Polícia encontra bilhetes em apartamento de onde médica caiu do quinto andar

Mensagens teriam sido escritas por Sáttia e indicam que ela vivia uma relação abusiva

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  • Bruno Wendel

Publicado em 30 de julho de 2020 às 05:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução

Uma das pistas que pode esclarecer o que aconteceu com a médica Sáttia Lorena Aleixo, 27, está em bilhetes encontrados no apartamento onde ela mora, após a moça  cair do 5º andar do prédio, em Armação. As mensagens, supostamente escritas pela médica, foram achadas por policiais em meio a objetos espalhados na sala do imóvel. 

As informações foram passadas ao CORREIO por fontes da Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA) que tiveram acesso ao local. O laudo oficial da perícia técnica só deverá sair em 30 dias. Sáttia Lorena continua internada em estado grave no Hospital Geral do Estado (HGE). 

De acordo com as fontes da SSP, o  conteúdo dos bilhetes aponta para desabafos sobre uma possível  relação abusiva. Há também mensagens comentando o desempenho sexual de um homem que não é nomeado. 

O namorado da jovem, o médico Rodolfo Cordeiro Lucas, chegou a ficar preso sob a acusação de tentativa de feminicídio, mas teve a prisão preventiva revogada na manhã de segunda-feira (27), após decisão do juiz Vilebaldo José de Freitas Pereira. Na decisão, o magistrado aponta a inexistência de provas materiais e indícios que comprovem que ele a jogou da janela. O médico, por sua vez, afirma que a namorada se jogou da varanda e que tinha depressão.

 Além dos bilhetes, objetos e móveis desarrumados somam-se ao quebra-cabeças do inquérito instaurado na Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam) de Brotas. Remédios, alguns controlados, e uma mancha de sangue também foram encontrados em um dos quartos do apartamento.    

Papel Ofício 

Escritos em pedaços de folhas de ofício, os bilhetes estavam em um canto da sala, uns sobre os outros, e, devido a posição em que foram encontrados, teriam sido retirados de uma bolsa, que estava sobre uma cadeira. Eram cerca de cinco bilhetes, escritos nos meses de maio e junho, com  as datas. Alguns contendo rasuras, outros com frases incompreensíveis.

No entanto, segundo as fontes da SSP, alguns textos seriam reproduções de diálogos que a médica teve com pessoas por telefone. Em uma havia a frase: “Não fui eu quem cancelou. Quem cancelou foi ele”. Nesse contexto, no entendimento das fontes, é como se ela se justificasse do que  não fez, como deletar nomes da agenda do  celular. Em outro trecho, a frase “As perigosas vai cancelar” (sic), seria o momento em que ela reproduz uma fala que a obriga a se afastar de algumas amizades. 

Foram encontrados também mensagens para um homem. Em uma delas, Sáttia dá a entender que ele “era um monstro” e ela não o conhecia direito. Ainda sobre a mesma pessoa, a médica fala do desempenho sexual: “Ele é ruim de cama”. 

Varanda

As fontes da SSP disseram ao CORREIO que encontraram a sala desarrumada – o apartamento é composto por três quartos, sendo uma suíte, sala, cozinha e outro banheiro. Havia roupas pelo chão, almofadas jogadas, dando a impressão de que realmente houve uma discussão acalorada momentos antes da médica despencar do quinto andar, conforme relato dos vizinhos e do próprio Rodolfo.

Na sala, o que chama a atenção é a varanda. A janela é de correr e parte dela estava forçada. Na mesma direção havia um vaso grande caído no chão. O cenário sugere que teria ocorrido uma briga no espaço. 

Ainda na sala havia remédios espalhados, com o Diazepam, medicamento controlado prescrito por psiquiatras para tratamento de ansiedade, síndrome do pânico e outras questões psicossomáticas ligadas a transtornos ansiosos.

Suíte e sangue no lençol Pela direção da queda, Sáttia caiu da janela do quarto que tem a suíte. As fontes da SSP disseram que a cama boxe estava encostada à janela, como se o móvel fosse colocado para ter apoio para chegar à janela de vidro, de abrir. Entre a parede da janela e a cama, o espaço é pequeno, o que inviabilizaria uma briga. Além disso, no local não havia indícios de violência, como marcas nas paredes e vidros quebrados ou qualquer outro sinal de luta, como pedaços de pele ou fios de cabelo. As fontes ressaltam ainda que, pelo tamanho do ambiente, seria impossível esses elementos não fossem notados no caso de uma pessoa ter sido levada ao quarto à força.  

Uma mancha de sangue foi encontrada em um lençol de cor escura no quarto de onde Sáttia caiu. A quantidade era pequena e, segundo as fontes da SSP, não parecia ter jorrado ou ser efeito de algum objeto cortante. Ou seja, o corte não teria sido provocado por uma luta corporal e sim resultado de um acidente. No entanto, só o laudo poderá apontar de quem é o sangue e quais as circunstâncias da mancha. Nos outros dois quartos e na cozinha não houve nada que chamasse à atenção dos policiais. 

Casal Ainda de acordo com as fontes entrevistadas pelo CORREIO, o casal parecia não estar o tempo todo em conflito. Na varanda, na churrasqueira havia um pedaço de carne assado em data recente ao dia da queda de Sáttia. Momentos antes de a médica despencar do quinto andar, chegou uma entrega de alimento para o apartamento, mas o pedido não chegou a subir, pois logo em seguida vizinhos ligaram para a portaria avisando da briga do casal. 

