Problema que internou Bolsonaro acometeu cerca de dois mil baianos em 2021

Obstrução intestinal é comum em pessoas que já realizaram cirurgias abdominais e pode evoluir para casos gravíssimos; entenda como tratar

Publicado em 31 de março de 2022 às 06:00

. Crédito: Reprodução/Twitter

Na terça-feira (29), o presidente Jair Bolsonaro recebeu alta do Hospital Forças Armadas, após ficar um dia internado por conta de dores na barriga e refluxo, a suspeita é que ele tenha sofrido mais uma obstrução intestinal. Em janeiro deste ano, o presidente sofreu um quadro parecido depois da ingestão de camarão. Apesar dos memes, o assunto é sério. Entre janeiro e outubro de 2021, foram registradas 1.995 internações de baianos por conta da doença somente na rede pública, segundo o Ministério da Saúde. Só na capital foram 369 internações por obstrução.

Mas afinal, o que o quadro clínico representa? Nosso intestino é acomodado dentro do corpo como uma mangueira bem dobrada. Juntos, o intestino grosso e o delgado de um adulto medem cerca de sete metros de comprimento, quando esticados. O gastroenterologista do Itaigara Memorial  Rodrigo Felipe explica que a obstrução ocorre quando o órgão faz uma dobra sobre si mesmo e bloqueia total ou parcialmente a passagem das fezes.

Um dos sinais de alerta para a condição é não conseguir eliminar fezes e gases. Depois de três dias, as fezes vão se solidificando e fica cada vez mais difícil para que saiam do organismo. As fortes cólicas, vômitos e distensão abdominal também são sintomas recorrentes. 

A obstrução pode ser causada por diversos fatores, sendo o mais comum deles cirurgias ginecológicas, no caso de mulheres, e abdominais anteriores. É o caso do presidente, que desde que sofreu uma facada no intestino grosso durante a campanha eleitoral em 2018, já passou por quatro cirurgias. Em casos como esse, é provável que as crises intestinais continuem acompanhando o paciente ao longo da vida, pois parte do órgão acabou sendo comprometida.

“Quando um procedimento cirúrgico exige a abertura do abdome do paciente, o sangue vai formando aderência, que é quando existe uma linha de fibrose unindo duas paredes do intestino”, detalha o médico Rodrigo Felipe. Se partes do órgão ficam coladas, a passagem das fezes acaba sendo dificultada.

Mas fatores como tumores, doença de Crohn e diverticulites também podem ser causas da obstrução. Além das causas mecânicas, problemas neurológicos e distúrbios hidroeletrolíticos (perda de líquidos) também podem causar o problema, apesar de serem menos comuns. 

No caso de um paciente que preferiu não se identificar, uma cirurgia de urgência para retirada do apêndice, em 2014, acabou levando à uma obstrução. “Eu já estava no hospital por causa de uma apendicite aguda e, depois da cirurgia, comecei a sentir muitas dores na barriga e não conseguia ir ao banheiro”, conta. Foi então que uma tomografia mostrou que o procedimento anterior havia formado cordões de cicatriz, conhecidos como brida, que impedem a passagem das fezes. 

Com urgência, ele teve que passar por outra cirurgia, também muito invasiva, para a desobstrução intestinal. Mas os problemas não pararam por aí, cerca de três anos depois, ele teve sintomas que indicaram uma nova obstrução. “Passei uma noite inteira sentindo muitas dores na barriga e tentando ir ao banheiro, até que no outro dia fui até a emergência do hospital”, lembra. 

Felizmente, dessa vez ele não precisou ser submetido a cirurgia, apesar da internação. O  gastroenterologista Rodrigo Felipe esclarece que, na maioria das vezes, a obstrução não requer procedimento cirúrgico: “O tratamento é inicialmente clínico. O paciente precisa de hidratação, acesso venoso e sonda nasogástrica”. 

Caso cirúrgico

A condição evolui ao ponto de ser preciso uma cirurgia invasiva nas vezes em que o paciente não apresenta melhora do quadro clínico mesmo recebendo hidratação. Em geral, isso ocorre quando não é a primeira vez e quando há sinais de perfurações intestinais, explica o coloproctologista do Itaigara Memorial Paulo Lago.

“Quando o intestino distende tanto que rompe, por exemplo, vai cair fezes dentro da barriga e o paciente evolui para um quadro de infecção generalizada. Outra possibilidade é ver, na tomografia, que essa massa que está fechada não passa nada e nem vai passar. Ou seja, o quadro é definitivo”, completa o médico sobre os casos que necessitam de intervenção cirúrgica. 

Nas situações em que os pacientes apresentam casos seguidos de desobstrução, o quadro não costuma ser de obstrução aguda, mas uma semi oclusão, segundo Paulo Lago. “Não existe nada que previna um novo caso de obstrução, mas sabemos o que pode piorar. Se a pessoa desidratar e tiver uma alimentação mais constipada do que laxante, pode desencadear”, explica o médico. Paulo ressalta ainda que a prática de atividades físicas não interfere na condição do paciente. 

Quando a causa é um tumor

No caso da corretora de imóveis e pedagoga Soraya Rios, o problema não foi a alimentação e nem cirurgias anteriores. A dor aguda na barriga, causada pela obstrução, fizeram com que ela descobrisse um tumor em 2020. “Eu já tinha feito uma colonoscopia que não havia identificado nada. Mas eu tive uma crise de muitas dores, fui para hospital e, com a tomografia, foi descoberta a invaginação intestinal em decorrência do tumor”, conta.  Soraya sofreu risco de vida quando teve uma obstrução intestinal causada por tumor em 2020 (Foto: Arquivo Pessoal) A invaginação é uma condição grave na qual uma parte do intestino desliza para dentro da outra, interrompendo a passagem de sangue para essa porção e causando obstrução. Soraya correu risco de vida e precisou ficar três dias no hospital. Depois da retirada do tumor, foi descoberto que ele era benigno. Mesmo tendo causado uma condição grave, o médico Paulo Lago explica que um tumor só é considerado maligno quando é câncer.

As dores fortes na barriga que são relembradas por pacientes que foram vítimas de obstruções intestinais acontecem quando o intestino tenta empurrar o material fecal para frente e não consegue. “O intestino vai colocando mais força e distende, daí surge a dor. A característica é que ela é como uma cólica que começa fraca e vai aumentando”, detalha o médico Rodrigo Felipe.

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Principais sintomas: Dores abdominais Prisão de ventre Vômitos Soluços

Tratamento: Em geral, os casos não costumam ser muito graves e podem ser tratados clinicamente com hidratação e uso de sonda nasogástrica.  Em quadros graves, pode ser necessária a cirurgia

Causas mais comuns: Aderências (partes do intestino que ficam coladas) Tumores Diverticulites Hérnias Doença de Crohn

Prevenção Apesar de não existir uma forma exata de se prevenir a obstrução intestinal, mastigar corretamente, ter uma alimentação rica em fibras e estar sempre hidratado podem ajudar

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro.