Pablo Lazo: ‘Humanizar, no contexto urbano, tem a ver com inovação’

Palestrante do Fórum Agenda Bahia fala sobre a resiliência urbana

Publicado em 31 de julho de 2018 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Rodrigo Capote/Trema

Salvador é uma das três cidades brasileiras a integrar o programa 100 Resilient Cities, iniciado em 2014, pela Fundação Rockefeller. Na capital, o projeto da fundação é desenvolvido com a participação do diretor da consultoria internacional Arup e professor de Desenvolvimento Sustentável e Resiliência Urbana, Pablo Lazo.

Responsável por projetos de desenho urbano em diversos países, Lazo também é o conferencista master do seminário Sustentabilidade do Agora, evento do Fórum Agenda Bahia 2018, que vai acontecer no dia 8 de agosto, das 8h às 17h30, na sede da Fieb – Federação das Indústrias da Bahia (Stiep). 

O seminário é o primeiro evento desta nona edição do fórum, que tem ainda outras atividades programadas até novembro, como o Desafio de Inovação Acelere[se]e. Pablo Lazo fará a palestra ‘Salvador Humana’, onde vai falar sobre a humanização do espaço urbano, que segundo ele, tem relação com a inovação e com a forma como a tecnologia pode ser usada para tornar as cidades mais resilientes. 

“Como Salvador está começando a trabalhar com essa meta [a resiliência urbana], alguns exemplos da Espanha e do México podem ajudar no entendimento desse grande desafio da cidade como parte da rede 100RC”, afirma o especialista.

Nesta entrevista ao CORREIO, Lazo explica ainda o que é resiliência urbana e como essa forma holística de planejamento pode beneficiar as cidades:

Quem é: Pablo Lazo é diretor da consultoria internacional Arup e professor de Desenvolvimento Sustentável e Resiliência Urbana em universidades na Europa e na América Latina. Responsável por projetos de desenho urbano em diversos países, trabalhou no planejamento da Eco Cidade chinesa de Wanzhuang, no Madrid Cidade do Conhecimento e, atualmente, é diretor do hub digital de Guadalajara, no México, e de hubs turísticos no Panamá. Coordena ainda os projetos de resiliência para as cidades de Santiago do Chile, Buenos Aires e Salvador, pela Fundação Rockefeller.

Confira a entrevista completa:

O que é resiliência urbana? Como surgiu o conceito de cidade resiliente?

A resiliência urbana é a capacidade de um sistema - a cidade, nesse caso - para responder, adaptar e continuar seu desenvolvimento, apesar dos impactos agudos e das tensões que possam surgir. Assim, após um evento catastrófico, a cidade pode sair mais forte e melhor preparada para enfrentar impactos ou tensões no futuro.

A cidade resiliente é uma resposta ao crescimento urbano desordenado e aos desequilíbrios sociais, ambientais e econômicos que o inchaço dos grandes centros urbanos provoca?

Uma resposta simples seria que sim, a cidade resiliente está tentando ser uma resposta a esses desafios urbanos das grandes cidades de forma geral. Mas, além disso, a cidade resiliente procura adaptar seus sistemas urbanos - como ruas, transporte público, fornecimento de energia, coleta de lixo ou segurança pública - para fazê-los mais fortes e flexíveis, dentre outras características, para responder aos novos desafios específicos que a cidade vai enfrentar no futuro, que serão diferentes dos desafios enfrentados hoje. Salvador é uma da três cidades brasileirsa a integrar o 100RC Como as cidades podem se tornar resilientes?

As cidades não se tornam resilientes da noite para o dia. É um processo demorado que implica mudanças em três grandes âmbitos: institucional, transformando a gestão da cidade de forma mais interdisciplinar; mudar a cultura cidadã em temas concretos, informando os moradores sobre o que é a resiliência e quais benefícios ela traz - e como eles podem ser participantes e colaboradores na definição de ideias, iniciativas e projetos resilientes que ajudem a resolver suas necessidades básicas; e procurando novas formas de financiamento de projetos urbanos - principalmente de infraestrutura - entre os setores público e privado.

Em que tornar-se resiliente favorece ou ajuda as cidades? Elas melhoram em que aspectos para seus moradores e visitantes? 

Para começar, a cidade está melhor preparada para lidar com eventos naturais e sociais, do ponto de vista das infraestruturas e dos moradores. Isto implica uma melhor qualidade de vida para todos os seus moradores e visitantes.

Essa transformação das cidades com base na resiliência é uma tarefa apenas do poder público? Como outras esferas - cidadãos, empresas, academia (universidades) - podem contribuir e qual o papel de cada um desses atores nesse processo?

Essa transformação é um trabalho de equipe. Pode ser liderada pelo poder público, por uma ONG ou por algum elemento do setor privado, mas ela precisa de uma validação e consenso entre os diferentes setores. Este processo de consenso é uma peça muito importante para a transformação. A peça chave é um alinhamento dos interesses para realizar todo o processo e conseguir os objetivos de resiliência.

Tornar-se resiliente também impacta na economia das cidades? De que forma?

A resiliência aborda temas econômicos tais como a criação de fontes de trabalho local e diversas, identifica novos motores da economia local, avalia a situação socioeconômica de alguns setores da cidade, etc. Por isto, iniciativas surgidas de uma visão mais resiliente necessariamente tem uma contribuição no futuro da economia das cidades. Porém, a resiliência se desenvolve através de uma visão sistêmica, sendo possível que também apareçam impactos negativos em outros setores da economia local. É preciso achar um equilíbrio ideal.

Como e quando começou a iniciativa 100 Resilient Cities e como está esse programa agora? Quais cidades brasileiras já fazem parte do programa?

A Fundação Rockefeller começou esta iniciativa em 2014, com o objetivo de apoiar 100 cidades do mundo para desenvolver uma estratégia de resiliência. Salvador é uma das últimas 33 cidades escolhidas para o programa. Na América Latina são 18 cidades na rede 100RC. No Brasil, além de Salvador, Porto Alegre e Rio de Janeiro também fazem parte da iniciativa.

A Arup apoia as cidades do 100RC para estratégias de resiliência. Em que consiste esse apoio? Existem cidades brasileiras apoiadas pela Arup?

O programa proporciona três tipos de apoio às cidades: apoio econômico, contratando um ‘Diretor de Resiliência’ para a cidade (chief resilience officer) e uma equipe local; um sócio estratégico, como a Arup, uma empresa internacional de engenharia, design e consultoria com muita experiência em projetos urbanos; e uma oferta de serviços na plataforma 100RC, com ferramentas online. Arup é um sócio estratégico do programa globalmente. Na América Latina já trabalhamos com sete cidades, onde pessoalmente tenho liderado equipes multidisciplinares de engenheiros, economistas, arquitetos e urbanistas. Salvador é a primeira cidade no Brasil que é apoiada pela Arup. Mas também já trabalhamos com Porto Alegre em outro programa da Fundação Rockefeller vinculado à resiliência urbana.

O senhor pode dar exemplos de cidades resilientes no mundo e citar quais estratégias elas adotaram?

Hoje em dia já existem muitas cidades resilientes em alguma área ou que tem projetos de escala urbana que ajudam à resiliência da cidade. Copenhague, na Dinamarca, tem uma importante estratégia para lidar com a mudança climática no seu “waterfront” [beira-mar]; Paris tem uma gestão metropolitana dos sistemas de transporte público. Na America Latina, a Cidade do México implementou a criação de uma reserva de água para reabastecer os aquíferos do Vale do México; Santiago de Chile tem iniciativas de “bairro seguro”; e Santa Fé, na Argentina, realizou uma transformação e melhoria dos sistemas de coleta e tratamento dos resíduos sólidos urbanos. Cada cidade tem desafios mais ou menos semelhantes, mas as soluções em cada cidade são diferentes. Porém, todas buscam ser mais resilientes.

O Fórum Agenda Bahia 2018 é uma realização do CORREIO, com patrocínio da Revita e Oi, apoio institucional da Prefeitura de Salvador, Federação das Indústrias da Bahia (Fieb), Fundação Rockefeller e Rede Bahia.