Irmã relatou controle do namorado Depoimento Ouvida pela Polícia Civil, Jaqueline Aleixo, irmã de Sáttia Lorena, revelou que a médica já havia desabafado   sobre as humilhações causadas a ela pelo namorado, o também médico  Rodolfo Cordeiro Lucas, que teve a prisão preventiva revogada pela Justiça. 

Segundo o depoimento  de Jacqueline,  Rodolfo Lucas controlava as roupas que Sáttia vestia. Por causa do namorado, a médica teve que sair da academia de ginástica e desativar as  redes sociais. O motivo seria o ciúme do médico. 

Logo depois da queda de Sáttia Lorena  da janela do quinto andar do prédio onde  mora, em Armação, um primo da jovem, o advogado Anderson Moreira também havia afirmado ao CORREIO que a moça teve de sair de todas as suas redes sociais por causa do namorado. Ainda segundo o primo, a relação era abusiva e a médica chegou a dizer  várias vezes que havia terminado o relacionamento, mas voltava atrás porque Rodolfo  dizia que ia mudar de comportamento. “Era sempre assim. Ele chegava chorando e ela perdoava".

*Conheça 10 sinais de uma relação abusiva:1 - Transformar incidentes insignificantes em  motivos para  grandes discussões;

2 - Ameaçar ferir amigos e pessoas da família se a vítima não faz o que o agressor quer;

3 - Ter acessos súbitos de raiva e ciúmes sem motivo;

4 - Usar intimidação ou manipulação para controlar a vítima ou os filhos do casal;

5 - Não deixar a vítima visitar familiares e amigos; afastá-la de todas as pessoas  em quem ela confia;

6  - Destruir  propriedades ou objetos pessoais da vítima, principalmente aqueles  de valor sentimental para ela;

7  - Não deixar a vítima estudar, trabalhar ou ter qualquer tipo de realização pessoal;

8  - Xingar ou chamar a vítima por nomes pejorativos e que a desqualificam como pessoa ou profissional; humilhá-la na frente de outras pessoas;

9  - Controlar o dinheiro da vítima, obrigando-a a prestar contas de cada coisa  que ela gasta e humilhá-la negando até itens básicos;

10  - Ameaçar ferir a vítima ou os filhos com frequência; bater, empurrar, morder ou qualquer outro ato de agressão

*Fonte: agenciajovem.org.br

Recomendação O Ministério Público da Bahia (MP), através do Grupo de Atuação Especial em Defesa da Mulher (Gedem), enviou à SSP-BA uma recomendação para que as ocorrências de violência doméstica pudessem ser realizadas de forma online com o objetivo de evitar o deslocamento às delegacias, até porque o transporte público está reduzido na maioria das cidades. 

“Nós também pedimos que seja disponibilizado nos sites das instituições um modelo de pedido de medida protetiva. Se a mulher tiver isso à disposição, já adianta um passo”, explica a promotora Sara Gama, coordenadora do Gedem. 

Segundo a promotora, a pandemia trouxe pelo menos quatro fatores de risco às mulheres que convivem com seus agressores: o próprio isolamento, o consumo de álcool e drogas, desemprego e comportamento controlador. Por causa da vigilância dos agressores, a promotora acrescenta que é importante que os canais não presenciais de denúncias sejam divulgados (veja abaixo).

SAIBA COMO DENUNCIAR DE FORMA NÃO PRESENCIAL:

A rede de proteção à mulher é formada por diversas entidades como o Tribunal de Justiça, Ministério Público, Defensoria Pública, Secretaria de Segurança Pública, dentre outras.

Central de Atendimento à Mulher - Disque 180

Polícia Militar - Disque 190

Defensoria Pública da Bahia - Disque 129 ou 0800 071 3121

Chatbot no Facebook da Defensoria: https://www.facebook.com/defensoria.bahia/

Salvador

1ª Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher

Telefone: (71) 3320-9718

2ª Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher

Telefone: (71) 3232 - 7001

Telefone: (71) 99723-2708

4ª Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher

E-mail: [email protected] 

Telefone: (71) 3320-6824

Telefone: (71) 99901-9351

Delegacia da mulher – Brotas: 3116-7000 / 7001 e 3116-7003

Delegacia da mulher – Periperi: 3117-8203 / 3117-8206 e 3117-8217

Comarca de Camaçari

Vara de violência doméstica: (71) 3621 8721 e (71) 9 9700-4592 

Comarca de Feira de Santana

Vara de violência doméstica: (75) 3614-5835 e 3624-9615 

Defensoria Pública – (75) 3614-8376

Centro de Referência Maria Quitéria – (75) 3616-3433

Delegacia da Mulher – (75) 3602-9298

Ronda Maria da Penha – (75) 99121-9062

Comarca de Juazeiro

Vara de violência doméstica – (74) 3614-7142

Creas – (87) 9 8130-3597

Delegacia da mulher – (87) 9 9913-6842

Ronda Maria da Penha – (74) 9 9110-6045

Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Mulher – (74) 3612-3050

Comarca de Vitória da Conquista

Vara de violência doméstica – (77) 3425-8980 e (77) 9 9874-3131 

Ministério Público da Bahia

0800 642 4577

Vale ressaltar que, nas comarcas onde não existem Vara de Violência Doméstica, as Varas Criminais recebem as demandas. E, se por acaso, não tiver delegacia da mulher, a delegacia comum atende a vítima.