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Doris Miranda
Publicado em 20 de julho de 2020 às 20:40
- Atualizado há 2 anos
Seria uma sorte se todos pudessem ter Drauzio Varella como médico da família. O paulistano fala sobre tudo com muita clareza, dá conselhos valiosos, tem grande empatia pelos excluídos e muito apreço pelo SUS. Seria o ministro da saúde perfeito, indagou o publicitário baiano Joca Guanaes (@jocaguanaes) na live que conduziu com Varella no instagram do CORREIO (@correio24horas), na noite desta segunda-feira, pelo projeto #segundou. >
“Não aceito de jeito nenhum, eu seria um desastre como ministro da saúde, principalmente com a maneira como está sendo administrado o sistema público de saúde”, disse o médico paulistano de 77 anos, que é casado há três décadas com a atriz Regina Braga, mãe do também ator Gabriel Braga. Na próxima segunda-feira, às 19h, a live é com a modelo e apresentadora Luiza Brunet (@luizabrunetoficial).>
Reveja o bate-papo abaixo: >
Professor Com 50 anos de prática na medicina, com especialidade em oncologia, doutor Drauzio adora dar aulas. Não à toa foi professor por duas décadas: “Tenho um compromisso muito sério dentro de mim, que é o de passar para os outros o que aprendi, de ensinar aos que não puderam estudar”. Fundador do cursinho Objetivo, ele deixou de dar aulas porque não estava mais conseguindo conciliar as duas atividades. “A medicina é muito ciumenta”, brincou.>
Quem o acompanha sabe que, na verdade, doutor Drauzio nunca deixou de ensinar. Só migrou da sala de aula para os meios eletrônicos. Foi um desbravador da medicina na televisão e na internet - só no Youtube tem quase 2,5 milhões de seguidores inscritos. Os temas são os mais variados e, às vezes, o leva aos trending topics. Foi o caso da série Drauzio Dichava, em que discorria sobre a maconha e fez a cabeça de quase cinco milhões de brasileiros. O mais recente sucesso foi a live com o rapper Mano Brown, do Racionais MCs, há três semanas, com quase 800 mil visualizações.>
Máscara Sendo médico e com pendor natural pelo que é novo, Varella não deixa de opinar sobre nada. “Vejo essas pessoas na rua sem máscara e tenho pena dos seus familiares, porque elas não contaminam somente a si”, disse sobre a falta de conscientização de parte da população com relação à transmissão do novo coronavírus. “Vamos usar a máscara como parte da indumentária rotineira ainda por muito tempo. O Brasil conseguiu estabilizar o número de mortes, mas perder mais de mil pessoas por dia é inaceitável”, completou.>
Foi com essa mesma clareza que doutor Drauzio contextualizou os leitores do CORREIO sobre os diferentes graus de epidemia vistos no vasto território nacional: “A epidemia vivida em Salvador não é mesma que vivemos em São Paulo. Veja o caso de Manaus, que teve um momento de horror e hoje está em situação controlada. Acho que a partir de outubro teremos uma melhora e até o fim do ano teremos vacina para os pacientes de risco, mas, enquanto houver gente infectada, vamos correr risco. Tudo vai depender do compromisso da sociedade”.>
O alerta vai mais a fundo quando ele fala sobre o SUS - e aí, se dirige tanto aos colegas médicos quanto aos pacientes: “Precisamos fazer uma medicina mais barata e acabar com essa festa de pedir exames desnecessários e ir ao pronto-socorro para tudo. Temos que mudar essa cultura, também no SUS”. >
Médico de hospitais públicos, Drauzio Varella viu de perto a situação das populações mais carentes. Primeiro com os primeiros infectados pelo vírus da Aids, no final da década de 80. Foi quando seu interesse se deslocou para a população carcerária. Não que o olhar estivesse longe: doutor Drauzio revelou que adora filmes de cadeia. “Vejo todos, até os mais ruinzinhos”, disse.>
Carandiru Convidado para fazer um vídeo sobre os brasileiros infectados com Aids, ele contou que foi natural que os procurasse na penitenciária. No caso, no Carandiru, presídio paulista considerado o maior da América Latina. Não só gravou o tal vídeo, como também conseguiu que os presos fossem testados e tratados dentro da prisão: “Quando eu vi, estava ajudando na enfermaria da prisão. Nunca mais saí desse ambiente”. >
O ano era 1989 e começava ali uma história que se desdobrou em muitas páginas. No Carandiru, o médico começou um trabalho voluntário, no mesmo momento da vida em que se descobriu um escritor humanista, observador atento das histórias dos mais desvalidos. Nascia Estação Carandiru, o primeiro dos 15 livros que Drauzio Varella escreveu de lá para cá. Ainda é o seu maior sucesso, transformado em filme em 2003 por Héctor Babenco (1946-2016). Outro livro de Varella que migrou para o audiovisual é Carcereiros.>
“Não esperava muita coisa com Carandiru, tomei um susto quando vi que a Folha (de S.Paulo) tinha dado uma capa para ele. Mas descobri que escrever é uma coisa maravilhosa. Felicidade continuada a gente só tem quando criança, na vida adulta não existe. Mas, na hora que você percebe que o que escreveu ficou bom é uma felicidade profunda”, explicou.>
Ateu A essa altura da live, o publicitário Joca Guanaes já estava convencido de que Drauzio Varella é um humanista mesmo. Só surpreendeu os participantes ao revelar que o médico se considera ateu. “Como consegue, se para muitos o pensamento humanista está ligado a uma forma de espiritualidade?”, perguntou.>
O médico, ao contrário, não vê nenhuma estranheza: “Sou ateu porque não conseguir ser outra coisa, a verdade religiosa é estranha para mim. Até gostaria se tivesse uma fé muito forte, vejo que algumas pessoas se beneficiam disso. O curioso é que as pessoas religiosas acham que as virtudes humanas são exclusivas da religião. Por isso que os ateus são mal-tratados. As pessoas acham que se você é ateu, você é meio imoral. E não assim, as virtudes humanas são inerentes à nossa espécie”.>
Do senhor, doutor, ninguém vai duvidar.>