Rede Municipal: 50 das 433 escolas não receberam alunos, diz Smed

Dos 163 mil estudantes, 50% estariam autorizados a voltar, mas apenas 30% compareceram

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  • Marcela Vilar

Publicado em 4 de maio de 2021 às 05:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Nara Gentil/CORREIO

A rede municipal de ensino de Salvador teve um retorno às aulas presenciais abaixo do esperado pela Secretaria Municipal de Educação (Smed). Dos 163 mil alunos, apenas 30% compareceram às escolas nesta segunda-feira, 03. A estimativa é do secretário municipal de Educação de Salvador, Marcelo Oliveira. Ele esperava pelo menos 50%, que é o permitido pelo protocolo sanitário. “Todas as escolas receberam, pelo menos, um aluno”, garantiu, acrescentando em seguida, com o levantamento já atualizado, que das 433 unidades que compõem a rede municipal de ensino, 50 não receberam nenhum estudante – o equivalente a 11,5%.  

A presença abaixo do esperado tem relação com a mobilização dos professores, que decidiram não comparecer às aulas presenciais. A paralisação já havia sido anunciada pela Associação dos Professores Licenciados do Brasil – Secção Bahia (APLB-BA), sindicato que inclui os professores das redes municipal e estadual. 

De acordo com um levantamento do CORREIO, a Gerência Regional de Educação (GRE) que mais recebeu professores no primeiro dia de retorno do ensino presencial foi a de Cajazeiras, onde metade compareceu. São 47 escolas e mais de 17 mil alunos na região - a segunda mais populosa, após o Cabula.  

Em segundo lugar após Cajazeiras, o subúrbio foi a GRE que mais recebeu os professores, com 47%. Lá, são 38 escolas e mais de 14 mil alunos. Já a orla, com 38 escolas e cerca de 10 mil alunos, foi a que menos recebeu docentes: 26% retornou. “Não foi a quantidade que a gente gostaria, mas era o esperado. Mesmo em condições normais, tem esse absenteísmo grande, os alunos não vão nos primeiros dias”, avalia o secretário.   A reportagem visitou duas escolas municipais e ouviu três gestoras. Duas afirmaram que tiveram aulas pela manhã: o Colégio Municipal Guerreira Zeferina e o Cmei Yolanda Pires, na Fazenda Grande do Retiro. As que não receberam alunos foram o Centro Municipal de Educação Infantil (Cmei) Calabar, o Cmei Semente do Amanhã, no IAPI, e o Cmei São Gonçalo, na Federação.  

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Os gestores das unidades afirmaram que nenhuma das escolas das respectivas regionais receberam estudantes. Somente a do Calabar teve a presença de dois professores e de três alunos no turno vespertino. A maior presença foi registrada no Colégio Municipal Guerreira Zeferina, em Periperi. Segundo a diretora, Ana Beatriz Gonzaga, dos 163 matriculados, mais de 50 compareceram.  

O secretário Marcelo Oliveira informou que apenas nove escolas não abriram nesta segunda-feira, 03, porque ainda têm de passar por reformas estruturais. Segundo ele, 30% dos 7.800 professores da rede aderiram à paralisação em Salvador. “Isso mostra que eles não querem voltar às aulas, mas a escola vai continuar aberta recepcionando os alunos”, garante. As séries que tiveram menor adesão foram as da educação infantil.   

No entanto, Oliveira espera que esse impasse seja resolvido nos próximos dias. “As escolas estão preparadas, com toda a equipe a postos, os pais estão começando a frequentar e, em mais dois ou três dias, a gente espera regularizar esses números, com os alunos indo às escolas. Passado esse primeiro momento, os professores vão perceber que a presença deles em sala de aula é imprescindível e a vocação e o compromisso pela educação vai falar mais forte”, acredita. 

Uma reunião com o sindicato e a prefeitura está marcada para a quinta-feira, 06, e na sexta-feira, 07, com o Ministério Público do Trabalho (MPT). “O diálogo está aberto”, reforça o titular da Smed. O secretário afirma ainda que seria impraticável voltar às aulas somente após a aplicação da segunda dose da vacina, porque comprometeria mais um ano letivo. “Eles querem quatro meses sem aula, três para a segunda dose e mais um para adquirir a imunidade, sendo que a imunidade, nas primeiras semanas, é de 76% de eficácia e só mais 6% seriam com a segunda dose”, pontua o secretário.

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Além disso, o secretário diz que o ensino remoto, por si só, não se sustenta, pois o ensino presencial é o mais adequado para o aprendizado do aluno. Os professores que não compareceram hoje [ontem, segunda-feira, 03] poderão sofrer medidas administrativas.

