MPT rejeita denúncias contra processo seletivo do Magazine Luiza

Denúncias acusavam a empresa de promover “prática de racismo” por “impedir que pessoas que não tenham o tom de pele desejado pela companhia” participem da seleção

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  • Da Redação

Publicado em 24 de setembro de 2020 às 19:52

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Divulgação

O Ministério Público do Trabalho em São Paulo indeferiu, na última semana, todas as 11 denúncias recebidas contra o Magazine Luiza relatando discriminação por parte da empresa em processo de seleção para trainees voltado para pessoas negras. Para o MPT, o caso não é uma violação trabalhista, mas uma ação afirmativa de reparação histórica.

As denúncias acusam a empresa de promover “prática de racismo”, nas palavras de um dos denunciantes, pois “impede que pessoas que não tenham o tom de pele desejado pela empresa” participem do processo seletivo. O Magazine Luiza abriu o processo seletivo exclusivo para negros na última sexta-feira (18).

No indeferimento, o MPT afirma que a política da empresa é legítima e que não existe ato ilícito no processo de seleção. O entendimento é de que a reserva de vagas à população negra é plenamente válida e configura ação afirmativa, além de “elemento de reparação histórica da exclusão da população negra do mercado de trabalho digno”. A exclusão se traduz na falta de oportunidades de acesso ao emprego, na desigualdade de remuneração e na dificuldade de ascensão profissional, “quando comparado aos índices de acesso, remuneração e ascensão profissional da população branca”.

Em 2017, uma pesquisa do Instituto Ethos com as 500 empresas de maior faturamento do Brasil apontou que os profissionais negros correspondiam a apenas 6,3% dos postos de gerências e 4,7% do quadro executivo. O estudo ilustra que nas posições de liderança se refletem as desigualdades raciais que impedem a representatividade majoritária da população negra, configurando o racismo estrutural que inviabiliza a equidade no mercado de trabalho.

O MPT também ressaltou no indeferimento que ações afirmativas do tipo possuem amparo na Constituição Federal, no Estatuto da Igualdade Racial e na Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial, da qual o Brasil é signatário. Além disso, são objeto de atuação estratégica e prioritária do próprio MPT, por meio do Projeto Nacional de Inclusão Social de Jovens Negras e Negros no Mercado de Trabalho, consolidado em 2018 na Nota Técnica do Grupo de Trabalho de Raça.

Em nota divulgada no domingo, após o início da polêmica sobre o processo seletivo do Magazine Luisa, o MPT fez um chamamento às empresas para implementarem o projeto nacional de inclusão e para que respeitem “ações positivas tendentes à promoção da igualdade racial no trabalho, no marco do texto constitucional, tratados internacionais e legislação nacional”.

Saiba mais como empresas podem e devem desenvolver programas de contratação específica para população negra na nota técnica do MPT.

Caso de discriminação racial “O que os empregadores não podem fazer é criar seleções em que haja reserva de vagas ou preferência a candidatos que não integram grupos historicamente vulneráveis”, alerta a coordenadora nacional de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho, procuradora Adriane Reis de Araujo. 

Em 2006, o Brasil já foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por um caso considerado “prática de discriminação odiosa”.

O caso aconteceu em 1997, quando a empregada doméstica Simone André Diniz denunciou o racismo contido em um anúncio de emprego publicado na Folha, que trazia “preferência branca” como pré-requisito para a vaga.  Ao ligar para o número do anúncio e revelar que era negra, Simone foi rejeitada por não preencher os critérios exigidos. Apesar de a própria autora do anúncio ter admitido em investigação a preferência por uma empregada doméstica branca, o caso acabou arquivado.

Segundo a Corte, o Estado brasileiro violou artigos da Convenção Americana de Direitos Humanos e da Convenção Racial ao permitir que um caso de racismo fosse arquivado sem a abertura sequer de uma ação penal, o que acabou sendo considerado prática de racismo institucional.