Nível do São Francisco sobe e faz famílias ribeirinhas deixarem suas casas

Vazão da bacia já é a maior desde 2009

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  • Carolina Cerqueira

Publicado em 18 de janeiro de 2022 às 05:15

- Atualizado há 10 meses

. Crédito: Divulgação/CBHSF

Por conta das fortes chuvas que caem desde dezembro entre a Bahia e Minas Gerais, o nível da Bacia do São Francisco está cerca de 8 metros e 24 centímetros acima do normal e preocupa autoridades e populações ribeirinhas. A vazão da bacia é a maior desde 2009. As usinas de Sobradinho e Xingó chegarão a 4.000 m³/s até o próximo dia 24, quando a situação será reavaliada. Em municípios baianos como Juazeiro e Bom Jesus da Lapa, moradores já estão sendo retirados de suas casas.

No sábado (15), houve a primeira tentativa da prefeitura de retirada das famílias no bairro de Angari, em Juazeiro, no norte do estado. A comunidade é vizinha à Barragem de Sobradinho, que já ultrapassou os 60% de sua capacidade, mas os moradores resistiram e não deixaram os imóveis. Nessa segunda (17), mais uma tentativa. Das 25 famílias em risco, apenas oito aceitaram a mudança. Dois caminhões foram disponibilizados para carregar os móveis e ajudar no deslocamento dos moradores, que ficarão abrigados na Escola Municipal de Tempo Integral Paulo VI.

“A prefeita Suzana Ramos, logo que soube do aumento da vazão da Barragem de Sobradinho, reuniu todo o seu secretariado e formou uma força-tarefa para dar suporte e assistência às famílias ribeirinhas de Juazeiro. A prefeitura já efetuou compras emergenciais de colchões, cobertores, travesseiros, álcool em gel, água mineral e alimentos, tudo que essas pessoas precisarem estará à disposição delas”, ressaltou o titular da Secretaria de Desenvolvimento Social, Mulher e Diversidade (Sedes), Teobaldo Pedro. Oito famílias já deixaram suas casas em Juazeiro (Foto: Divulgação/Prefeitura de Juazeiro) Com receio do avanço do rio já próximo de sua casa, a cabeleireira Elaine da Silva Brito foi a primeira moradora a decidir deixar o Angari. Ela, no entanto, preferiu se abrigar na casa de familiares. “Eu não vou ficar na escola porque resolvi ir para casa de parentes, mas nem todo mundo tem esse privilégio. E esse auxílio dos caminhões, por exemplo, está sendo fundamental para mim e outros moradores porque nem todo mundo tem condições financeiras de pagar uma mudança”, disse Elaine. 

A cidade de Bom Jesus da Lapa também está sendo bastante atingida. Restaurantes que ficam na área ribeirinha foram inundados e a população foi orientada a deixar os imóveis. Na sexta (14), funcionários da Secretaria de Assistência Social foram até as ilhas que estão isoladas pela cheia do rio São Francisco no município para resgatar os moradores ribeirinhos em situação de vulnerabilidade e levá-los à sede do município no qual já há uma estrutura montada para recebê-los. Dentre as comunidades atingidas estão Bebedouro, Cabeça do Boi, Campo do Umbuzeiro, Ilha Banco do Jogo, Ilha da Canabrava, Ilha da Mariquinha e Ilha do Fogo.   Famílias ribeirinhas de outras cidades do país já foram atingidas pela cheia do Velho Chico e estão sendo retiradas. Parte delas está na região norte do estado de Minas Gerais. No estado de Alagoas, a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil emitiu alerta para sete municípios, sobre o aumento da vazão, porque o nível também tem subido de forma significativa.  O alerta e o risco Acompanhando a situação da bacia, o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) emitiu, na última terça-feira (11), nota pública alertando a população ribeirinha sobre a possibilidade de cheias no decorrer dos próximos dias. A nota, assinada pelo presidente do CBHSF, Maciel Oliveira, orienta a população a não ocupar o leito do rio e indica ações a serem adotadas pelos municípios localizados nas regiões do Submédio e do Baixo São Francisco. 

