‘Minha tia se tornou posse de Graziela’, diz sobrinho de Mãe Stella de Oxóssi

Para ele, enterro em Nazaré seria uma afronta ao Candomblé e vai ser cobrado aos filhos de Santo

  • Foto do(a) author(a) Alexandre Lyrio
  • Alexandre Lyrio

Publicado em 28 de dezembro de 2018 às 13:19

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO

Parentes, amigos, filhos e filhas de Santo de Mãe Stella de Oxóssi, ialorixá do terreiro Ilê Axé Opô Afonjá, que morreu nesta quinta-feira (27), em Santo Antônio de Jesus, já começaram a chegar à cidade de Nazaré das Farinhas, onde estava marcado para acontecer o enterro, às 16h.

O corpo da Mãe de Santo está sendo velado na Câmara de Vereadores do município. No entanto, a Justiça concedeu no início desta tarde uma liminar que permite a transferência do corpo da ialorixá para a sede do terreiro, em Salvador. Com isso, agora há um impasse sobre o local do enterro de Mãe Stella. Ao comentar a decisão da Justiça, Anderson destacou que "é resposta do Orixá. Xangô fez Justiça". 

O sobrinho de Stella e abiodun (braço forte) da ialorixá, Adriano Azevedo, explicou que, de acordo com a tradição do Candomblé, desde o nascimento até a morte, é necessário se passar por rituais. “A gente faz as obrigações, da cabeça e do corpo, chamadas de iniciação. Isso acontece durante toda a vida. E, quando a gente morre, essas obrigações são concluídas, em um ritual chamado Axexê”, disse.

Ainda segundo Adriano, por se tratar de Mãe Stella, que é ialorixá, os rituais são ainda mais específicos. “É o mesmo procedimento adotado quando Mãe Menininha [do Gantois] e Mãe Olga [do Alaketu] morreram. Se esses rituais não forem cumpridos, todos nós, filhos e filhas de Santo, além do terreiro, vamos ter de pagar de alguma forma”, declarou.

Impasse

Desde 2017, quando se mudou do Ilê Axé Opô Afonjá, Mãe Stella viveu momentos de divergência entre os filhos e filhas de Santo e a companheira dela, Graziela Domini, o que não vem sendo diferente agora, com a morte da ialorixá. 

O sobrinho de Mãe Stella, Adriano Azevedo, disse que a tia se tornou “posse de Graziela”. “Minha tia ela, há alguns anos, foi perdendo autonomia. Ela foi sempre uma mulher que se impunha, a palavra dela era única, mas ela foi ficando mais velha e foi perdendo o poder da voz”, afirmou.

Leia também:' Se um juiz me obrigar a entregar o corpo dela eu entrego, diz companheira de Mãe Stella 

Ainda de acordo com Adriano, antes de receber a notícia da liminar judicial que determinou a transferência do corpo de Mãe Stella para Salvador, o enterro da ialorixá em Nazaré das Farinhas seria algo absurdo. “Mãe Stella não é de Nazaré. Ela é natural de Salvador, nasceu na Ladeira do Ferrão, e ligação nenhuma com Nazaré das Farinhas”, comentou.

Ele também cogitou que todo o movimento em torno da morte da tia poderia se tratar de aproveitamento político. “Eu espero que a morte de Mãe Stella não seja um atrativo político para promover ninguém”, declarou.

Medo

Antes de a juíza de Nazaré das Farinhas determinar que o corpo da ialorixá fosse transferido para Salvador, todos os amigos, parentes, admiradores, filhos e filhas de Santo estavam na Câmara de Vereadores da cidade velando o corpo da Mãe de Santo.

No entanto, Adriano contou ao CORREIO que não estava se sentindo seguro e sentia muito medo de estar no município. “Eu tô com medo, me sentindo acuado ao ver pessoas à paisana, armadas. Estou com medo por mim e meus irmãos, porque nós não conhecemos ninguém em Nazaré e estamos sendo recepcionados por homens que não sabemos nem quem são”, disse.

Outro medo de Adriano é que o enterro da ialorixá não aconteça conforme determina a tradição do Candomblé, passando por todos os rituais pós morte. “Eu temo muito pelo futuro do Ilê Axé Opô Afonjá, porque seremos cobrados por isso no futuro. Gostaria, também, de pedir aos colegas de outros terreiros que nos entendam, porque essa situação não depende da gente”, afirmou.

Para o sobrinho Maria Stella de Azevedo Santos, a Mãe Stella, ainda em vida, a tia determinou que a escolha sobre os axexê dela seriam totalmente dele. “Ela me disse: ‘você é meu abiodun, você é meu braço, você resolve’. E, neste momento, eu não estou me sentindo tão forte para tomar as rédeas da situação, que não depende mais de mim”, declarou.