Médicos que denunciaram Prevent Senior narram pressão por kit covid e ameaças

Três médicos resolveram se expor pela primeira vez para falar sobre o caso

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  • Da Redação

Publicado em 4 de outubro de 2021 às 08:04

- Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução/TV Globo

Os médicos que organizaram o dossiê com as denúncias sobre a Prevent Senior, entregue na CPI da Covid, relataram uma rotina de pressão da diretoria da operadora para a alta precoce de pacientes, para diminuir custos e liberar leitos de UTI. Depois das denúncias, os médicos George Joppert, Walter Correa e Andressa Joppert contaram em entrevista ao Fantástico, da TV Globo, que vivem atualmente uma rotina de medo, apreensão e insegurança.

“Nós estamos fazendo a coisa certa. Nós não somos criminosos. O bem social acho que tem que prevalecer acima de qualquer outra definição, ou de dinheiro ou de lucro”, afirmou George Joppert. Os médicos devem ser ouvidos pela CPI nos próximos dias.

Os três relataram sobre a pressão para receitar o kit covid, e que não havia autonomia dos médicos para a prescrição desses remédios durante a pandemia. “Eles estavam de olho em quem prescrevia ou não. Foi uma coisa que eles tinham um controle, então não havia essa autonomia”, afirmou Walter Correa.

Ele conta que os kits ficavam nos consultórios e os médicos ainda tentaram preservar alguns pacientes. “Entregava a receita, entregava o kit que já ficava no consultório. Era tudo controlado. Ficava um balde com um monte de saquinho com os kits, era meio constrangedor às vezes, entregava para os pacientes a receita com kit e orientava 'olha, a gente tem que prescrever mas melhor usa só as vitaminas, não usa medicação'. E era assim que funcionava”, completou.

Andressa diz que um diretor chegou a obrigá-la a receitar hidroxicloquina a uma paciente com problemas cardíacos, sob ameaça velada de demissão. “É uma contraindicação para o uso de hidroxicloroquina. Até no próprio protocolo da Prevent é uma contraindicação. Então, mesmo com aquela contraindicação, eu fui orientada. Teria que prescrever, mas eu não prescrevi. E fui chamada atenção”, afirmou a médica.

Ainda segundo ela, os médicos que se recusavam a prescrever o kit, sofriam sanções da empresa. “Ele teria um castigo. Ficaria sem os plantões uma semana, duas semanas, dependendo do que ele fez. O castigo dele seria isso: não teria o dinheiro dele planejado no fim do mês”, disse Andressa.

“Não era necessário que fosse feito uma ameaça aos médicos. O ambiente hostil já fazia isso por si só. A gente já sabia que existe uma sugestão de um protocolo, se você não segui-lo, você vai sofrer sanções. O máximo que acontecia era alguém prescrever e orientar a não usar”, declarou Walter Correa, que trabalhou oito anos como plantonista do Pronto Socorro da Prevent Senior.

Redução de custos A Prevent Senior tem atualmente mais de 500 mil clientes. No ano passado, o lucro da operadora de plano de saúde chegou a quase meio bilhão de reais.

Apesar disso, os médicos que denunciaram que a distribuição do “kit Covid’ para pacientes da empresa era uma forma de reduzir o número de pacientes que procuram os hospitais para buscar tratamento e, dessa forma, diminuir também os custos da operadora. “Importa é o fluxo, importa é o número, não importa o paciente. Vejo a Prevent como especialista em números e não importam as pessoas”, disse o médico Walter Correa.

Os médicos da Prevent Senior também disseram que tinham que cumprir uma meta: atender 60 pacientes em 12 horas, o que representa um paciente a cada 12 minutos.

“Infelizmente eles têm essa política, mas felizmente a gente tem essa parte da ética. E a gente sempre tentou fazer conforme a ética. Eu várias vezes levei bronca lá por não cumprir a meta”, contou Andressa Joppert.

Ameaças Os médicos dizem que decidiram se expor para denunciar práticas ilegais por parte da Prevent Senior para que elas tivessem fim. Mas, desde que seus nomes foram divulgados pela própria operadora, eles relatam uma rotina de medo, apreensão e insegurança.

O médico Walter Correa chegou a registrar boletim de ocorrência depois que recebeu uma ligação do diretor-executivo da empresa, Pedro Batista Júnior. “A minha esposa estava do lado e ficou apavorada com aquilo. Queria até ir embora da cidade. Ficou assustada, temendo pela minha filha, a gente ficou apavorado com aquilo”, afirmou.

Pedro Batista Júnior e a direção da Prevent Senior enviaram esta nota ao Fantástico. Na nota, o diretor disse que "refuta a suposta ameaça", que se tratava de uma conversa entre, até então, dois amigos, em que ele, Pedro, alertava para a "má conduta da violação do prontuário de um paciente".

O diretor-executivo falou que vai processar Walter Correa por denunciação caluniosa.

Sobre a afirmação da médica Andressa Joppert, de ter sido obrigada a receitar hidroxicloroquina para uma paciente cardíaca, a Prevent Senior informou que a paciente recebeu os tratamentos adequados, foi acompanhada pelos cardiologistas da empresa e encontra-se em bom estado de saúde.

"A Prevent Senior jamais adotou protocolos para redução de custos. Pelo contrário, investiu R$ 250 milhões durante a pandemia na aquisição de equipamentos, contratação de profissionais e um programa de testagem em massa que atendeu mais de 500 mil beneficiários, com milhares de vidas salvas. Os médicos da Prevent jamais negligenciam as consultas, que duram o tempo necessário", informou a nota.

A empresa também afirmou que os médicos estão mentindo e forjando acusações, “montadas a partir da manipulação de mensagens por três médicos demitidos da empresa por condutas irregulares”. Dentre elas, casos de "mau atendimento a pacientes que resultaram em boletins de ocorrência".