Pedro Alexandre: 1,5 mil casas estão sem água desde rompimento de barragem

Infectologista diz que situação pode agravar saúde de moradores

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  • Fernanda Varela

Publicado em 17 de julho de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Arquivo CORREIO

Pedro Alexandre foi atingida por rompimento de barragem (Foto: Raul Marques/Divulgação) O rompimento da barragem do Quati, no município de Pedro Alexandre, deixou um forte contraste na localidade. Enquanto as ruas estão alagadas, as torneiras de cerca de 1.500 casas estão completamente secas desde o dia do incidente, em 12 de julho.

Segundo a Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa), responsável pelo abastecimento de água no local, a distribuição foi interrompida porque "as fortes chuvas no município danificaram, no dia 12, a estrutura que sustentava trecho de adutora que abastecia a sede municipal localizada nas margens de um riacho".

A Embasa informou ainda que um serviço de reparo foi iniciado no dia 13, mas, devido à continuidade das chuvas, não foi possível concluir a implantação de nova estrutura. A previsão de conclusão é para esta terça-feira (16), com regularização do abastecimento no decorrer da semana. Por conta disso, desde o dia seguinte ao rompimento o município de Pedro Alexdandre está sendo abastecido de forma alternativa, por meio de carros-pipa.

De acordo com a empresa, são fornecidos cerca de 100 mil litros de água por dia para os moradores afetados. A água utilizada nos carros-pipa vem da própria adutora, mas é captada em ponto anterior ao trecho do rompimento. Apesar de ter sido uma das cidades mais atingidas com a enxurrada provocada pelo rompimento da barragem, o município de Coronel João Sá não foi afetado com a falta de água. Rompimento de barragem afetou Pedro Alexandre e Coronel João Sá (Foto: Evandro Veiga/CORREIO) Saúde em risco A falta de água é um problema grave para um município que acabou de passar por uma situação como a de Pedro Alexandre. O CORREIO conversou com a infectologista Áurea Angélica Paste, que explica os riscos. "É um grande problema porque quem está em um ambiente como esse está exposto a muitas doenças e a maioria delas pode ser prevenida com uma medida simples, que é lavar as mãos", diz.

Segundo a especialista, quando há rompimento de barragem, a água se mistura com esgotos, mangues e sujeiras."Isso pode deixar as pessoas expostas a muitas doenças, como Hepatite A, infecções por bactéria, salmonela, leptospirose, tétano em caso de corte e contato com terra que já está mais seca, bactéria e.coli, verminoses, parasitas, giárdias, amebas, é muita coisa", lista.Segundo ela, a falta de água também traz outro agravante, que é a impossibilidade de higienizar os alimentos, que podem ter sido contaminados pela água suja e também causam doenças. "O ideal, nesta situação, é não consumir alimentos contaminados, verduras, frutas, nada que tenha sido contaminado por essa água. Outra recomendação é evitar contato com essas áreas e sair de casa com sapatos fechados", completa.

As recomendações e riscos também valem para Coronel João Sá, mesmo havendo abastecimento de água na localidade, já que se trata do município mais atingido pelas enxurradas.

O CORREIO entrou em contato com a Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab) para falar dos riscos à população, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

Danos na cidade O prefeito de Pedro Alexandre, Pedro Gomes Filho, disse que está ciente da falta de água em parte do município e está esperançoso que a situação seja normalizada em breve. "Acho que o problema já vai ser resolvido, porque tem dois dias que faz sol. Estive com os técnicos da Embasa que estão finalizando os reparos. Em breve a água retornará".

Ele disse ainda que o município, que tem cerca de 22 mil habitantes, teve maiores danos na zona rural. "Aqui, 35% das famílias moram na cidade e 65% na zona rural. A maior parte afetada foi mesmo na zona rural. Nunca vimos situação dessa. A barragem do Quati era pai e mãe para a comunidade, então muita gente ficou desassistida. Quem tinha lavoura, plantação de milho, feijão, melancia, batata, inhame, perdeu muito. Muitas casinhas também foram atingidas, algumas caíram, outras estão condenadas. Teve gente que perdeu geladeira, sofá, fogão", conta.  Segundo o gestor municipal, as pessoas prejudicadas estão sendo orientadas a fazer um cadastro junto à secretaria social e a Defesa Civil para ver como serão ressarcidas. Segundo ele, entre 450 e 500 imóveis foram afetados, mas não há informação de quantos estão condenados.

Pedro Gomes Filho destacou ainda que um dos maiores problemas da prefeitura será reconstruir os 105 km de estradas vicinais, que ficam dentro da própria cidade. "Nosso município tem 104m² de território, é uma cidade pequena e muito pobre. Essas estradas vicinais estão inundadas, intransitáveis. E nós usamos elas para transportar doentes para hospitais, crianças para as escolas. Elas já estavam ruins, tanto que no dia 11 eu decretei estado de emergência. Agora elas estão totalmente destruídas", explicou.

