Pelé 80 anos: o último título do rei no Brasil foi na Fonte Nova

Craque veio do Cosmos para enfrentar o Bahia e aproveitou para inaugurar o Iguatemi em 1975

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  • Gabriel Rodrigues

Publicado em 23 de outubro de 2020 às 19:27

- Atualizado há um ano

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Talvez pouca gente saiba, mas a carreira de Pelé também tem uma marca registrada na Bahia. Nos gramados baianos, o rei do futebol desfilou toda a sua maestria. Foram jogos por Santos, Seleção Paulista e Seleção Brasileira. E quis o destino que o último título do astro no Brasil fosse conquistado em Salvador.

Em 1975 Pelé já era um veterano. Aos 35 anos, ele tinha marcado mais de mil gols e conquistado três Copas do Mundo com a Seleção Brasileira, além de muitas outras taças com o Santos, time pelo qual imortalizou a sua carreira.

No final da temporada de 1974, o rei encerrou a passagem pelo futebol brasileiro após 19 anos seguidos vestindo a camisa do Peixe. No início de 1975, ele rumou para os Estados Unidos, onde defenderia o Cosmos.

No entanto, em dezembro do mesmo ano, Pelé voltaria a jogar no Brasil pelo clube santista, e o palco foi a Fonte Nova. O Santos disputava o então Torneio Governador Roberto Santos, competição amistosa promovida pela Federação Bahiana de Futebol e que contava com a participação também de Bahia, Vitória, Vasco, Atlético Mineiro, Coritiba, Figueirense e Remo.

Surgiu então a possibilidade de Pelé defender o Santos durante o torneio, mas colocar o lendário camisa 10 em campo não foi nada fácil. Como já era jogador do Cosmos, o time dos Estados Unidos exigiu um seguro de 4 milhões de dólares para que Pelé jogasse. A dificuldade foi encontrar uma seguradora disposta a garantir tal valor pela integridade física do craque.

Como o Santos insistiu para ter o rei em campo, ele concordou em atuar por apenas 45 minutos no duelo contra o Bahia. E no dia 7 de dezembro de 1975, Pelé voltava a encarnar a camisa do Peixe mais uma vez.

Baixo público

Por causa da indefinição sobre a presença de Pelé em campo, o público na Fonte Nova foi pequeno. A escalação dele só foi confirmada na manhã do dia do jogo e apenas 14.536 torcedores estiveram no estádio.    

De acordo com relatos da época, Pelé foi travado pela marcação tricolor e pouco pôde ajudar a sua equipe. O melhor lance dele foi quando driblou Sapatão, invadiu a área, chutou forte, e o goleiro Joel Mendes mandou para escanteio.

Ao fim do primeiro tempo, Pelé valorizou a defesa do Esquadrão. "O time do Bahia está bem, é difícil penetrar na sua área. O público foi regular e, apesar das chuvas frequentes que tem caído em Salvador, fiquei satisfeito em colaborar para que a arrecadação aumentasse um pouco", disse ele, a grande atração do espetáculo, à Folha de S.Paulo.

Ídolo do Bahia, o ex-meia Douglas, que estava em campo, lembra da partida. Segundo ele, o clima era de festa e Pelé não estava muito preocupado. “Foi um campeonato muito rápido. Ele foi mais porque o nome dele foi muito festejado, era mais um torneio de festa. Pelé não estava muito bem preparado porque no Cosmos ele não se preparava tanto como era no Santos ou na Seleção Brasileira. Ele foi para o Cosmos mais para mostrar que tinha futebol e elevar o nome do clube e do futebol”, conta Douglas, que foi reserva de Pelé no próprio Santos no início da carreira. Esse, por sinal, foi um fator crucial para ele vestir a camisa do Bahia, pois queria ter mais tempo de jogo, o que não era possível na Vila Belmiro para quem jogava na posição do rei.

Com o acordo cumprido, Pelé foi substituído no intervalo e deu lugar para Brecha. No segundo tempo, o Bahia abriu o placar com gol de Alberto, aos 26 minutos, e Brecha empatou dez minutos depois. Cláudio Adão ainda desperdiçou um pênalti para os paulistas.

Depois daquele empate por 1x1 na Fonte Nova, Pelé só voltaria a defender o Santos outra vez em 1977, em seu amistoso de despedida do futebol, quando o alvinegro enfrentou o Cosmos nos Estados Unidos. O rei atuou em um tempo por cada equipe e fez um dos gols da vitória do time americano por 2x1. 

Ainda na Bahia, e sem Pelé, o Santos avançou à final do Torneio Governador Roberto Santos ao eliminar o Atlético-MG. Na decisão, venceu o Vitória por 3x0, na Fonte Nova, e faturou os troféus Cidade de Salvador e Raimundo Viana (então presidente da FBF).

Apesar de não ter disputado a final, Pelé foi considerado campeão do torneio, o último título que conquistou no Brasil. Foi também a última vez que jogou pelo Santos em solo brasileiro.

Pelé na inauguração do Iguatemi

Além do título do Torneio Governador Roberto Santos, a passagem de Pelé pela Bahia reúne “causos” curiosos. No fim da carreira, o jogador cuidava de outros assuntos fora o futebol.

Numa sexta-feira, 5 de dezembro de 1975, dois dias antes do jogo contra o Bahia, o rei participou da inauguração do Shopping Iguatemi (atual Shopping da Bahia). Localizado na Avenida ACM, o empreendimento era até então o maior complexo comercial de Salvador, que naquela época ainda tinha o seu coração financeiro nas ruas do Centro.

Além disso, Pelé aproveitou a viagem para cuidar de assuntos pessoais, como a construção de uma casa de veraneio na localidade de Pedra do Sal, em Itapuã. Como nenhum projeto foi aprovado, ele acabou encomendando outros estudos.

Já no recém-criado Centro Industrial de Aratu, Pelé possuía um terreno que foi doado pelo governo do estado e projetava a implantação de uma fábrica no local. Na época não havia definição sobre qual seria o ramo no novo negócio do rei em Salvador, mas, de acordo com relato da Folha de S.Paulo na época, ele possuía concessões de empresas como Calói (bicicleta), Colorado (televisores) e Pepsi Cola, da qual era garoto propaganda.

Pelé ainda precisou resolver um imbróglio sobre o assunto, já que o prazo para a construção no terreno havia encerrado. Ele então se reuniu com o governador Roberto Santos em um jantar e conseguiu uma prorrogação de dois meses. 

Durante o tempo em que permaneceu na capital baiana, Pelé tinha à disposição um carro Rolls Royce, que pertencia ao ex-presidente do Bahia Alfredo Saad, então amigo e sócio do craque do futebol.