No prejuízo: manchas de óleo fazem preço do peixe cair 25% em Salvador

Peixe mais vendido pelos pescadores, o Vermelho Cioba está custando R$ 25 o quilo; antes, era vendido por R$ 35

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  • Eduardo Dias

Publicado em 5 de novembro de 2019 às 05:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Betto Jr/CORREIO

A presença do óleo de petróleo cru nas praias de Salvador fez com que o preço dos pescados reduzisse cerca de 25% e o consumo dos clientes caísse. O prejuízo já é possível ser notado em colônias de pescadores e peixarias. O Vermelho Cioba, peixe mais procurado pelos consumidores, custava R$ 35 o quilo e está sendo vendido pelos pescadores por R$ 25.

A baixa procura se dá por medo de contaminação com o óleo. Na manhã desta segunda-feira (4), o CORREIO percorreu alguns pontos da cidade para comparar os preços de antes e depois do desastre ambiental.

A dificuldade dos pescadores em conseguir alavancar suas vendas foi narrada por Joel Antônio Gouveia, 79, que tira do mar seu sustento há mais de 35 anos. Segundo ele, os colegas estão com dificuldades de vender mesmo com a redução do valor.“Essa situação é um desastre imensurável, uma dificuldade enorme. Os clientes estão receosos com tudo isso, ninguém consegue vender nada. O preço baixou muito, tanto para vender para as peixarias como as encomendas de restaurantes e hotéis. Tem pescadores que estão com estoques com mais de uma semana sem conseguir vender nada e alguns deles estão com o freezer cheio há quase 20 dias, antes nem durava quatro, vendia tudo rápido”, explicou o pescador, que garantiu já estar aposentado, mas continua pescando para complementar a renda da família.Queda nas vendas Consumidor direto dos pescados de Seu Joel, o peixeiro Jair Assunção, 56, possui um box próximo à colônia de pescadores do Rio Vermelho há 35 anos. Ele revelou que antes de toda essa situação começar, vender entre 100 e 150 quilos de peixes por semana era algo comum. Hoje em dia, para conseguir vender os mesmos 100 quilos, Jair está tendo que reduzir o valor do quilo de quase toda a mercadoria.     Jair teve que reduzir preço do peixe (Foto: Betto Jr/CORREIO) “Depois desse problema com o óleo as pessoas não querem mais comprar nossos peixes. Os restaurantes não estão mais fazendo pedidos de entrega. Estamos no prejuízo. Nós compramos diretamente do pescador, que deseja receber à vista, e tínhamos que vender a prazo para os estabelecimentos. Estou com estoque desde sábado, não consegui vender nada no domingo, que era comum vender até 40 quilos, e não vendi nada até agora. No momento estou apenas comprando gelo para conservar. É um prejuízo imenso. Estou pedindo a Deus para que essa situação se resolva, senão vamos passar mais dificuldades”, lamentou o comerciante.

O segundo peixe mais procurado na colônia de pescadores do Rio Vermelho era o atum. No entanto, os pescadores estão relutando em pegá-lo e Joel em comprar, pois sabem que não conseguirão vendê-los.“Não está adiantando pegar nem o atum, que era muito vendido aqui. Não temos para quem vender. A situação está difícil, eu dependo da minha peixaria para sobreviver e ajudar meus seis filhos. Do jeito que está, os peixes que eu cobrava R$ 35, não aguento ver R$ 20 que quero vender logo”, completou Jair, que revelou que trabalha de domingo a domingo em sua peixaria. Joel tem tido prejuízo (Foto: Betto Jr/CORREIO) Dificuldade Salvador passou por um período de trégua de 13 dias sem o aparecimento das manchas de óleo nas praias, desde 18 de outubro. Os dias foram como alívio para o pescador Edson dos Santos Nascimento, 57, filiado à colônia de pesca de Itapuã.

Ele contou que por pouco não deixou de fazer uma venda de lagostas que tinha pescado em uma de suas idas ao mar. O pescador pretendia fazer a entrega do pescado a um de seus compradores, mas o resultado não o agradou muito. Edson deixou de ganhar um bom dinheiro com venda de lagostas (Foto: Betto Jr/CORREIO) “Um dia desses um cliente me ligou pedindo umas lagostas, estava tudo certo, daí ele viu na TV que tinha aparecido o óleo novamente e desistiu da compra. Por pouco eu não consegui vender minhas lagostas. Não está valendo a pena ir no mar e voltar para ficar com a mercadoria toda em casa estocada. As pessoas não estão querendo de jeito nenhum, falam que têm medo do óleo”, lembrou.

