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Poesia, psicologia e redução de danos: profissionais de saúde tentam salvar a Igreja de Santana

A convite da Paróquia, professor da Ufba faz série de atividades para dar vida à igreja secular

  • Foto do(a) author(a) Vinicius Nascimento
  • Vinicius Nascimento

Publicado em 1 de fevereiro de 2020 às 07:30

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: Foto: Betto Jr/CORREIO

A Igrejinha de Santana é um exemplo de resistência e boa vizinhança. Construída na primeira metade do século XIX, a construção com capacidade para abrigar 72 pessoas sentadas e outras 72 de pé, já foi a matriz do Rio Vermelho, status que, hoje, pertence à Igreja de Santana - localizada a pouco menos de 50 metros dali.

A Igrejinha quase foi demolida na década de 1980 e foi salva porque os moradores locais fizeram campanha contrária, com direito a apoio de Jorge Amado, Carybé e Mario Cravo. No meio de toda a agitação semanal que envolve o largo de Sant'Ana, a religiosa construção resistiu e hoje engatinha novamente em busca de sobrevivência.

Professor aposentado da Universidade Federal da Bahia, Antônio Nery Filho recebeu um convite do Padre Angelo, pároco da Paróquia de Sant'Ana, que o chamou para ocupar a igrejinha - que não abria suas portas há quase 10 anos. A única condição de Nery para aceitar o desafio foi ter carta branca para fazer do espaço um verdadeiro centro para "ajudar as pessoas a proteger suas vidas". 

O convite chegou em meados de novembro, no ano passado. A carta branca foi concedida pelo pároco, que também é presidente do Centro Social e Cultural Monsenhor Amilcar Marques, que funcionava na igrejinha em comodato com a Arquidiocese. Havia, então, um problema para Nery resolver: como transformar aquele lugar? 

“Aqui acontece tudo de forma muito anárquica”, conta Antônio Nery, que também é psiquiatra. Desta forma, diversas ações vêm e vão na Igrejinha. Ele convidou um grupo de colegas, todos profissionais de saúde, para propor iniciativas ao espaço. O próprio Nery criou a dele, com uma biblioteca permanente: uma mesa é colocada na entrada da igreja cheia de livros. Qualquer pessoa pode pegar, ou doar, à vontade. Não paga nada. Antônio Nery mantém biblioteca e faz atendimentos psiquiátricos gratuitos na Igreja (Foto: Betto Jr./CORREIO) O espaço também serve para uma iniciativa que Nery chama de 'psiquiatria de rua'. Ele fica sentado na entrada do espaço e atende Às pessoas que chegam pedindo ajuda. Temas como redução de danos, consumo de drogas e educação sexual são as maiores preocupações de Nery, que também estimula recitais de poesia e doa camisinhas nas mesas dos bares que dividem espaço com a Igreja.“Cada um de nós tem a utopia de revitalizar a igreja para um espaço de cultura e espaço para a vida. Hoje quero revitalizar a igreja, sem cobrança ou restrições”, explica Nery.O fato da Igreja ter passado muito tempo fechada e estar em um dos pontos turísticos mais conhecidos de Salvador estimula a curiosidade de quem transita no Rio Vermelho. Volta e meia, aparece alguém por lá e Nery faz questão de pinçar essas pessoas. Foi assim que, do nada, arranjou uma exposição sobre a Festa de Iemanjá para movimentar a igreja.

Explica-se: o fotógrafo Roberto Faria estava de passagem no Rio Vermelho para registrar o ‘aquecimento’ para a Festa de Iemanjá, no dia 2 de fevereiro. Entre uma foto e outra, percebeu que a igreja estava aberta e decidiu bisbilhotar. Ele entrou no templo pela primeira vez, ficou encantado e em uma rápida conversa acabou acertando a ideia de expor fotografias sobre o dia da Rainha das Águas. Além disso, também se comprometeu a viabilizar a pintura das desgastadas paredes do local."Vi a porta aberta e entrei. Sempre quis entrar nessa igreja. Estudei aqui quando criança, mas nunca consegui entrar. A gente está disposto a ajudar porque isso aqui é a alma do Rio Vermelho. Tudo do bairro circula aqui", explicou Roberto.Entrar na igrejinha de Santana pela primeira vez é uma realidade muito comum para pessoas de todo o mundo. Os italianos Antonello Venero e Olaria Di Stani também pisaram no interior da igrejinha pela primeira vez. Os dois moram em Salvador há 14 e 12 anos, respectivamente. Mais ainda: Olaria reside no próprio Rio Vermelho e contou que ficou contente em conhecer o interior da igreja. Dupla de italianos pisou na Igreja pela primeira vez (Foto: Betto Jr./CORREIO) A estrutura, inclusive, é muito simples. Diferente de outros templos que são banhados a ouro, têm tapetes bonitos e uma decoração toda especial, a igrejinha de Santana é muito simples. A única referência católica no interior da igreja é uma cruz, bem simples, que fica acima do altar - atualmente coberto por um pano improvisado.

Os voluntários abrem a Igreja todas as sextas-feiras e por conta disso, somado à precariedade na estrutura do local, é preciso um mutirão para varrê-la e tirar os restos de tinta que caem e a poeira que se acumula no local. Antônio Nery conta, também, que está batalhando para conseguir religar a transmissão de água no local, que está interrompida. Sereno, o psiquiatra afirma que não tem pressa de nada - mesmo com as dificuldades. Para ele, o importante é manter o espaço vivo, circulando e trazendo coisas novas. Úteis para melhorar vidas.

Ele também conta que o espaço é aberto para qualquer pessoa que tiver uma proposta de atividade. Poesia, música, artesanato, saúde, debates... Há espaço para tudo, basta querer. Não é preciso sequer manter uma periodicidade obrigatória. Se tiver alguma coisa para exibir e quiser fazê-lo uma única vez, é possível. O importante é ter movimento.

*com supervisão da subeditor Tharsila Prates