'Os tiros pareciam uma pipoqueira’, diz sobrevivente de ação da PM onde espanhol morreu

Vendedora disse que PMs buscavam ladrão de relógio; reconstituição ainda não foi concluída

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  • Bruno Wendel

Publicado em 18 de maio de 2019 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Betto Jr./ CORREIO

Sobrevivente aos inúmeros disparos de policiais militares contra um Palio branco, dos quais um matou o empresário espanhol Márcio Perez Santana, 41 anos, a vendedora Renata Tedgue Alves Correia, 31, disse, em inquérito policial, que os PMs procuravam um homem que havia roubado um relógio e que estaria em um carro branco.

Ela acredita “que os policiais estavam em busca de um carro branco, e com qualquer um que estivesse em um carro branco aconteceria a mesma coisa”, diz trecho do depoimento de Renata, ao qual o CORREIO teve acesso. Desde o dia do crime, ela nunca deu entrevista. Márcio foi atingido com um tiro na nuca, no dia 19 de setembro de 2018.

A reconstituição do crime começou na noite de quinta-feira (16), foi interrompida na manhã de sexta (17) e será retomada em outro dia.

Maurício Correia dos Santos e Saulo Reis Queiroz, policiais militares acusados de homicídio qualificado contra o empresário, e Renata, que estava no banco do carona de Márcio no dia do crime, auxiliaram na reconstituição dos fatos.

O pedido da reprodução simulada foi feito pela defesa dos policiais e acatado pela Justiça. Os dois policiais militares estão presos e são réus em uma ação penal.

No dia do crime, Márcio dirigia seu carro e voltava para casa quando começou a ser seguido por policiais. Ele tentou escapar, mas vários tiros foram disparados e ele foi atingido na nuca. O espanhol não resistiu aos ferimentos e morreu. Renata não foi baleada. O empresário espanhol Márcio Perez Santana, 41 anos, foi morto em setembro (Foto: Reprodução) No dia seguinte ao crime, ela prestou depoimento na 1ª DH Atlântico, divisão do Departamento de Homicídio e Proteção à Pessoa (DHPP). Ela foi ouvida pela delegada Marta Karine Menezes de Aguiar.

Renata disse que conheceu Márcio nas redes sociais e que eles namoraram por três meses. O casal terminou pela diferença de idade e pelo fato de ele ter dois filhos, mas os dois ainda eram amigos.

Naquela noite, Márcio buscou Renata na casa dela. Eles seguiram para um food truck no Imbuí e, depois, voltaram para a casa de Márcio pela Avenida Paralela. Durante o percurso, a vendedora disse que não percebeu se eles estavam sendo seguidos.

Renata contou à polícia ainda que, quando o Palio chegou à casa de Márcio, na Rua Gaspar da Silva Cunha, em Armação, dois homens chegaram atirando – ela ainda não sabia que eram PMs e que estavam numa viatura.

“Ao se aproximar do portão da residência, Márcio deu passagem para um veículo, que seguia logo atrás. O veículo estava sem sinalização sonora, nem iluminação, com farol baixo. A rua estava escura. O carro parou logo atrás, abriram as portas e os indivíduos saíram do veículo, que estava com as luzes apagadas, e já iniciaram disparos de arma de fogo, gritando: ‘Sai, sai, sai’. Márcio chegou a dizer: ‘Eta porra’ e acelerou o veículo. Os indivíduos adentraram no veículo e iniciaram uma perseguição, sem ligar as luzes do carro e nem se identificaram como policiais. Márcio tentava correr para se proteger, mas os tiros pareciam uma ‘pipoqueira’”, diz outro trecho do inquérito policial.

Renata contou que, para se proteger dos disparos, se abaixou no banco com as mãos na cabeça. Márcio dirigiu pouco tempo e, ao chegar na rua principal (Avenida Simon Bolívar), próximo a um posto de gasolina, ainda tentou olhar para trás para ver o que estava acontecendo até perder o controle do veículo e bater no canteiro central.

Ainda segundo a vendedora, os PMs continuaram atirando, inclusive, com o carro já parado. Eles mandaram que ela saísse do carro. “A depoente saiu pela janela e se jogou no chão, dizendo a todo o tempo: ‘Nós somos pessoas de bem, não fizemos nada e estávamos no Imbuí comprando um temaki’”, aponta o relato.

Renata disse que só percebeu que os autores dos disparam eram policiais quando pôs a cabeça para fora do veículo. Nesse momento, chegaram dois homens numa motocicleta, e um dos policiais perguntava para os ocupantes da moto: “É esse aí, é esse aí?... Mas não era um Palio?”.

Renata explicou que Márcio morava perto, e os PMs quiseram saber por que eles não pararam. Ela disse: “Vocês atiraram”. Segundo o que contou à polícia, os ocupantes da motocicleta davam a entender que um relógio teria sido roubado e sumiram em seguida. Márcio foi socorrido para a Upa do Marback, mas não resistiu.

Ela ainda negou que tivesse envolvimento amoroso com algum policial.