Painel no Santo Antônio homenageia Clarice Lispector

A escritora e jornalista completou centenário de nascimento nesta quinta-feira (10)

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  • Carolina Cerqueira

Publicado em 11 de dezembro de 2020 às 00:31

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Nara Gentil/CORREIO

Você pode até nunca ter lido uma obra dela, mas com certeza já se deparou com uma de suas frases na internet, sejam as verdadeiras ou as atribuídas a ela. Clarice Lispector (1920-1977) chegou aos 100 anos, completados nesta quinta (10), como  uma das escritoras brasileiras mais citadas nas redes sociais.

Em Salvador, a homenagem veio em forma  um painel grafitado na Ladeira do Boqueirão, especialmente dedicado à escritora e jornalista que nasceu na Ucrânia, mas veio para o Brasil ainda muito pequena.

Idealizador do projeto, o fotógrafo e artista plástico Mário Edson diz que a ideia é contribuir com a nova cara do Centro Histórico, misturando o grafite, uma arte moderna e dinâmica, com o histórico boêmio e intelectual do bairro. O painel se associa à exposição Clarices, em cartaz no ME Ateliê de Fotografia, que fica a duas casas do muro que agora virou tela.

“Como nós estamos querendo englobar todas as linguagens artísticas e na galeria já tem diversas expressões, como fotografia, escultura, pintura, bordado e desenho, o grafite era o que estava faltando”, conta Mário. Para a execução da obra de arte, foram convidados o grafiteiro Raphael Ribeiro e o artista plástico Oliver Dórea.

“Escolhi Raphael porque ele trabalha com letras e eu queria usar uma frase de Clarice, então tinha que ser ele. Já o Oliver tem um trabalho com realismo e retrato, e as pessoas precisam conhecer o rosto de Clarice, não só a sua literatura”, acredita.  O grafite foi executado por Raphael Ribeiro e Oliver Dórea (Foto: Mário Edson/divulgação)  Os artistas contam que a ideia central é unir texto e imagem, mas explicam que, mesmo com o planejamento e a construção mental da obra, o resultado será uma surpresa até para eles. “O grafite é uma arte que fala diretamente com o público e que se completa no olhar das pessoas. Então ela nunca vai estar totalmente finalizada, porque cada pessoa vai ter um olhar diferente sobre o mesmo grafite”, analisa Oliver. O retrato está acompanhado da frase "Viver Ultrapassa Qualquer Entendimento". 

Para o leitor e admirador CR Moska, 46, o painel será muito bem-vindo. “Eu considero Clarice como uma das melhores autoras do final do século XX e essa é, com certeza, uma justa homenagem. E, como as artes se conectam de diferentes formas e não há limitação, é totalmente possível ligar literatura e arte de rua”. 

Sobre a junção de uma personalidade intelectual como Clarice Lispector com uma arte de rua como o grafite, Oliver analisa:  “É muito simbólico que um museu esteja querendo colocar o grafite na sua parte externa. A ideia é justamente chamar não somente o público frequentador das galerias, mas também levar essa arte para a grande massa. Isso quebra paradigmas e também a ideia de que existe um público específico que é legitimado para consumir arte”.

O morador do bairro Bruno Bahia, 40, revela que vai passar mais vezes pelo local, somente para contemplar a obra. “Eu acho importante que o painel seja na rua porque as artes estão em constante transformação e, mesmo que as pessoas deixem de ir aos museus, elas não deixam de ver a arte. Vai estar aqui para todo mundo que passar poder ver”.

Centenário

Mesmo de difícil leitura, os textos de Clarice Lispector, uma das autoras brasileiras mais citadas na internet, encantam pela quebra das regras de pontuação, pela linguagem permeada de entrelinhas e pelas lições de vida espelhadas pelos trechos de suas obras. 

Nascida como Chaya, a escritora e jornalista abrasileirou seu nome, assim como toda a sua vivência. Clarice nasceu na Ucrânia e chegou ao Brasil aos dois anos, junto com sua família, fugida da perseguição aos judeus depois da Revolução Russa de 1917. Aqui, passou por Maceió, Recife e, finalmente, Rio de Janeiro, onde faleceu em 1977, aos 55 anos. Clarice dizia não ter nenhuma ligação com a Ucrânia e que sua verdadeira pátria era o Brasil:  "Naquela terra eu literalmente nunca pisei: fui carregada de colo". 

Autora de romances, contos e ensaios, é considerada uma das escritoras brasileiras mais importantes do século XX e a maior escritora judia desde Franz Kafka. Tornou-se uma das figuras mais influentes da Literatura Brasileira e do Modernismo, sendo considerada uma das principais influências da nova geração de escritores brasileiros. Algumas de suas principais obras são: A Hora da Estrela, Laços de Família e Um Sopro de Vida. 

Exposição Clarices

Intitulada Clarices, a mostra reúne, no ME Ateliê da Fotografia, obras de artistas da Bahia, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Sergipe, Ceará, São Paulo, Itália e Chile. Além de comemorar o centenário de vida da escritora, a exposição também marca o segundo ano de atividades do ateliê.

Participam 51 artistas,  sendo 21 fotógrafos; 23 pintores, ceramistas, escultores e bordadeiras; e 7 artistas cênicos. Entre os nomes, a chilena Camila Alemany, a italiana Cristina Cenciarelli e os brasileiros Manuel Chagas, Ieda Dias, Will Recarey e o próprio curador do espaço, o fotógrafo Mário Edson.

A visitação é gratuita e pode ser feita até dia 12 de dezembro, das 14 às 16h, na Ladeira do Boqueirão, número 6.

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro.