ao CORREIO.

No Baixo Sul da Bahia, a prefeitura de Cairu também tem encontrado problemas com a contratação pessoal. Por lá, de acordo com o constatado pelo TCM, está ocorrendo contratações que comprometem a folha de pagamento mais de 54%, limite da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Julgado em dezembro de 2018, o problema é referente ao ano de 2017 da gestão do prefeito Fernando Antônio dos Santos Brito (MDB), que teve as contas daquele ano rejeitadas pelo TCM.

O relator do parecer com a rejeição, conselheiro substituto Cláudio Ventin, imputou ao gestor multa de R$60.480, que corresponde a 30% dos seus subsídios anuais, pela não recondução da despesa ao limite previsto na LRFl. A despesa total com pessoal correspondeu a 67,94% da receita corrente líquida do município no exercício.

Em nota, a Prefeitura de Cairu, que declarou que não fez parte da pesquisa da CNM, informou que “apresentará defesa do gestor” ao TCM e que tem atualmente  443 funcionários efetivos, 33 servidores temporários (por contratação direta) e 138 através de Reda.

“No último concurso público, realizado em setembro passado, foram selecionados  261 novos servidores, que estão em fase de convocação”, informa a prefeitura. “Cairu é o único município da região do Baixo Sul que fez concurso público em 2018”, garantiu.