Óleo no mar: Ufba aponta redução de 47% no número de espécies na Bahia

Diminuição aconteceu em quatro áreas do Litoral Norte monitoras pela universidade desde 1995

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  • Hilza Cordeiro

Publicado em 25 de novembro de 2019 às 11:56

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Reprodução/UFBA)

A chegada do petróleo no litoral baiano continua apresentando reflexos. O Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba) apresentou em coletiva de imprensa, nesta segunda-feira (25), um levantamento que revelou a diminuição de quase 47% no número de espécies invertebradas nos recifes de corais das regiões de Guarajuba, Itacimirim, Praia do Forte e Praia de Abaí, todas na Linha Verde, monitoradas pela instituição desde 1995.

As espécies mais afetadas foram mesmo os corais, que branquearam 10 vezes mais do que o normal. A taxa anual de branqueamento deles nestas regiões é de 5% a 6% e chegou a quase 52%. O branqueamento é preocupante porque é um sinal de que o coral está doente ou perto de morrer. Os sete pesquisadores envolvidos avaliaram uma área total de 140 m², sendo 35m² em cada local, e fizeram uma análise comparativa entre os dados de abril deste ano, antes do óleo tomar conta do mar, e de outubro, logo após o desastre ambiental."Quando um coral está saudável, ele fica rosado ou cor de café. Qualquer distúrbio diferente, o coral pode perder a cor ou ficar totalmente branco. O branqueamento nesses locais acontece por aumento abrupto da temperatura do mar ou pela incidência de radiação solar sobre os corais. Não houve registro de anomalia da temperatura do mar e nem da irradiação solar. Para a gente, sobrou o agente químico: o óleo. A nossa desconfiança é que o óleo causou a morte dos corais", explicou o professor Francisco Kelmo, diretor do Instituto de Biologia (Ibio).O pesquisador destaca que nos recifes de corais vivem espécies invertebradas como pinaúna (ouriço-do-mar), anêmonas, polvos, lagostas, pequenos peixes, crustáceos e outros. Considerados os ecossistemas mais diversos em todo o mundo, os recifes são também um dos ambientes marinhos mais frágeis. De acordo com os cientistas, uma das espécies peculiares mais afetadas pelo óleo nas quatro áreas do levantamento foi o Siderastrea stellata, um coral que só ocorre no litoral brasileiro. “É uma das espécies mais resistentes e mesmo assim apresentou grande branqueamento”, observou Kelmo. Corais apresentaram branqueamento 10 vezes maior do que o normal (Foto: Reprodução/UFBA) Os efeitos do material contaminante nos recifes ainda são incalculáveis. Quando ocorre perda de exemplares de espécies num determinado local, isso provoca um desequilíbrio na cadeia alimentar do ambiente. O sumiço de animais pequenos, por exemplo, pode render prejuízos para os maiores predadores que, por sua vez, são produtos da alimentação humana, como os peixes, lagostas e polvos. “No momento que faltar alimento, ou os animais vão morrer ou vão migrar dali”, alerta ele.

Também neste estudo comparativo, os biólogos notaram ainda uma redução na quantidade total de animais vivos encontrados nas quatro localidades. Antes, havia um número mínimo e máximo entre 409 a 465 animais e depois caiu para 117 a 167 bichos, uma perda média de quase 66% no quantitativo. Essa perda, claro, representa a morte de animais durante esse período.

Antes do óleo, a diversidade de espécies tinha uma média de 88 tipos de animais nas áreas pesquisadas e caiu para 47 após o desastre. O diretor do Ibio acredita que a tendência é que os números sejam ainda piores nos próximos meses. O diretor do instituto acredita que serão necessários entre 10 e 20 anos para que o patrimônio natural afetado possa se recuperar. No entanto, essa estimativa só se mantém se nenhuma nova ocorrência de óleo for registrada nos locais. 

“Infelizmente, esse fantasma do óleo vai nos assombrar por bastante tempo porque não sabemos quanto petróleo ainda está no mar”, observou. Quanto aos corais, o ideal é que o ambiente se recupere sozinho, mas Kelmo recomenda que sejam criadas campanhas educativas para fazer com que as pessoas evitem pisar nos recifes.

Novos levantamentos

O estudo é um resultado do trabalho do Grupo de Estudos em Ecologia Marinha e Costeira (Geemco) e as atividades de pesquisa não encerraram. Em dezembro, os pesquisadores vão mergulhar nas mesmas áreas para investigar se há óleo incrustado nos recifes submersos, que possuem mais de 2.200 espécies catalogadas só no Litoral Norte da Bahia. 

Kelmo acredita que o petróleo ficou restrito aos recifes costeiros, mas defende que só um estudo pode eliminar as dúvidas. Novas amostras serão coletadas ainda em fevereiro e abril para que os dados sejam mais uma vez comparados.

O Instituto de Biologia está aceitando investimentos para financiar essas novas incursões nas áreas afetadas, que inclui ainda uma análise dos manguezais de Mangue Seco, na divisa entre a Bahia e Sergipe.“Esse será um estudo pioneiro quanto a derramamento de petróleo e servirá de base para muitos outros que virão. Nós precisamos continuar as pesquisas e as dificuldades vêm sendo grandes por causa do contingenciamento que as universidades têm sofrido, então estamos aceitando ajuda de todo tipo”, solicitou.A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior  (Capes) lançou na última quinta-feira (22) um edital que vai destinar R$ 1,36 milhão para seleção de projetos que vão fazer pesquisas sobre o óleo encontrado nas praias brasileiras. O objetivo “é contribuir para a contenção, o processamento do resíduo encontrado e a redução de danos ao meio ambiente”.

Por ser uma ação emergencial, as propostas de estudo devem ser encaminhadas desta segunda-feira (25), até às 17h horas (horário de Brasília), até 4 de dezembro pela plataforma online da Capes. O resultado final será divulgado a partir de 18 de dezembro. 

Ógãos ambientais Município que abriga a Praia do Forte, Mata de São João não possui mais manchas de óleo - apenas pequenos fragmentos chegam por vezes no local. A assessoria da prefeitura municipal de Mata de São João informou que o resultado do estudo da Ufba é muito novo e que o secretário de Meio Ambiente ainda vai decidir o que pode ser feito para mitigar os impactos do óleo na região para evitar mais danos ao ecossistema.   A prefeitura ainda afirma que deve ser criado um plano de ação com base no que foi apontado pelos pesquisadores da Ufba.

Os dados revelados pela pesquisa chamaram a atenção do Greenpeace. O porta-voz da ONG, Thiago Almeida, afirmou que os recifes de corais são muito importantes para a vida marinha,“Apesar dos ambientes recifais comporem apenas 1% dos oceanos, eles são responsáveis por 35% das espécies de peixes”, afirmou o porta-voz da ONG.Por esse motivo, Almeida apontou que a redução do número destes animais invertebrados que habitam os corais impacta o estoque de animais no mar. “Estes animais invertebrados fazem parte da cadeia alimentar”, disse.

O porta-voz ressalta ainda que os pescadores, marisqueiras e extrativistas que dependem dos animais marinhos para se sustentar devem ser os mais impactados. Almeida ainda afirmou que o óleo que não se diluiu e está invisível pode contaminar os seres vivos.

Procurado, o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) afirmou que a reportagem deveria buscar a Marinha e/ou Ibama para comentar o tema por se tratar de uma área da União. A Bahia Pesca informou que não iria se pronunciar.

*Com colaboração de Marina Hortélio