“Nessas condições, caracterizada a necessidade de operação para controle de cheias, Cemig e Chesf, agentes responsáveis pelas principais hidrelétricas do rio São Francisco, identificam a necessidade de aumentar as vazões defluentes praticadas com o objetivo de preservar os volumes de espera dos reservatórios. Os volumes de espera são projetados para suportar as ondas de cheia e proteger as populações e estruturas abaixo das barragens contra inundações”, informou a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA).  Águas deve avançar ainda mais do que em 2009 (Foto: Divulgação/CBHSF) O presidente do CBHSF alerta que a situação é ainda mais delicada para a população ribeirinha do que a de 2009, última vez em que ocorreu uma cheia desse nível. “Em 2009, as condições do rio eram totalmente diferentes, não existiam tantos bancos de areia e ilhas como hoje, por exemplo. Então a previsão é de uma situação pior porque as águas vão se espalhar muito mais, já que não tem tanta profundidade, ou seja, o rio está raso”. Mas ele acrescenta que a cheia também traz benefícios. “É preciso dizer que a situação de cheia é extremamente positiva para o rio em si. Isso porque os bancos de areia vão ser arrastados, vai ter uma limpeza geral no rio. Vai ser bom, principalmente, para a reprodução de peixes, beneficiando pescadores”.

O Comitê informou que, em 2018, realizou audiências públicas para alertar a população ribeirinha e o poder público sobre as suas responsabilidades e os riscos da ocupação irregular do solo às margens do São Francisco, fato que pode acarretar danos em situação como a atual de elevação do nível das águas.

Por que o nível do rio está elevado?

Segundo a ANA, foi constatado volume de chuva acima da média esperada para dezembro de 2021 no Oeste baiano e em Minas Gerais, formando condições de umidade do solo e aumento do escoamento e vazão da bacia. Esse nível alto de vazão não era observado desde 2009. 

De acordo com o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), o fato se deve à combinação de diferentes fatores como a ocorrência do La Niña, o aumento da temperatura dos oceanos - fenômeno que contribuiu para o aumento das chuvas no Nordeste no final de dezembro e início de janeiro, além da presença da Zona de Convergência do Atlântico Sul que teve, também, intensidade acima da média. 

Com as chuvas, os reservatórios da bacia do São Francisco estão recebendo grandes volumes de água. Para manter o nível de segurança e evitar o rompimento de barragens ou a necessidade de liberar água de forma urgente e desorganizada, as medidas estão sendo tomadas com antecedência. Na usina hidrelétrica de Três Marias, por exemplo, a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) iniciou na última sexta (14) a abertura do vertedouro com incremento ao longo dos dias. As usinas de Sobradinho e Xingó já aumentaram as vazões de defluência (conforme escala abaixo) e chegarão a 4.000 m³/s, até o dia 24 de janeiro, quando a situação será reavaliada.

“Na Bahia, a chuva melhorou, mas em Minas ainda é intensa. Essa água que caiu até agora vai levar cerca de 15 dias para chegar em Sobradinho, então ainda precisamos manter o alerta, mesmo que a previsão para as próximas semanas em Minas seja de diminuição das chuvas. Inicialmente, o alerta vale até o final do mês. Quando chegarmos em fevereiro, vamos aos poucos diminuindo a vazão”, explica o presidente do Comitê da Bacia do São Francisco, Maciel Oliveira. 

Escala de vazão:

12/01 Sobradinho: 1.300 m ³/s Xingó: 1.000 m ³/s

14/01 Sobradinho: 1.800 m ³/s Xingó: 1.500 m ³/s

16/01 Sobradinho: 2.300 m ³/s Xingó: 2.000 m ³/s

18/01 Sobradinho: 2.800 m ³/s Xingó: 2.500 m ³/s

20/01 Sobradinho: 3.300 m ³/s Xingó: 3.000 m ³/s

22/01 Sobradinho: 3.800 m ³/s Xingó: 3.500 m ³/s

24/01 Sobradinho: 4.000 m ³/s Xingó: 4.000 m ³/s

Municípios do Submédio e Baixo São Francisco que podem ser afetados:

Umburanas Várzea Nova Uauá Sobradinho Rodelas Ourolândia Mirangaba Miguel Calmon Macururé Juazeiro Jaguarari Jacobina Curaçá Chorrochó Campo Formoso Santa Brígida Glória Jeremoabo Paulo Afonso Pedro Alexandre