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Da Redação
Publicado em 14 de julho de 2019 às 08:40
- Atualizado há 2 anos
O presidente Jair Bolsonaro repetiu uma prática trivial de seus antecessores na relação com o Congresso e liberou um valor recorde em emendas parlamentares às vésperas da votação da reforma da Previdência na Câmara dos Deputados, aprovada na quarta-feira passada com 379 votos a favor. >
Foram R$ 2,7 bilhões empenhados em apenas dez dias, sendo R$ 1,5 bilhão em emendas individuais apresentadas por 550 deputados e ex-deputados federais. A quantia representa uma média diária de R$ 268 milhões em desembolso em julho, mais do que o dobro da média registrada em maio de 2016 - R$ 123 milhões -, quando foi empenhado o maior volume de recursos em um único mês - R$ 3,8 bilhões - desde que a execução das emendas pelo governo passou a ser obrigatória, em 2015.>
Naquela ocasião, tanto a presidente cassada Dilma Rousseff, que estava sendo afastada do cargo pelo Senado, quanto o ex-presidente Michel Temer, que assumia o comando do País, usaram as emendas parlamentares impositivas como instrumento de barganha política, em busca de votos contra e a favor do impeachment. >
As emendas são indicações de gastos no Orçamento da União por deputados e senadores, que costumam privilegiar seus redutos eleitorais nos repasses de dinheiro para obras ou programas. O teto equivale a 1,2% da receita corrente líquida - R$ 13,7 bilhões neste ano -, sendo que metade deve ser destinado à saúde Embora sejam impositivas, é o governo que controla o fluxo de liberação dos recursos.>
Até junho, Bolsonaro havia liberado apenas 13% dos recursos previstos. A baixa execução dos repasses era motivo de queixas recorrentes de deputados do Centrão e da própria base governista Com a liberação recorde no início deste mês, esse porcentual mais do que dobrou, chegando a 32,5%, segundo dados do Siga Brasil, painel de execução de emendas parlamentares controlado pelo Senado.>
Prática é a mesma adotada pelos antecessores em votações cruciais>
Os números mostram que o expediente utilizado por Bolsonaro às vésperas da aprovação da reforma da Previdência na Câmara é o mesmo adotado pelos antecessores em votações cruciais no Congresso. Em 2017, por exemplo, Temer liberou R$ 3,2 bilhões em emendas no mês de dezembro, quando ainda tentava aprovar sua reforma previdenciária. O projeto não avançou em razão da contaminação do debate eleitoral.>
Seis meses antes, Temer já havia usado o poder do controle da liberação de emendas impositivas para conter o momento mais crítico de seu governo, as denúncias de corrupção, obstrução da Justiça e organização criminosa feitas contra ele pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, com base na delação da J&F.>
Foram R$ 2 bilhões liberados em emendas em junho, um mês após a divulgação da conversa gravada entre o ex-presidente e o empresário Joesley Batista, e mais R$ 2,2 bilhões empenhados em julho, quando a primeira denúncia de Janot chegou à Câmara. Em agosto e outubro, a maioria dos deputados rejeitou a abertura de uma investigação contra o emedebista.>
Em 2015, Dilma já havia concentrado a liberação de dinheiro para obras e programas indicados pelos parlamentares logo após o pedido de impeachment chegar à Câmara, em outubro daquele ano. Foram mais de R$ 3 bilhões empenhados em três meses. Apesar disso, o então presidente da Casa, Eduardo Cunha (MDB-RJ), autorizou a abertura do processo após o PT votar contra ele no Conselho de Ética.>
"Todos os presidentes, em maior ou menor grau, utilizaram do expediente das emendas para conseguir apoio. Embora muitos achem isso pouco republicano, não há nada ilegal. A questão é que Bolsonaro se constituiu como o ‘novo’, que condenava isso como prática da velha política. Mas falar é uma coisa, governar é outra. Ele acabou jogando a pedra para o alto sem pensar que o telhado dele é de vidro", afirmou o cientista político Rodrigo Prando.>
Bolsonaro minimizou as críticas que sofreu por causa das emendas alegando que, como elas são impositivas, suas liberações independem da vontade do presidente. "Tudo o que é liberado está no Orçamento. Nada foi inventado. Não tem mala, não tem conversa escondidinha em lugar nenhum. É tudo à luz da legislação", disse um dia após a aprovação da reforma.>
Deputados pró-reforma lideram ranking de verbas>
Deputados aliados do governo Jair Bolsonaro e de partidos do Centrão que votaram a favor da reforma da Previdência lideram o ranking dos parlamentares que mais tiveram emendas liberadas neste ano, segundo dados oficiais do portal Siga Brasil, controlado pelo Senado.>
No topo da lista aparecem os deputados Marco Feliciano (Podemos-SP) e Misael Varella (PSD-MG), com R$ 12,1 milhões em recursos empenhados cada um, seguidos por Alex Manente (Cidadania-SP), com R$ 11,9 milhões. Todos foram favoráveis ao texto-base da reforma. >
Na sequência está Clarissa Garotinho (PROS-RJ), com R$ 11,6 milhões. Ela é um dos cinco parlamentares presentes no ranking dos 30 deputados que mais tiveram emendas liberadas até agora que votaram contra a reforma da Previdência. Os outros quatro são do PT.>
Para André Fufuca (PP-MA), décimo da lista, com R$ 10,7 milhões em emendas, a liberação recorde dos recursos às vésperas da votação e o placar expressivo a favor da reforma são uma coincidência. "No meu ponto de vista essas questões são independentes. Muitos parlamentares dessa nova legislatura foram eleitos com um discurso em defesa da reforma", disse.>
Já Alex Manente atribuiu a quantia liberada de suas emendas à atuação de seus assessores no Ministério da Saúde. "Mérito da minha equipe, que fez o cadastro das emendas assim que o ministério abriu o procedimento, no final de março. Por isso, acredito que tenha saído mais rápido", afirmou.>
Dos R$ 4,5 bilhões em emendas impositivas liberadas pelo governo Bolsonaro até sexta-feira passada, R$ 3 bilhões se referem a emendas individuais dos deputados (66%), R$ 1 bilhão são emendas de bancadas e R$ 479 milhões de senadores. A bancada do Ceará foi a mais beneficiada, com R$ 126,7 milhões, seguida por Santa Catarina (R$ 115,2 milhões) e Maranhão (R$ 105,6 milhões).>
Segundo os dados do portal Siga Brasil, que monitora a execução de emendas, 90% dos gastos indicados pelos parlamentares foram direcionados ao Ministério da Saúde (R$ 4 bilhões), enquanto que o restante ficou distribuído entre outras dez pastas, como Educação, com apenas R$ 59,8 milhões. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.>