Manaus é um alerta para o mundo

Capital do Amazonas enfrenta colapso no abastecimento de oxigênio para pacientes

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  • Donaldson Gomes

Publicado em 16 de janeiro de 2021 às 07:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Daniel Teixeira/Estadão Conteúdo

Uma multidão aglomerada na porta do maior pronto-socorro de Manaus (AM) busca atendimento. Lá dentro falta oxigênio. Há relatos de profissionais de saúde bombeando manualmente ar nos pacientes numa tentativa de evitar que o caos se apodere do local. O cenário macabro serve de alerta para o mundo, avisa a Organização Mundial de Saúde (OMS), enquanto o secretário de Saúde do Amazonas, Marcellus Campêlo, lamenta o pouco caso da população com a pandemia. 

No ambiente político, trocas de acusações. O Whatsapp foi palco de milhares de julgamentos virtuais e durante a noite da última sexta-feira sacadas em algumas das principais cidades do país se tornaram espaços de protestos. Em meio a toda a repercussão, o Ministério da Saúde consegue garantir 48 horas de respiro para bebês prematuros e uma rede de solidariedade une anônimos e celebridades. 

Pelo menos 235 pacientes com covid-19 serão transferidos da rede pública hospitalar para sete estados e o Distrito Federal, informou o governo do Amazonas. Um primeiro grupo que estava na  rede estadual já foi removido para continuar o tratamento na capital piauiense, Teresina. 

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, determinou que o governo federal tome providências imediatas para resolver o problema da falta de oxigênio e de insumos nos hospitais de Manaus. Lewandowski deu 48 horas ao governo para apresentar o planejamento que adotou ou pretende desenvolver para o enfrentamento da situação de emergência, discriminando ações, cronogramas, parcerias correspondentes e recursos financeiros. O plano deve ser atualizado a cada dois dias.

A pandemia já provocou quase 6 mil mortes no Amazonas. Mais de 223 mil casos do novo coronavírus já foram registrados desde o início da pandemia. Nos primeiros nove dias do ano, o número de internações com sintomas da doença já superava todo o mês de dezembro e a média de mortes cresceu 187% nos últimos 7 dias.

Críticas O epidemiologista da Fiocruz Manaus Jesem Orellana acredita que as autoridades perderam a oportunidade de frear a segunda onda de contaminação na região. No jogo de erros, ele destaca que as medidas de isolamento foram afrouxadas a partir de 31 de maio – o governo recuou de um decreto para o fechamento do comércio. E agora, o estado esperou até o último momento antes de pedir ajuda diante do iminente desabastecimento de oxigênio. 

O secretário de Saúde do Amazonas, Marcellus Campêlo, disse que a sociedade amazonense fez uma “opção” pela contaminação. Segundo ele, o governo estadual teria feito tudo o que podia para evitar o atual cenário. “Quando a sociedade opta pela contaminação, invariavelmente, 15 dias depois, nós sofremos o pico dessa aglomeração”, disse.

Marcellus Campêlo lamentou medidas de flexibilização adotadas pelo governador Wilson Lima, para quem ele trabalha. “O governador flexibilizou algumas medidas (em relação ao decreto inicial), mas se elas fossem executadas, teriam reduzido em muito (o número de internações)”. 

A brasileira Mariângela Simão, diretora para acesso a medicamentos da Organização Mundial da OMS, disse que o que está acontecendo em Manaus deve servir de alerta para outros lugares do mundo. Ela alertou que a crise na capital do Amazonas mostra que a pandemia ainda não terminou. “Manaus passa por uma situação muito difícil. Devido a um falso sentimento de segurança, eles baixaram a guarda”, afirmou a brasileira.

Após o agravamento da situação na região Norte, o governo federal recuou da elevação do imposto de importação sobre itens necessários para combater a covid-19, entre eles os cilindros de oxigênio. A Câmara de Comércio Exterior (Camex), do Ministério da Economia, decidiu reverter o aumento na noite desta sexta-feira. 

O presidente Jair Bolsonaro minimizou nesta sexta-feira as mortes decorrentes do novo coronavírus e declarou que “não tem por que ter esse trauma toda apenas preocupado com a Covid”. Sobre a situação de Manaus, ao ser questionado se a situação estaria melhor com medidas de isolamento, culpou o calor, que estaria fazendo as pessoas saírem de casa: “Semana passada a temperatura subiu em Manaus, e os problemas começaram a aparecer”. 

O presidente disse ainda que enviou o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, na última segunda-feira, para intervir na cidade e ele imediatamente começou tratamento precoce. Segundo ele, o governo está “fazendo o possível”, mas foi surpreendido por encontrar o sistema de saúde local “numa situação bastante complicada”.

Solidariedade Com a crise em Manaus, famosos e anônimos mobilizaram nas redes sociais campanhas para arrecadar recursos e cilindros de oxigênio. Uma dos primeiros foi o humorista Whindersson Nunes. No Twitter, ele replicou a campanha “SOS AM - A saúde precisa da nossa ajuda”. Nomes como Tatá Werneck, Paulo Coelho, Felipe Neto e Luciano Huck participaram da mobilização, que teve grande participação de anônimos. 

Aqui na Bahia, o Hospital Martagão Gesteira enviou um ofício para o Ministério da Saúde, para informar que disponibilizará dez novos leitos de pediatria para crianças de Manaus.