Missa para Santa Dulce reúne quase 53 mil

Cerimônia foi celebrada pelo arcebispo de Salvador, Dom Murilo Krieger

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  • Andreia Santana

Publicado em 21 de outubro de 2019 às 00:52

- Atualizado há um ano

. Crédito: Betto Jr./CORREIO

A alegria de um grupo de jovens, saindo da Arena Fonte Nova pouco depois das 20 horas deste domingo, 20, e cantando o refrão dos hinos dedicados à Santa Dulce dos Pobres a plenos pulmões, enquanto avançavam pelas ruas de Nazaré, é um dos melhores exemplos do êxtase sentido por aqueles que foram ao estádio assistir à celebração que comemorou a canonização da freira baiana, ocorrida no último dia 13, no Vaticano. 

“É uma alegria que não sente cansaço”, como bem definiu uma devota, ainda no portão de saída que dá acesso à Ladeira da Fonte. “Eu estou no céu”, afirmou outra, reforçando o sentimento de paz que tomou conta das 52.600 pessoas (49 mil fiéis e 3.600 voluntários e convidados) que compareceram ao evento.

Embora o acesso à arena tenha começado desde o meio-dia, as arquibancadas lotaram a partir das 15h, quando teve início o espetáculo ‘Império do Amor’, sobre a trajetória da santa que fez da caridade uma missão de vida. Depois da performance, que terminou por volta das 16h30, uma procissão com as relíquias de Santa Dulce preparou a audiência para a missa solene celebrada pelo arcebispo de Salvador e primaz do Brasil, Dom Murilo Krieger. 

As relíquias, que foram conduzidas pelo miraculado José Maurício Moreira, o maestro que ficou 14 anos cego e recuperou a visão graças à Santa Dulce, levaram a enfermeira Ângela Lima de Freitas, 57 anos, às lágrimas.  Dom Murilo preparou homilia em formato de carta para Santa Dulce (Foto de Betto Jr./CORREIO) “Santa Dulce é uma inspiração de como você pode ser grande sem precisar de pompa, porque ela era simples, embora conhecesse gente poderosa, e era abnegada, porque não fazia questão de nada para ela, só para seus pobres e doentes”, disse, comovida ao ver o relicário passar pelo palco.

Além do miraculado José Maurício, a outra agraciada com um milagre de Santa Dulce, Cláudia Araújo, participou do cortejo ao lado do filho Gabriel, que estava bastante emocionado.

A missa solene, a primeira para Santa Dulce dos Pobres celebrada no Brasil, foi assistida por autoridades como o prefeito ACM Neto e o governador Rui Costa. A cerimônia começou com a entrada dos diáconos, presbíteros, padres e bispos, todos usando vestes brancas.

No gramado e nas arquibancadas, o público acompanhava o cortejo de religiosos e a procissão com as imagens de Santo Antônio, Nossa Senhora da Conceição e Senhor do Bonfim. Como um maestro da fé, o mestre de cerimônias do evento, o padre Edson, pároco da Basílica do Bonfim, convocava o público para sentar, levantar , cantar os hinos ou rezar de acordo com os rituais litúrgicos. Fiéis iluminaram a Fonte Nova com celulares para passagem da imagem de Santa Dulce (Foto: Betto Jr./CORREIO) Antes do início da missa, foi lida uma carta do Núncio Apostólico (o equivalente a um embaixador do Vaticano no Brasil), o arcebispo italiano Giovanni d'Aniello, que não pode participar da cerimônia, mas enfatizou “estar com os baianos em espírito e oração”.

Dom Murilo, por sua vez, preparou a homilia em forma de carta para Santa Dulce, dialogando com ela de forma emocionante no altar: “Santa Dulce dos Pobres, a Bahia está em festa, o Brasil todo se alegra e reconhece a sua santidade”, disse o arcebispo, que logo em seguida a chamou de ‘Irmã Universal” e lembrou que Irmã Dulce teve seu dom para a caridade concedido por Jesus e que ela “sempre confiou na Providência Divina e foi muito amada em vida”. Chica Viana acredita que voltou a andar após acidente por causa de Santa Dulce (Foto: Andreia Santana/CORREIO) Após a celebração eucarística e a benção final da missa, a imagem da Santa Dulce dos Pobres seguiu em procissão pelo altar, fechando a cerimônia, iluminada apenas pelas lanternas dos celulares dos quase 53 mil fiéis. As luzes da arena foram todas apagadas e os pontos luminosos nas arquibancadas pareciam uma chuva de estrelas cadentes.

Voluntária nas Osid, a professora Chica Viana, 40 anos, foi ao evento agradecer uma graça alcançada por intermédio da Santa Dulce. Há quatro anos, ela sofreu um acidente e os médicos disseram que jamais andaria. Apegou-se à Santa Dulce e estava lá na Arena, de pé e afirmando sua fé: “Ela é santa desde sempre”.

Devotas de Santo Antônio

Dona Eulália Maria, 80 anos, têm em comum com a Santa Dulce dos Pobres a devoção por Santo Antônio. As duas até já dividiram um café da manhã. Em um evento religioso no antigo Retiro de São Francisco, em Brotas, a freira veio sentar-se na mesma mesa onde ela estava.

