Perfil: Heloisa Jorge, atriz entre dois mundos

Angolana radicada na Bahia grava série para a Globoplay

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  • Ronaldo Jacobina

Publicado em 26 de junho de 2022 às 16:00

. Crédito: Márcia Otto/Divulgação

Dois anos depois de ter as gravações interrompidas em função da pandemia, a série Fim, baseada no romance de Fernanda Torres, retomou os trabalhos nesta semana sob a direção de Andrucha Waddington e Daniela Thomas. A obra, que será exibida pela Globoplay, tem uma “falsa” baiana no elenco.

Heloisa Jorge, que fez carreira de sucesso nos palcos baianos, interpreta a personagem Célia em todas as fases durante a passagem de tempo da história. A atriz, que se orgulha de ser confundida com uma baiana, nasceu em Lunda Norte, Angola, mas é filha de mineiro com angolana.

Embora Montes Claros (MG), terra do pai, tenha sido sua primeira paragem em solo brasileiro, foi na Bahia que começou a carreira de atriz ainda como estudante de Artes Cênicas na Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia.

“Minha mãe sempre dizia que a Bahia era muito parecida com Angola, então quando ela morreu, decidi que seria aí que iria morar”, conta a artista que desde ontem (15) pode ser vista na série Sentença, uma produção original da Amazon Prime que estreou simultaneamente em 240 países.

Na obra, Heloísa interpreta Moira, uma advogada ambiciosa, braço direito de uma facção criminosa do Rio de Janeiro. “A história é uma crítica ao sistema carcerário brasileiro”, conta a artista que tem Camila Morgado como colega de cena.

Embora tenha vivido 10 anos na capital baiana, onde ganhou prêmios pela sua atuação no teatro, foi no Rio de Janeiro que a carreira deslanchou. Vivendo há quase uma década na capital carioca, Heloísa Jorge já emprestou seu talento para várias produções globais, a exemplo das novelas Gabriela e Dona do Pedaço, além de outras produções como Sob Pressão; A lei do Amor e Liberdade, Liberdade, entre outras. Heloisa Jorge na série Sob Pressão (Divulgação) O ator Harildo Deda, que trabalhou com a colega na novela Gabriela elogia o carisma de Heloísa. “Trabalhamos juntos na novela e me lembro que era uma pessoa muito simpática”, conta.

Somente este ano, a artista estará em três outras produções audiovisuais em canais de streaming. Em breve, ela também pode ser vista na segunda temporada da série 'El Presidente', do vencedor do Oscar, Armando Bo, com produção também da Amazon Prime.

Nesta produção, gravada no Uruguai, Heloisa dá vida a uma comissária da Organização das Nações Unidas (ONU) e, pela primeira vez, tem sua atuação falada na língua inglesa. “Foi um grande desafio, mas esse é também um trabalho muito importante por se tratar de uma produção internacional”. Em 'Falas Negras', Heloisa Jorge foi dirigida por Lázaro Ramos (Divulgação) Embora os dois anos que ficou parada tenham sido difíceis, a atriz celebra a volta do trabalho com vários projetos em curso. Um deles é a produção da série em andamento: How to be a Carioca, criada por Carlos Saldanha e Joana Mariani para a Star Plus.

Ainda para este ano, está previsto o lançamento do filme Sujeito Oculto, primeira ficção do documentarista Leo Falcão, que se passa em Recife e foi filmado antes da pandemia. “Me sinto abençoada de ver as coisas se restabelecendo depois de tantas incertezas que vivemos”, comemora.

Régua e compasso Embora tenha chegado ao Brasil ainda adolescente, a menina que se orgulha de sua origem africana, teve que se livrar do sotaque angolano para se encaixar nas turmas da escola. “Sempre tive um bom ouvido e usei essa habilidade para imitar o sotaque dos meus coleguinhas e assim fui perdendo o sotaque que só volta à tona quando converso com minha família”, ri.

Foi o desejo de pertencer ao lugar onde passou a viver que, de alguma forma, a empurrou para a carreira artística. “Não tive artistas na família, mas aproveitava todas as oportunidades que tinha para declamar poesia e interpretar personagens nas peças de teatro na escola, isso também me ajudou a mudar o meu sotaque”.

O ator Ângelo Flávio lembra que Heloísa sempre foi muito dedicada ao ofício. “Participamos juntos do Coletivo de Atores Negros e Negras Abdias Nascimento, a primeira companhia de teatro negro em nível acadêmico do país. Ali nos formamos artisticamente e lutamos por uma cena teatral mais diversa. Heloísa é uma atriz disciplinada e intuitiva, é um fenômeno em cena, ela se entrega de maneira viva e intensa aos personagens. Muito orgulho de tê-la como amiga e irmã de arte”, diz.

Mesmo se considerando inserida na cultura local, a atriz não abandonou suas raízes africanas. Em meados dos anos 2000 voltou a seu país de origem para participar de uma novela numa emissora de TV angolana. “Foi uma experiência riquíssima voltar a Angola para trabalhar lá”, diz.

Angola, segundo ela, continua sendo sua maior referência, mas é aqui, no país que a acolheu, que planeja alçar novos voos. Estou aberta a boas experiências artísticas, seja aqui ou em qualquer outro lugar”.