'Precisamos de ajuda para nos engrandecer', diz Deusa do Ébano sobre apoio a blocos afro

Gleicielle Teixeira foi eleita neste sábado (8), na 41ª Noite da Beleza Negra, e já chegou para ser uma voz em defesa da beleza e cultura negra

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  • Hilza Cordeiro

Publicado em 9 de fevereiro de 2020 às 21:50

- Atualizado há um ano

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. por Foto: Marina Silva/CORREIO

A nova Deusa do Ébano tem o mesmo endereço do Ilê Aiyê. Moradora do Curuzu, bairro sede da entidade, a estudante Gleicielle Teixeira, 22, foi coroada na 41ª Noite da Beleza Negra, neste sábado (8), e já chegou para provar as razões de ter sido eleita. Em entrevista ao CORREIO, a jovem defendeu maior fatia de patrocínio aos blocos afro de Salvador, que têm usado as redes sociais para denunciar a falta de apoio financeiro para o Carnaval.“Nós precisamos de patrocínio porque isso é um incentivo aos blocos que valorizam a cultura negra em Salvador. E nós não fazemos preservação só no Carnaval. O Ilê, o Olodum, os afoxés são uma família e estamos todos no mesmo barco, queremos a mesma coisa. A gente precisa se fortalecer e precisamos sim de ajuda para nos engrandecer”, disse ela.Modelo desde os 11 anos, ela já havia participado de diversos concursos de beleza, mas define essa experiência como a maior de todas porque a entidade a aceita como é. Nas competições e trabalhos anteriores, rendia-se ao padrão estético para poder participar e sofria alisando o cabelo e escondendo o volume carnudo dos lábios. Na memória de infância, ela guarda um dia em que, puxada pela mãe, se recusava a ir para o colégio por conta dos fios crespos.“Eu sempre me achei muito bonita, não vou mentir, mas eu tinha que me adaptar a algumas estéticas. Eu tinha muita vergonha do meu cabelo e quebrei ele todo alisando porque não me sentia bonita. Aí, através da minha mãe, eu conheci o Ilê e vi que era isso que eu queria para mim e para todas as mulheres como eu. O Ilê não promove um concurso de beleza e sim um concurso de representatividade no empoderamento de mulheres negras”, define. [[galeria]]

Participando da Noite da Beleza Negra pela segunda vez, a estudante de moda passou o último ano inteiro dedicada a conquistar o título: fez aulas de dança na Fundação Cultural do Estado da Bahia (Funceb), pesquisou a história do Ilê Aiyê e desenvolveu um figurino todo inspirado no país-tema Botswana, vigésima primeira nação homenageada pelo bloco. O traje contou com elementos como o instrumento caxixi, dentes, brilhos e estampa de zebra — animal presente no brasão de armas do país.

Filha de pescador e natural de Jaguaripe, próximo a Valença, a jovem se mudou para Salvador há dois anos e decidiu disputar o posto de Deusa Negra depois de incentivos de familiares e até de desconhecidos que a viam na rua. A história com o Ilê, no entanto, vem de berço. 

Mãe de Gleice, a comerciante Jaguaracira Teixeira, é moradora antiga do Curuzu e apaixonada pelo bloco. Quando a filha ainda era criança, ela já lhe dizia que um dia seria Deusa do Ébano e cantava “O Charme da Liberdade” para a menina. “Eu tinha o sonho de ser deusa, mas meu pai tinha um tabu de deixar a gente sair no Ilê, era rigoroso, então eu ia fugida”, lembra Jaguaracira.

Ao lado de Gleicielle, também foram eleitas duas princesas, a carioca Sabrina Sant' Ana dos Santos, 31 anos, que ficou em segundo lugar e a estudante de nutrição Núbia Ferreira, 19 anos, em terceiro. O evento contou com participação a das cantoras Daniela Mercury, Nara Couto, Graça Onasilê, Márcia Short e Patrícia Gomes, ao lado da anfitriã Band’Aiyê. 

Para Antônio Carlos, o Vovô do Ilê, a noite não poderia ser mais feliz com a escolha de uma deusa do próprio Curuzu. "Ficamos fora do [Edital] Ouro Negro, mas continuamos na luta para viabilizar o Carnaval que, esse ano, fortalece a defesa do feminino, que sempre foi um dos pilares constituintes do Ilê ", completou.