Polícia Civil analisa imagens de ação da PRF que deixou adolescente morto

Pai foi ouvido no DHPP; familiares homenagearam garoto de 17 anos nesta quinta-feira (21)

Publicado em 21 de novembro de 2019 às 09:51

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO

A Polícia Civil já está sob posse de imagens que registraram a ação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) que resultou na morte do adolescente Natanael de Araújo Conceição, 17 anos. 

Há sete dias, o garoto estava acompanhado do pai, o tesoureiro Juarez Conceição, 46, quando foi baleado na cabeça, no bairro de Pirajá, em Salvador, durante perseguição da PFR a um suspeito - ainda não identificado pelo Departamento de Polícia Técnica (DPT) - que também foi morto. 

O pai da vítima foi ouvido pelo delegado Odair Carneiro, nesta quarta-feira (20), na sede do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). Durante homenagem ao filho, na manhã desta quinta-feira (21) - no mesmo local onde houve o assassinato - disse à reportagem que as imagens já são analisadas pela polícia. Natanael estava a caminho de sessão com fonoaudiólogo (Foto: Reprodução/Tailane Muniz/CORREIO) “Senti muita segurança com as palavras do delegado.  Porque de tudo, o mais difícil é a sensação de impotência. Meu filho era um jovem indefeso, que precisava de mim e da mãe para tudo”, lamenta, ao mencionar que foi informado pela polícia que as armas já foram submetidas ao teste de balística e demais perícias.

Ao CORREIO, o delegado Odair Carneiro disse que o protocolo de investigação a ser seguido é o mesmo, ainda que se trate de outra esfera da polícia. 

“Tudo vai seguir como uma investigação normal. Os fatos estão sendo apurados, mas não posso detalhar para não atrapalhar as investigações”, se limitou a dizer, sem mencionar o conteúdo ao qual a Polícia Civil teve acesso.

Por meio da assessoria de comunicação, a Polícia Civil informou que investiga todo e qualquer crime, seja ele envolvendo policiais civis, federais ou militares. A pasta acrecensta ainda que, no caso dos militares, os servidores são investigados e julgados, além da Justiça comum, pela Justiça Militar.

‘Sorriso inocente’ Torcedor do Bahia, Natan, como atendia aos mais próximos, foi lembrado nesta quinta, uma semana depois de sua morte, como um “menino bom, de sorriso inocente”.

As mensagens de afeto estampadas em balões brancos reforçam a falta que o garoto já faz aos mais próximos. “Dos colegas do baba aos da escola, ele era muito amado. Não tinha nada nas mãos, todo dia voltava da escola sem lápis porque dava aos amigos”, diz o pai, em meio às lágrimas. 

A expressão de sofrimento estampa o rosto também da mãe, a autônoma Gisele Araújo, 45, de quem Natan era filho único. Ao lado do marido, Gisele sequer ensaia falar, apenas balança a cabeça e concorda com os adjetivos usados para descrever a personalidade do filho - lembrado também pelo hino do tricolor baiano, o “maior amor de Natan”.Vídeo mostra momento em que suspeito matou motorista de Uber

“Tudo para mim. Eu não sou mais ninguém sem ele”, disse a tia avó, a dona de casa Rosária Cardoso, 66, que indaga: “Será que eles têm filhos? É por que somos pobres?”. E repete, continuamente, ao expressar inconformismo. Diz que a PRF não procurou a família desde o dia da ação. E resume o ato como “desumano”. 

A PRF voltou a ser procurada pelo CORREIO nesta quinta e, por meio da assessoria, disse que a “área dos Direitos Humanos da Superintendência Regional quer receber a família para prestar o apoio e os esclarecimentos necessários”. Pai afirma que pediu que a polícia não atirasse Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO 'Truculentos’ Natanael era autista e, no dia do crime, havia saído de casa, em Sussuarana, para uma consulta no Instituto Guanabara, no bairro de Brotas, onde recebia auxílio às terças e quintas. Pai e filho haviam acabado de deixar a Avenida Gal Costa, quando foram interceptados por um bandido em fuga. Juarez conta que não teve saída e se rendeu. O suspeito entrou e ordenou que ele acelerasse. 

Foi quando se deparou com uma viatura da Polícia Rodoviária Federal (PRF), na contramão, em busca do suspeito armado - este havia matado um motorista de carro por aplicativo durante uma tentativa de assalto momentos antes. Mesmo lugar onde, hoje, a família se reuniu.

Com riqueza de detalhes, Juarez lembra de passo a passo do que viveu até ver o caçula dos três filhos baleado na cabeça, no banco traseiro.“Eu disse que ele já estava morto, vi massa encefálica, mas eles perguntaram: ‘você é médico?’. Mas eu já sabia”, resume. Pai, mãe, tia-avó e avó homenageram garoto nesta quinta-feira (21) (Foto: Tailane Muniz/CORREIO) Juarez lembra que foi retirado do carro e direcionado à parede. “Eles me pediam calma, mas chegaram a me revistar”, diz, sobre os dois agentes fardados da PRF. Não lembra se eram jovens, mas recorda tudo o que disse para tentar evitar os tiros. Segundo a PRF, os policiais estão afastados das ruas. 

Tio de Natanael, o técnico em mecatrônica Samuel da Purificação, 50, interrompe a fala do irmão para esclarecer que o pai da vítima agiu como "qualquer cidadão de bem agiria". “Meu irmão colocou a mão na cabeça, assim como o bandido, que já tinha a arma descarregada até”.

Samuel comenta que, para aquela circunstância, “há um protocolo de segurança específico que não foi seguido pelos agentes”. E se desespera ao relatar que o “xodó” da família, do baba e da escola foi atingido na cabeça e morreu em silêncio: “Ele não teve tempo nem de gritar socorro”.