Desde criança, a menina Eulália foi acostumada a rezar a trezena de Santo Antônio, todo mês de junho, pois sua mãe, tradicionalmente, organizava a festa em casa. Também frequentava a igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos - a mãe e o avô, marceneiro que esculpia peças para as procissões, eram devotos e integravam a irmandade. Dona Eulália é devota de Santo Antonio assim como era a Santa Dulce (Foto: Andreia Santana/CORREIO A obra da Santa Dulce, ela também conheceu “bem novinha”, quando fazia parte da Guarda Juvenil de São Francisco e, ao lado dos irmãos, participava do Círculo Operário da Bahia, fundado por Irmã Dulce.

Professora aposentada depois de quase 40 anos dedicados à sala de aula, dona Eulália, viúva há três anos - depois de mais de cinco décadas de casamento -, nos tempos de magistério passou 10 anos dedicada a um projeto de alfabetização de crianças com deficiência. Da sua ‘amiga’ Dulce, aprendeu o exemplo da dedicação aos pobres.

Neste domingo, ela assistia à celebração para a santa baiana ao lado da filha do coração, Edileuza Souza Cruz. Ela tem mais dois filhos biológicos e cinco netos, enumerou com orgulho. Mais orgulho sentia de presenciar a cerimônia, pois o Anjo Bom do Brasil merece todas as homenagens:

“Todo mundo chama ela de santa desde que recebeu o título de Bem-Aventurada. Para mim ela sempre foi santa e eu acompanho as obras sociais há muitos anos. Fui à cerimônia de beatificação e frequento o santuário dela”, contou a professora, que também faz parte da paróquia de Santa Thereza D´ávila, em Luis Anselmo.

Salvador como rota religiosa Prefeito ACM Neto foi à missa ao lado dos pais, Rosário e Antonio Carlos Júnior, e das filhas Lívia e Marcela (Foto: Valter Pontes/Secom) Acompanhado pelas filhas Lívia e Marcela e pelos pais, Rosário e Antonio Carlos Júnior, o prefeito ACM Neto assistiu à missa solene celebrada por Dom Murilo e, logo no começo da cerimônia, se emocionou durante a entrada da imagem de Santo Antônio no altar, cantando o hino dedicado ao santo junto com os demais fiéis.

Logo na chegada à Arena, Neto foi perguntado sobre o que o seu avô, o senador Antônio Carlos Magalhães, acharia do evento, se estivesse vivo, e respondeu sem hesitar: “Meu avô estaria aqui vibrando. ACM, como poucas pessoas, sabia valorizar as coisas importantes da nossa terra. E foi por isso que ao longo de toda a vida, ele esteve ao lado de irmã Dulce, ajudou muito na consolidação das obras sociais, sempre foi um parceiro, um amigo. Tenho certeza de que ele hoje estaria aqui muito feliz, um daqueles momentos que marcaria a vida dele”.

Sobre a importância do evento para Salvador, o prefeito acredita que a celebração da primeira missa no Brasil para a Santa Dulce dos Pobres “só reforça a importância da fé do povo baiano”. Ele também enfatizou que, embora o motivo principal da sua presença no evento fosse a fé, ali estava também uma ótima oportunidade para a prefeitura desenvolver ainda mais uma estratégia para fortalecer o turismo religioso em Salvador. 

“Com toda a requalificação que foi feita no Bonfim e no santuário de Irmã Dulce, além da consolidação do Caminho da Fé, com os Dendezeiros em obra a ser entregue no começo de janeiro, a ideia é que a cidade possa receber ainda mais um número maior de turistas, romeiros, peregrinos, pessoas que virão para Salvador para conhecer mais de perto a obra da nossa Santa Dulce. Portanto, há aí um elemento importante e que a Prefeitura pretende estreitar ainda mais esse trabalho com a própria igreja”.

O vice-prefeito Bruno Reis também compareceu à missa acompanhado da esposa e ressaltou que o reconhecimento à Santa Dulce era mais do que merecido.  “Que, a partir disso, seus exemplos se multipliquem pela Bahia, pelo Brasil e pelo mundo, e que sirvam para estimular a muitos e muitas Irmãs Dulce, ajudando o trabalho social que é importante em um país onde as pessoas precisam muito de amparo social”, afirmou.

Já o governador Rui Costa, que assistiu ao evento acompanhado da primeira-dama e presidente das Voluntárias Sociais da Bahia (VSBA), Aline Peixoto, e de José Maurício Moreira e Cláudia Araújo, os dois miraculados que receberam as curas que deram ao Vaticano as provas da santidade de Irmã Dulce, defendeu que com a canonização da freira, “a Bahia torna-se uma referência ainda maior do que já é da fé, com suas mais de 300 igrejas, como a do Bonfim, de Nossa Senhora da Conceição da Praia, do Rosário dos Pretos e de São Francisco. Isso vai ser muito bom também para reforçar o destino religioso que é a nossa capital".