Reconhecimento facial se reinventa para incluir máscaras

Uso obrigatório das máscaras por conta da covid foi desafio para tecnologia

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  • Da Redação

Publicado em 25 de setembro de 2021 às 11:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução

Nos filmes de bang bang sobre o velho oeste, vilões prendiam lenços abaixo dos olhos como forma de esconder o rosto das autoridades, dificultando sua identificação. Desde março de 2020, quando todos se viram obrigados a colocar máscaras para evitar a covid-19, o item que salva vidas também se tornou uma dor de cabeça para a tecnologia de reconhecimento facial, principalmente para segurança pública, que investe pesado no sistema. Contudo, graças à inteligência artificial e algoritmos novos, já é possível te reconhecer na rua, mesmo com máscara. Mesmo assim, este aparato ainda gera muita polêmica e não está livre de erros. Com ou sem máscara.

Talvez você não saiba, mas estamos sendo observados constantemente, 24 horas por dia, pelas ruas de Salvador e alguns municípios baianos. O governo do estado investiu mais de R$ 660 milhões em tecnologia que reconhece foragidos da Justiça nas ruas. A tecnologia traça pontos fixos no rosto da pessoa, incluindo nariz, boca e bochecha. O programa registra o rosto e procura no banco de dados nacional que possui mais de 330 mil pessoas com mandado de prisão ou foragidos. Tudo isso antes da pandemia.

Contudo, como fazer esta busca facial com todo mundo usando máscara na rua? O sistema ganhou uma nova inteligência artificial, que já consegue fazer uma identificação analisando apenas as partes que a máscara não cobre. A taxa de acerto ainda não chega a 100%, o que pode gerar um falso positivo. As novas atualizações conseguem chegar a 85% de êxito, mas existem empresas do ramo que anunciaram algoritmos que podem chegar a 96% de exatidão, ainda em fase de testes. O IOS, sistema operacional da Apple, já consegue identificar o usuário e dono do celular, mesmo com máscara.

Segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP) do estado, as câmeras de reconhecimento facial também obtiveram atualização e, entre março de 2020 e setembro de 2021, período da pandemia, foram 37 pessoas com mandados de prisão identificadas e presas. Desta turma, cinco criminosos estavam com máscara. “Nos últimos 45 dias, quatro homens procurados por roubos foram localizados, em Salvador, por reconhecimento facial. A SSP ressalta também que, no início da pandemia, em março de 2020, a ferramenta passou por ajustes, possibilitando o alerta para suspeitos com máscara”, disse a SSP, em nota. A Polícia Militar afirma que 215 foragidos foram presos com a tecnologia, implantada em 2018. A diminuição de identificação facial no último ano, ainda segundo a SSP, não se dá pela dificuldade de reconhecer pessoas com máscara, mas pela baixa circulação nas ruas, por conta da pandemia. 

(Im) Precisão   Esta nova inteligência artificial usa um algoritmo semelhante para identificar alguém com barba ou outro apetrecho como óculos grandes no rosto. Ele rastreia a parte da face descoberta pela máscara. Porém, mesmo com a possibilidade de identificação, a taxa de êxito não é a mesma. O processamento na identificação também demora mais. No início deste ano, pesquisadores da Universidade Ben-Gurion do Negev, em Israel, e da Universidade York, no Canadá, divulgaram um estudo afirmando que identificadores faciais perderam 15% de exatidão em pessoas com máscara. Mais de 500 pessoas foram testadas. “Isso pode levar a muitos erros no reconhecimento correto de indivíduos que conhecemos ou, alternativamente, reconhecer acidentalmente rostos de pessoas desconhecidas como alguém que conhecemos", afirmou a pesquisadora Galia Avidan, no  site inglês EurekAlert!

O fator racial passa a ser um agravante no método tecnológico. Não à toa, diga-se de passagem. Antes mesmo da pandemia, o reconhecimento facial já trazia alguns erros com peles negras. Em 2019,  um estudo da Rede de Observatórios de Segurança apontou que 90,5% dos presos por identificação racial eram negros, em todo Brasil. Outras pesquisas apontam que asiáticos e mulheres negras sofrem mais falso positivo nos reconhecimentos faciais, chegando a 46% de margem de erro em comparação a um homem branco.

“Precisamos questionar quais as garantias que nós temos de que esse banco de mandados tem dados corretos. Um dos maiores riscos da instalação desses sistemas é a forma como ele possibilita combinar problemas específicos dessas tecnologias, como os vieses raciais, com problemas tradicionais do sistema penal brasileiro”, disse o advogado e pesquisador da Ufba, Pedro Diogo, ao Intercept.

Segundo a SSP, o reconhecimento facial não é decisivo para a prisão de uma pessoa, mas o primeiro passo. Ela é monitorada e abordada. Confirmada a identificação, é presa. Não foram fornecidos números de abordagens equivocadas após detecção do sistema facial.

Sorria, você está sendo filmado...

1º passo  As câmeras de reconhecimento facial da polícia  baiana estão conectadas num banco de dados nacional com mais de 330 mil foragidos com mandado de prisão. Câmeras espalhadas pela cidade, viaturas e nas fardas de policiais monitoram pessoas na rua.

2º passo Por meio de inteligência artificial e algoritmos, o reconhecimento facial procura pontos no rosto de cada pessoa e faz um comparativo com o banco de dados. Antes da pandemia, o programa traçava o rosto todo. Com o uso de máscaras, uma atualização já permite identificar apenas com a parte do rosto descoberta.

3º passo Cada rostinho avaliado pelas câmeras é inserido no sistema. Assim que o aplicativo consegue buscar no banco de dados de foragidos a pessoa, emitindo um alerta para a polícia, que passa a fazer um monitoramento da pessoa, incluindo abordagem. Atestado que se trata do foragido, ele é preso e encaminhado à Justiça.