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Wendel de Novais
Publicado em 17 de julho de 2020 às 05:15
- Atualizado há 2 anos
A circulação de automóveis pelas rodovias baianas diminuiu consideravelmente nos primeiros meses de 2020, em razão da pandemia do novo coronavírus. Mas a quantidade de cocaína que é transportada em território baiano, não. Conforme o relatório semestral da Polícia Rodoviária Federal, mais de 1,4 tonelada de cocaína foi apreendida durante abordagens entre os meses de janeiro e junho.>
Segundo o chefe de operações especializadas da PRF, Jader Ribeiro, os narcotraficantes não reduziram suas atividades. “A circulação de entorpecentes continua a mesma coisa. A demanda por narcóticos não diminui, e, por isso, os criminosos mantêm as suas atividades normalmente”, afirma. O policial também explicou como a PRF tem obtido mais êxito nas abordagens:>
“Quanto menos veículos na rua, mais fácil encontrar essas cargas ilícitas porque o número de abordagens da polícia se mantém”. O aumento tão significativo na quantidade de drogas confiscadas também tem a ver com as apreensões substanciais que acontecem de uma vez. No dia 23 de abril, por exemplo, em operação conjunta com a Polícia Federal, a Polícia Militar da Bahia e a Polícia Militar de Goiás, a PRF apreendeu 500 quilos de cocaína em uma residência localizada em Luís Eduardo Magalhães, oeste da Bahia.>
Maconha e crack Diferentemente da cocaína, as quantidades apreendidas de maconha e crack diminuíram. Nos seis primeiros meses de 2019, a polícia interceptou 6,3 toneladas de maconha e 93 quilos de crack. No primeiro semestre de 2020, 3,5 toneladas de maconha e 10 quilos de crack foram tirados das mãos de criminosos em abordagens.>
Jader Ribeiro afirmou que essa diminuição acontece porque os dois entorpecentes, que têm como origem principal países como Bolívia, Paraguai e Peru, não chegarem diretamente na Bahia. “As apreensões dessas duas drogas têm acontecido já na região de fronteira. Por isso, sua circulação é menor em relação aos outros anos. Quando apreendemos, a captura acontece normalmente em quantidade para consumo individual”, explica o oficial.>
Houve, ainda, um aumento na recuperação de carros roubados que eram utilizados para o transporte dos narcóticos. Até aqui, 530 veículos e 102 agregados de veículos, provenientes de roubo, furto ou adulterados, foram recuperados. O número representa um aumento de 35% em comparação com o primeiro semestre do ano passado.>
Rota importante Coordenador do Ideas - Assessoria Popular e Integrante do Fórum Popular de Segurança Pública da Bahia, que discute a política de drogas no estado, Wagner Moreira explica que, apesar da pandemia, o consumo das drogas não sofre qualquer redução, podendo, inclusive, ter crescido. “O consumo de drogas existe desde que os homens se entendem em sociedade, e na pandemia, com as pessoas vivendo essa situação de angústia, a procura pelas drogas, ao meu ver, aumentou diante da conjuntura de incertezas”, diz.>
As drogas que circulam pelas estradas baianas não servem apenas para abastecer o consumo interno do estado, mas também passam por aqui para atingir outras regiões do país. “A Bahia tem algumas malhas viárias, bastante importantes para circulação do eixo entre o sudeste e o restante do nordeste. São estradas importantes para circulação de mercadorias em geral, e não é diferente com as drogas”, explica Moreira. >
“Existe uma produção, sobretudo da maconha, que é forte aqui no estado. Essa droga precisa ser escoada, porque apenas parte é consumida no mercado interno. A gente é também receptor das drogas vindas da região do Paraguai, e que chegam da região sul do país e passam pelas estradas baianas”, detalha o especialista.>
Violência Estudioso da relação entre o tráfico e a segurança pública, Wagner Moreira destaca uma diferença importante que as apreensões em tempos de pandemia podem representar, no que diz respeito à violência que o combate ao tráfico acaba provocando. Dados do Atlas da Violência, documento que analisa os registros do último ano para homicídios e outros crimes, cerca de 80% das chamadas de mortes violentas intencionais no Brasil estão relacionadas com a disputa de territórios. >
Outros 11,5% vêm de confrontos entre as policias e o mundo crime.“Tão importante quanto entender para onde vai essa droga, é avaliar o que muda na pandemia. Pela primeira vez, estamos falando da apreensão de grandes quantidades sem necessariamente estar falando dos efeitos de uma guerra às drogas, e sem um link direto com os efeitos dessa guerra, que causa um grande número de óbitos nas periferias. Esses números mostram que é possível fazer um trabalho de inteligência e apreender essas drogas sem necessariamente ter que estar cometendo Autos de Resistência, os homicídios”, defende Moreira. >
Ele destaca ainda o “olhar mais limpo” para os portos, outro ponto estratégico para desaguar substâncias ilícitas. “Boa parte dos containers não são abertos e a Bahia tem um volume de mercadoria que vem do oeste do estado que, de alguma forma, cria uma rota de exportação”, diz Wagner. >
*Com orientação da subeditora Clarissa Pacheco >