“Como qualquer outro funcionário, eles têm deveres. Podemos, por exemplo, suspender a remuneração, se não houver justificativa médica de que você não está indo trabalhar. Isso está na lei, não é decisão nossa”, ameaça. “O que não pode é o aluno ficar sem aula”, completa Oliveira.   

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Para dar ainda mais segurança à comunidade escolar, o acompanhamento dos índices do novo coronavírus será feito em cada unidade, em parceria com especialistas da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública.

“Vamos identificar bairro a bairro, no raio de influência da escola, que vai nortear, pelas estatísticas, nosso planejamento. Isso vai servir para desmitificar essa ideia que a volta às aulas é um genocídio”, concluiu o secretário. Esse monitoramento começará nesta quarta-feira, 5. 

O presidente da Aplb sindicato, Rui Oliveira, estimou que 95% dos professores não retornaram nesta segunda, 3. “Corri 50 escolas e, das mais de 400, 95% tinha zero alunos. A prefeitura abriu as escolas, mas não teve aula, nem os pais mandaram os alunos. Se o decreto não for revogado até quinta-feira, faremos greve por tempo indeterminado”, afirmou Oliveira.

Mães levam filhos para a escola A balconista Deisiane Souza, 29, levou a filha, Marina Beatriz, de dois anos, para o primeiro dia presencial na escola. “Me sinto segura de trazer ela, apoio o retorno, mas dessa forma, com todos os cuidados que eles estão tendo”, relatou a mãe, que foi buscar a cesta básica no Colégio Municipal Guerreira Zeferina, em Periperi. O grupo 2, ao qual sua filha pertence, não teve aula. O início será na próxima quarta-feira.  

“Por conta da rotatividade, pela entrega das cestas e das atividades, a gente fez esse escalonamento para evitar aglomeração. O grupo 2 veio pela tarde, o grupo 3 pela manhã, e, amanhã [hoje, dia 04], será o grupo 4 pela manhã e o grupo 5 pela tarde”, esclareceu a diretora do colégio, Ana Beatriz Gonzaga.

São 10 salas, com 163 matriculados, mas nem todos virão no mesmo dia - só 50 por turno. Cada sala comporta cinco alunos, um em cada carteira. Ao todo, são 11 professores e 17 funcionários. A escola atende educação infantil, de 2 a 5 anos.  

A manicure Letícia Lima, 26, mãe de Davi Roberth, de 3 anos, levou o pequeno para conhecer o colégio, mas não sabe se retornará na quarta-feira para as aulas. “Ainda estou insegura. Já tem mais de uma semana que a taxa de ocupação está em 70%, sem baixar, então acho que ainda não está bom para voltar. Vou esperar mais um mês e ir conversando com ele também, explicando os protocolos”, revelou Letícia.  

Já Iago, filho de Ivana Nascimento, 28, irá começar as aulas nesta quinta-feira, 6. “Os professores têm as estratégias de como trabalhar com as crianças e acredito que estão com todos os equipamentos corretos, com o grupo de higienização coligado, e nós, pais, vamos reforçando em casa”, opinou a técnica de enfermagem. “É uma forma dele aprender a lidar com outras crianças, em sociedade”, completa. 

Infectologista explica eficácia da 2ª dose O infectologista Antônio Bandeira, coordenador da área de controle de infecção hospitalar do Hospital Aeroporto, explica que a vacina da Oxford/Astrazeneca foi feita para ser aplicada em duas doses, como argumentam  os professores para a retomada das aulas presenciais. “O estudo foi feito e a vacina foi testada e aprovada dessa forma, com a garantia da eficácia só após a segunda dose. As pessoas têm que usar as duas doses para cumprir o calendário vacinal”, explica o especialista.

Bandeira disse, no entanto, que existe imunidade elevada já com a primeira dose. “Apesar de ter eficácia, a vacina é feita para duas doses, e, se você trabalha só com uma dose, de certe maneira, não está cumprindo com o ritual dos estudos e ensaios clínicos aprovados pelas agências reguladoras”, acrescenta o infectologista.

Ele acredita que a vacina não deveria ser um impasse para a volta às aulas. “Essa discussão de que só podem voltar se tiverem as duas doses é falácia, porque, onde tem protocolo, você garante que as pessoas vão estar seguras e sem risco de contaminação”, opina.

O médico aconselha o uso das máscaras respiratórias, como a N-95, e a constante higienização das mãos. Além disso, pondera que toda vacina tem um percentual que as pessoas podem contrair o vírus. “Mesmo vacinadas, as pessoas não têm total garantia da imunidade”, conclui. 

*Com a orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro