Produtor que atua na Bahia cria nova semente de mamão

O mercado de cultivares movimenta mais de US$ 11,9 bilhões em todo o mundo

  • Foto do(a) author(a) Georgina Maynart
  • Georgina Maynart

Publicado em 17 de novembro de 2019 às 13:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Arquivo CORREIO

Desde que chegou à região de Nova Viçosa, no sul da Bahia, em 1978, a família Martins cultiva mamão. Mas durante mais de 40 anos os agricultores vinham comprando as sementes chinesas. É que apesar de o Brasil ser o segundo maior produtor de mamão do mundo, atrás apenas da Índia, a China é o principal produtor mundial da semente da fruta.

Foi assim até o ano passado, quando o agricultor Ricardo Martins conseguiu desenvolver a própria semente de mamão do tipo formosa. Batizada de mamão mel, a fruta é resultado de quatro anos de pesquisas. Ele aprendeu a fazer cruzamentos com o pai, Rômulo Martins, que era engenheiro agrônomo e sempre quis desenvolver uma alternativa à semente chinesa.

"Fizemos mais de quinze tentativas nos últimos anos até chegar a esta variedade que atende o consumidor final pelo sabor adocicado, agrada o produtor pela produtividade e o comerciante por ser padronizada, ter firmeza durante o transporte e durabilidade na prateleira", afirma o agricultor.

Depois de vários testes em campo, a semente foi registrada no Ministério da Agricultura e já vem sendo cultivada nos estados da Bahia e do Espírito Santo, onde já foram plantados mais de 700 mil pés.

O quilo da semente mel, com cerca de 60 mil unidades, custa em média US$ 2.200, quase 25% a menos do que a importada. O agricultor investiu mais de R$ 1,5 milhão nos últimos quatro anos para desenvolver a semente. O valor inclui os gastos com a concepção do projeto, testes, plantio, monitoramento, mão de obra e implantação dos viveiros. O quilo da fruta está chegando ao mercado por até R$ 0,20 a mais do que o do mamão convencional. No segundo semestre deste ano, o mamão genuinamente baiano começou a ser exportado para paises como Portugal e Espanha. O agricultor Ricardo Martins desenvolveu o mamão mel no sul da Bahia e a fruta já está conquistando mercados. (Foto: divulgação) "Ele tem firmeza, cor, sabor e muita força para dominar o mercado em pouco tempo. É gratificante ver a semente que você plantou dando certo, e o esforço sendo recompensado depois de muita persistência e insistência", conclui o agricultor.

MERCADO

O mercado de sementes envolve cifras milionárias. Estima-se que a comercialização movimente mais de US$ 11,9 bilhões por ano no mundo. No Brasil o segmento gera cerca de R$ 10 bilhões por ano, segundo dados da Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem). O país detem a terceira maior indústria de sementes do planetam depois dos Estados Unidos e da China.

As empresas privadas respondem por cerca de 75% do segmento. A outra fatia do mercado nacional é atendida por empresas públicas como a Embrapa, que mantém programas regulares de melhoramento genético e lançamento de novas cultivares, ou através de parcerias público-privadas.

Indústria de sementes movimenta mais de R$ 10 bilhões  por ano no Brasil. Mais de 20 novas cultivares de soja serão lançadas nos próximos 10 anos.  (Foto: Georgina Maynart) Na Bahia, um dos segmentos mais promissores é o de sementes de soja. Dez empresas produtoras de sementes do grão atuam no estado. Segundo a Associação dos Produtores de Sementes de Soja dos Estados do Matopiba (Aprosem), que tem sede em Luis Eduardo Magalhães, oeste baiano, os produtores dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia produzem juntos cerca de 3 milhões de sacas de sementes por ano. É com elas que são cultivados aproximadamente 3 milhões de hectares de soja no Brasil.

"A produção envolve investimentos em tecnologia, genética e grandes parcerias. O mercado pode crescer ainda mais, e gerar ainda mais empregos, se a área plantada for expandida, ou se os agricultores pararem de usar as sementes pirateadas que causam grandes prejuízos aos produtores de sementes", afirma Celito Missio, presidente da Aprosem.

GIGANTE DO MERCADO VAI LANÇAR MAIS DE 30 VARIEDADES DE SEMENTES NOS PRÓXIMOS 10 ANOS

Uma das gigantes do mercado mundial de sementes, a BASF, anunciou que vai lançar cerca de trinta variedades de sementes de soja, algodão, frutas e hortaliças até 2030 no Brasil.

“Temos confiança no futuro e acreditamos que a agricultura continuará sendo um dos setores mais dinâmicos da economia. Vamos lançar sementes mais resistentes e mais sustentáveis para atender à demanda por alimentos, aos consumidores que buscam produtos mais saudáveis, e aos agricultores que precisam de mais tecnologia integrada para produzir mais com menos”, afirmou Vincent Gros, presidente global da Divisão de Soluções para Agricultura da multinacional alemã. Presidente Global de Soluções para Agricultura da BASF, Vicent Gros, anunciou novos investimentos no Brasil e dezenas de lançamentos até 2030. (Foto: divulgação) Os mercados brasileiro e da América Latina já representam cerca de 40% do faturamento da companhia. A empresa, que investe mais de 900 milhões de euros por ano em pesquisa de sementes, planeja crescer 1% acima do mercado e dobrar o faturamento nos próximos 11 anos.

”A agricultura de tecnologia é a solução para aumentar a produção de alimentos. Quase 70% destes novos projetos serão implementados nos próximos quatro anos”, afirma Rolf Reinecke, vice-presidente de marketing estratégico global da Divisão de Soluções para Agricultura da BASF.

Nos laboratórios, pesquisadores testam novas sementes mais resistentes, que exigem menos água e menos defensivos químicos (Foto: Georgina Maynart) Nos últimos três anos a companhia investiu mais de R$ 60 milhões no Centro Global de Pesquisas e Inovação, sediado no município de Trindade, Goiás. A produção de sementes de soja, milho e algodão corresponde a cerca de 30% do faturamento da companhia. Outros 30% estão ligados a produção de frutas e hortaliças. Apenas de soja e algodão serão lançadas cerca de três novas variedades de sementes por ano.

"O mercado brasileiro tem crescido a taxas relevantes e a tendência é de que continue evoluindo. Todas as sementes são adaptadas para as principais regiões do país, inclusive para a Bahia, e com foco no aumento da produtividade, melhor qualidade da fibra, mais resistência e que permitam ao agricultor usar menos defensivos para controlar os insetos predadores", afirma Hugo Borsari, diretor de sementes da BASF no Brasil.

A empresa deve lançar ainda mais de 28 produtos voltados para proteção de cultivos, além de ferramentas ligadas a plataformas digitais que facilitam a rotina dos agricultores, como pulverizadores inteligentes e novas versões de aplicativos que auxiliam no monitoramento de dados climáticos.

“Serão mais de trinta lançamentos sempre voltados para oferecer melhor qualidade e maior potencial produtivo para as principais regiões produtoras”, pontua José Munhoz Felippe, vice-presidente da Divisão de Soluções para Agricultura da BASF no Brasil. Novas variedades de algodão estão em teste nos laboratórios. Pesquisas duram em média 8 anos antes da semente chegar ao mercado. (Foto: Georgina Maynart)

MELANCIA COM SEMENTE COMESTÍVEL 

Na Fazenda Teorita, em Teixeira de Freitas, sul da Bahia, as máquinas estão em ação. É época de plantio e os agricultores querem aproveitar o período ideal para a semeadura. Até dezembro eles esperam cultivar setenta hectares com as novas sementes da melancia Pingo Doce, uma variedade que vem se destacando no mercado e ganhando o paladar dos consumidores.

A fruta é bem diferente da melancia tradicional já cultivada pela família de agricultores há mais de 20 anos. A começar pelo tamanho. Ela é bem menor, de fácil manuseio, prática de transportar, e pesa no máximo seis quilos, praticamente metade do peso de uma melancia comum.

“Decidimos cultivar porque acreditamos que os consumidores exigem inovação, novidade e praticidade. Esta variedade, além de ser mais fácil de levar do supermercado para casa, ainda é mais doce”, afirma a produtora rural Elissandra Teobaldo. Melancia Pingo Doce tem sementes comestíveis. Nova variedade já é cultivada na Bahia. (Foto: divulgação) A expectativa é a de que a primeira safra da fazenda seja colhida a partir de dezembro. Atualmente o quilo da melancia pingo doce saí do campo por R$ 1. Já nos supermercados brasileiros ela chega a ser vendida por até R$ 4.

