Projeto na Ilha de Maré recupera corais degradados

Idealizador da experiência é um pescador que vive na Ilha de Itaparica

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  • Roberto Midlej

Publicado em 16 de maio de 2022 às 06:00

. Crédito: fotos: divulgação

Estima-se que, desde 2003, a quantidade de corais da da Baía de Todos-os-Santos foi reduzida em cerca de 50%. Esses corais são muito importantes para manter a biodiversidade marinha, já que eles abrigam pelo menos 25% das espécies que vivem no mar. "Os corais garantem a diversidade e a complexidade estrutural. Eles proporcionam uma grande quantidade de abrigos. São buracos e cavernas que permitem abrigo para os mais diversos organismos", explica Igor Cruz, pesquisador de ecossistemas marinhos e professor de Oceanografia Biológica no Instituto de Geociências da Ufba.

E o que fazer para recuperar esses corais, tão importantes para a diversidade? Zé Pescador, um inquieto morador da Ilha de Itaparica, muito preocupado com a questão ambiental, encontrou uma alternativa para restaurar os corais: usar o esqueleto do Coral-sol com o objetivo de produzir sementeiras para cultivo do coral. A sementeira é o recipiente onde se colocam os fragmentos de corais para se recuperarem.

Essa tecnologia deu início ao projeto Corais de Maré. A criação de Zé Pescador está sendo testada na Baía de Todos-os-Santos pela empresa Carbono 14 em parceria com a Braskem, UFBA e o Instituto de Pesca Artesanal de Ilha de Maré (IPA). Numa área da Ilha de Maré, de cerca de um hectare, estão instalados no fundo do mar berçários para potencializar o crescimento dos corais. Os berçários são fixados com plástico e outros materiais recicláveis. Comunidade da Ilha de Maré passa por capacitação O Coral-sol, que está sendo usado no projeto para a restauração dos corais, é considerado uma espécie invasora. Por isso, originalmente, pode até ameaçar a biodiversidade. Mas, com a criação de Zé Pescador - que, como o nome entrega, é pescador -, o Coral-sol passa a contribuir para aumentar a biodiversidade, já que ele passa a ser usado para a confecção das sementeiras."O esqueleto de carbonato de cálcio do Coral-sol é um material natural e riquíssimo. Então, veio a ideia de transformar esse insumo em uma estrutura para recuperar o coral nativo, trazendo o Coral-sol para uma agenda positiva", explica Zé, que começou seu trabalho de forma empírica.Depois de algumas experiências, percebeu que a ideia tinha futuro. Hoje, Zé, além de pescador, é CEO da Carbono 14, uma das instituições que participa do projeto.

Depois das experiências bem-sucedidas, Zé as apresentou a Igor, que validou a descoberta e se juntou ao projeto. De acordo com Igor, a Millepora alcicornis - coral nativo da Ilha de Maré - cresce em média apenas 14 cm por ano, sendo que a sua altura impacta diretamente na complexidade da estrutura e capacidade de abrigar diversas espécies marinhas. Mas o projeto tem como objetivo ajudar a acelerar esse crescimento.

“Os recifes vêm em declínio e percebemos que conservar nem sempre é suficiente. Precisamos investir em tecnologias que acelerem esse processo de recuperação. Se os resultados iniciais desse estudo se confirmarem, podemos utilizar essa técnica na restauração do recife", explica o especialista.

Igor sugeriu um experimento que tem boas chances de permitir o crescimento acelerado da Millepora alcicornis:"Vamos oferecer materiais para que o coral cresça em cima deles. Encontrando essa superfície que criaremos, poderá ganhar altura mais rápido. Já vimos corais crescerem sobre nylon e até sobre caneta plástica", revela Igor.O pesquisador ressalta que, no entanto, a finalidade principal do projeto não é aproveitar o lixo marinho: "Nossa experiência é verificar quais materiais podem permitir a aceleração de crescimento dos corais e aí passaremos a usar esse material. Mas vamos testar materiais plásticos, principalmente os atóxicos, como polietileno, nylon e PET". Há ainda o uso da cerâmica, que Igor já utilizou em outras experiências e também deu certo: em vez de crescer 14 cm por ano, como acontece naturalmente, a Millepora alcicornis cresceu sete centímetros em apenas um mês. Ilha de Maré, na Baía de Todos-os-Santos Benefício Comunitário

Além dos benefícios para o meio ambiente, o projeto Corais de Maré fomenta o desenvolvimento local da Ilha de Maré, defende Magnólia Borges, gerente de Relações Institucionais da Braskem: "A comunidade passou por um processo de capacitação e recebeu treinamento para fabricar sementeiras. Assim, a população vai atuar como agente de meio ambiente e multiplicar os hábitos saudáveis, como o descarte correto de resíduos e reciclagem".

Além disso, 15 jovens da região serão treinados para atuar como agentes ambientais, multiplicando conhecimento e ações socioambientais em suas comunidades.

Alessandra Silva, presidente do Instituto de Pesca Artesanal de Ilha de Maré (IPA), também reconhece benefícios: "O projeto traz o saber comunitário e o acadêmico, que se unem com o intuito de recuperar o ecossistema marinho. Isso terá um impacto significativo na pesca e ajuda a comunidade a ter um novo olhar, de que precisa restaurar, e não apenas esperar a ação da natureza".