Enquanto a Secretaria da Agricultura, Pecuária, Irrigação, Pesca e Aquicultura (Seagri) está realizando um levantamento sobre a saúde dos peixes - que só deve ficar pronto em 15 dias -, o também pescador José Iotávio Souza passa pela mesma situação do colega de colônia.   José Iotávio tem pescado menos peixes (Foto: Betto Jr/CORREIO) Ele revelou que já não vai no mar há cerca de um mês. Acostumado a pescar em torno de 50 a 100 quilos de atum em cada ida, José revelou que, devido à situação, não está conseguindo vender e está tendo que consumir o pescado para não perder.“O pessoal não está querendo nem o atum, que é da época. Acham que está com óleo, que tem contaminação. Não tem quem compre. Tem mais de um mês que eu e outros pescadores não vamos no mar. Cadê o comprador? Não tem. Estamos apenas tendo gastos com combustível, iscas e não temos retorno. Estamos tendo que comer o que estamos pescando, uma situação difícil, prestes a não ter o que comer”, contou.  Confira quais são os peixes mais procurados pelos consumidores e a alteração dos seus valores de venda, segundo os pescadores:  

Vermelho Cioba  – Custava R$ 35 o kg, agora está R$ 25.

Vermelho de fundo - Custava R$ 34 o kg, agora está R$ 25.

Vermelho Rabo Aberto/Guaiúba - Custava R$ 14 o kg, agora está R$ 9.

Olho de boi - Custava R$ 35 o kg, agora está R$ 25.

Cavala - Custava R$ 35 o kg, agora está R$ 25.

Arraia - Custava R$ 15 o kg, agora está R$ 12.

Badejo - Custava R$ 35 o kg, agora está R$ 30.

Sororoca - Custava R$ 35 o kg, agora está R$ 25.

Atum - Custava R$ 20 o kg, agora está R$ 13.

Mercado do Peixe No Mercado do Peixe, os itens permanecem com o mesmo valor de venda, independentemente do problema com o derramamento de óleo nas praias do Nordeste. De acordo com o administrador Rubem Bispo, 95% dos pescados vendidos nos boxes são de origem do Sul e Sudeste do país. Por este motivo, os preços não foram alterados.

“Os clientes devem pesquisar mais, procurar saber de onde vêm os pescados que estão consumindo. Aqui os comerciantes só vendem mercadorias que vêm de fora da Bahia, os consumidores precisam saber disso. Não temos riscos de ter peixes e crustáceos contaminados por esse óleo”, afirmou.

Mas segundo o comerciante Gilvan Borges, 31, dono de um dos boxes no Mercado do Peixe há 12 anos, o problema já chegou ao local, que começou a sentir o impacto nas vendas por conta do derramamento de óleo.

“Mesmo a gente explicando que a mercadoria daqui vem de fora, alguns clientes ainda nos perguntam se tem alguma contaminação com óleo. Isso atrapalha um pouco as vendas. Antes eu comprava R$ 10 mil de peixe por semana, agora estou me precavendo e comprando só 4 ou R$ 5 mil”, contou o comerciante.

Além de reduzir a quantidade de mercadoria comprada, outra preocupação de Gilvan é referente à manutenção de seus funcionários. Ele mantém três nos boxes, mas afirmou que precisou reduzir a carga horária deles, que agora se revezam durante a semana.

“Precisei reduzir. Eles vinham a semana toda. Pedi para que viessem uns dois dias na semana apenas. Estou precisando diminuir os gastos até que essa situação melhore”, explicou.

No box de Gilvan, era possível encontrar peixes e crustáceos com os seguintes preços:

Corvina - R$ 12 o quilo.

Pitiinga – R$ 8 o quilo.

Camarão (por tamanho) - R$ 27, R$ 35 e R$ 50 o quilo.

Mexilhão - R$ 30 o quilo.

Sururu - R$ 15 o quilo.

Pescada Amarela - R$ 27 o quilo.

*Com supervisão do chefe de reportagem Jorge Gauthier.