Animais também estão em risco A saúde dos animais também é uma preocupação para os municípios afetados. Uma equipe de veterinários de Salvador foi enviada para Coronel João Sá para prestar assistência aos animais afetados pelas enxurradas.

A ação é coordenada por Ilka Gonçalves, presidente da comissão de ética e bem estar do Conselho Regional de Medicina Veterinária da Bahia (CRMV-BA). Segundo ela, a equipe conta com cinco médicos veterinários e presta atendimento gratuito desde sexta-feira (12). Animais estão sendo resgatados nas cidades atingidas (Foto: Evandro Veiga/CORREIO) “Chegamos na sexta e começamos a visitar os locais que foram inundados, fazendo um levantamento dos animais que podem ter sido afetados. Seguimos com isso porque não foi possível chegar em todos os lugares ainda. Diante do tamanho da catástrofe, os animais estão bem de saúde. Temos atendido alguns com diarreia, problema de pele, conjuntivite”, explica. 

Segundo ela, a ação deve durar por pelo menos mais três semanas e contar com reforços vindos dos estados de Alagoas e Minas Gerais. Entre bois, cavalo, cachorros, gatos e aves em geral, além de animais exóticos como porquinhos da Índia, 300 bichos já foram atendidos pelos veterinários. Em breve, uma campanha de vacinação será iniciada.

Ainda segundo Ilka, a situação mais preocupante é a dos porcos. Cerca de 80 suínos foram encontrados em uma pocilga com pragas extremamente nocivas à saúde do animal. “São pragas que há muito tempo não temos notícias, são doenças infecciosas, viral, parasitária. Além da preocupação com os animais, saúde e bem estar deles, estamos preocupados com o risco pra saúde pública local”.

Para atender a demanda, as equipes pedem que sejam feitas doações, principalmente de ração para cães e gatos, além de farelo para porcos. De acordo com Ilka, a quantidade de alimento disponível na região só dá para alimentar os animais até esta quarta-feira (17).

Até o momento, segundo a veterinária, 50% dos animais afetados já foram atendidos, com avaliação clínica e aplicação de vermífugos e antipulgas - a demanda é toda em Coronel João Sá. Não há registros de animais mortos, há apenas alguns desaparecidos que fugiram com a enxurrada, mas muitos já foram encontrados.

Uma conta do Fórum Nacional de Proteção e Defesa recebe doações em dinheiro de quem quer auxiliar no apoio aos animais. Os dados são: Banco Bradesco, agência 1239-4, conta 6264-2 CNPJ: 04.085.146/0001-38.

Quem quiser ajudar os animais também pode contribuir com doações de alguns itens (veja abaixo). Basta levar as doações na Clínica Kennel, que tem unidades na Pituba, Cabula e Brotas, além da clínica Supervet, em Stela Maris.

Confira os itens solicitados:  Esparadrapo; Fipronil para grandes animais Vermífugo para equinos; Antibiótico intramamário; Pomadas para feridas; Coletor universal; Ungüento ou alantol; Lâminas de barbear e tricótomo; Seringas e agulhas para vacinação; Ranitidina Metoclopramida; Ondansetrona. Relembre o caso A barragem do distrito de Quati, em Pedro Alexandre, município baiano na divisa com Sergipe, sofreu um rompimento no final da manhã do dia 11 de julho. Não houve vítimas fatais. De acordo com a prefeitura local, o temporal que cai na região ajudou a comprometer a estrutura da barragem, que faz a contenção da água do Rio do Peixe, e uma parte da estrutura rompeu, fazendo com que uma grande quantidade de água invadisse o povoado de Quati.

A enxurrada atingiu o município vizinho de Coronel João Sá, que teve diversas ruas alagadas. Um trecho da rodovia BR-235 também foi tomado pela água e pela lama e ficou intransitável. Como o rompimento não foi total, moradores de Coronel João Sá, que estavam numa área mais vulnerável às águas, foram retirados de casa.

Um vídeo que circula nas redes sociais mostrou as ruas alagadas, e os moradores buscando possíveis pessoas em risco. 

A situação afetou vários serviços na região, inclusive as escolas, que fecharam. O prefeito de Coronel João Sá, Carlinhos Sobral, publicou um vídeo nas redes sociais orientando a população que vive em áreas consideradas de risco a deixar os locais. "A barragem do Quati realmente estourou. É uma situação atípica. Nunca aconteceu isso com essa barragem, então, nós não sabemos as consequências. Eu peço encarecidamente que todas as pessoas que moram nas áreas de risco que saiam das suas casas, peguem seus documentos pessoais, objetos de valores. (...) Melhor a gente prevenir", afirmou ele.

*Com supervisão do chefe de reportagem Jorge Gauthier