“Uma das grandes vantagens que encontramos nela foi a estabilidade do preço. A pingo doce tem preço de venda fixado na roça, não corre risco de grandes variações como a que ocorre com a melancia tradicional, que hoje está sendo cotada entre R$ 0,40 e R$ 0,60”, diz o produtor rural Pedro Takahiko Horita.

Ele adquiriu o pacote com mil sementes por cerca de R$ 800. O valor é três vezes maior do que o pacote da melancia convencional, que custa R$ 270.

“É um produto diferenciado, que exige investimento e tecnologia, mas que tem tido grande aceitação no mercado, principalmente em outros países onde o consumo de melancia vem melhorando”, completa o agricultor que já envia para outros estados cerca de 27 milhões de toneladas de melancia comum por ano.

CIÊNCIA

As primeiras sementes desta melancia chegaram ao mercado em 2017 com a marca Nunhems, depois de 8 anos de pesquisas. De lá para cá não pararam de conquistar novos espaços, e já estão sendo cultivadas por 26 produtores rurais de sete estados.

Todo o processo é controlado e possui sistema de rastreabilidade que garante ao consumidor rastrear a fruta do momento que sai da lavoura até chegar na prateleira.

Outra vantagem é que este tipo de melancia é triploide, ou seja, tem menos sementes do que as convencionais, e os caroços existentes são comestíveis, graças aos cruzamentos feitos pelos pesquisadores durante o desenvolvimento da fruta.

"A variedade possui pouca sementes e quando o consumidor corta a fruta é possível visualizar pontos brancos que, na verdade, são tegumentos, eles são  fontes de fibras e não incomodam na hora do consumo", afirma Paulo Tomaseto, diretor da Nunhems.

O manejo também é mais sustentável.

“Não se trata apenas de um híbrido, mas de um sistema produtivo que visa oferecer um produto de alta qualidade. O manejo é mais sustentável. Exige um sistema de irrigação por gotejamento que reduz o consumo de água e a manutenção de um ambiente atrativo para as abelhas. É a presença expressiva delas que vai garantir a polinização eficiente das plantas” afirma o engenheiro agrônomo Golmar Beppler Neto, gerente da Nunhems na América do Sul.

Gigante do mercado de sementes e produtos para agricultura, a BASF testa milhares de sementes no Centro de Pesquisa e Inovação em Goiás. (Foto: Georgina Maynart) APLICATIVO AJUDA A GERENCIAR ACERVOS DE SEMENTES

A partir desta terça-feira (19/11) os agricultores que mantêm as chamadas “casas de sementes” vão passar a contar com um aplicativo gratuito que ajuda a controlar o estoque. O BioSemeie foi desenvolvido pela Embrapa e promete auxiliar os agricultores no cadastramento do acervo. 

A ferramenta deve servir de auxílio em pesquisas científicas e, principalmente, para os agricultores que guardam exemplares das chamadas sementes crioulas. Consideradas patrimônio genético e cultural da sociedade, elas são preservadas através de várias gerações por agricultores familiares, assentados de reforma agrária, quilombolas ou indígenas. Geralmente são cultivadas por comunidades tradicionais como alternativa às sementes comerciais. Mas até agora, na maioria destas as comunidades, o armazenamento ainda era mantido de forma manual e improvisada, em formulários de papel.

O aplicativo foi criado pelo médico veterinário Raimundo Lôbo, pesquisador da Embrapa Caprinos e Ovinos do Ceará, e também deve ajudar na catalogação deste conhecimento tradicional e facilitar o intercâmbio entre as casas de sementes do país. É que ao se cadastrar no sistema, os administradores podem compartilhar os dados com outros acervos.

A ferramenta permite inserir informações como localização das sementes, quantidade, espécies, cores, variedades e ciclos de produção.

O aplicativo gratuito poderá ser baixado em celulares com sistema operacional Android a partir da loja de aplicativos Google Play. Ele permite o uso em locais onde não há acesso a internet. Neste caso, assim que estiverem em uma área conectada, os usuários devem fazer a conexão com a rede para sincronizar os dados com outros usuários do sistema.

“Se ele (o produtor que baixo o aplicativo) não faz a sincronização, toda a informação fica só no aparelho dele. Se não compartilha, ele não colabora com os demais administradores de casas de sementes, nem com o objetivo maior que é a manutenção da biodiversidade”, afirma o pesquisador. Aplicativo da Embrapa está disponível de graça.