Tartarugas não depositavam ovos na Barra há pelo menos 20 anos

A água limpa, fruto do isolamento social, é um dos fatores que pode ter atraído o animal

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  • Bruno Wendel

Publicado em 18 de junho de 2020 às 15:44

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Marina Silva/CORREIO

Quem viu uma tartaruga marinha pondo ovos na praia da Barra na noite de terça-feira (16), associou imediatamente o fato ao reflexo do isolamento social. De certa forma, isso pode até ter contribuído, afinal estes animais procuram locais praticamente desertos para depositar os ovos. Mas, o que as pessoas não imaginam é que o feito não é realizado há pelos 20 anos naquele local. Tartarugas nadam nas águas da Barra, mas, até então, não faziam desova porque a praia não tem característica física para tal fenômeno.  

É o que explica o diretor do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba), professor Francisco Kelmo. “As características físicas da praia da Barra não as prediletas das tartarugas, principalmente pelo declive. O ovo tem que ser colocado num local seco. Quando a maré enche, encobre toda a faixa estreita de areia e provavelmente o processo reprodutivo seria prejudicado”, disse Kelmo. Na manhã desta quinta-feira (18), o Projeto Tamar/Fundação Pró-Tamar removeu ovos do local. (veja abaixo). 

Segundo o Projeto Tamar/Fundação Pró-Tamar, o animal é da espécie oliva (Lepidochelys olivácea) e tem o hábito de depositar os ovos entre os meses de setembro e março. Esporadicamente, a espécie faz a desova fora do período habitual. A escolha pela Praia da Barra pode ter sido por vários motivos, entre eles o fato de água estar limpa devido ao isolamento social.  Tartaruuga da espécie oliva deixou 80 ovos na areia da Praia da Barra (Foto: Marina Silva/CORREIO) De acordo com o estudo da Faculdade de Biologia da Ufba, durante esse período que as pessoas estão proibidas de frequentar as praias, a qualidade da água no trecho entre o Cristo e o Porto da Barra passou de boa para excelente. Essas praias são famosas e ficam lotadas todos os dias da semana, principalmente no verão.

O estudo levou em consideração o PH, que é o indicador de acidez. Quando a água do mar é ácida, é prejudicial para a população. Então, o PH no mês de dezembro foi de 8.1. Agora, no início deste mês, está em 8.4, indicando que houve uma redução da acidez. Outra base para o estudo foi a quantidade de coliformes. A contagem do mês de dezembro foi uma média de 206 colônias de uma bactéria. Nesse mês foram seis colônias. “Se a água estivesse poluída, ela (tartaruga) sequer chegaria à praia. Isso porque havia dentro da água muitos poluentes. Qualquer elemento que contamine o meio ambiente, os animais captam da mesma forma que uma pessoa sente um mau cheiro, um gosto ruim, e se afastam. É um instinto natural. A qualidade da Praia da Barra hoje é excelente”, disse Kelmo.Mas, ele podera: “Não dá para afirmar que o isolamento social é responsável pela vinda da tartaruga à Praia da Barra, até porque, como já disse, não é o local apropriado para a desova. Outros fatores também contribuíram para isso, como o fato de ter sido um animal jovem, sem experiência, que pode ter sido atraído pela luminosidade artificial da praia”, declarou Kelmo.  "A partir de agora, vamos monitorar. Se aparecerem outras, o que esperamos que aconteça, poderemos estudar a relação direta com o isolamento social. Até então, são hipóteses", concluiu o professor. 

Ovos Na manhã desta quinta-feira (18), os 80 ovos depoistados pela tartaruga foram removidos do local. O Tamar informou que, como o ninho estava depositado em uma área considerada de risco para o desenvolvimento dos filhotes, devido à iluminação artificial e ao trânsito de pessoas, os ovos foram transferidos para um cercado de incubação localizado na base de Arembepe, onde serão monitorados até o nascimento das tartaruguinhas. A remoção dos ovos contou com a participação do Grupo Especial de Proteção Ambiental (Gepa) da Guarda Civil Municipal (GCM).  

Os filhotes devem romper os ovos e nascer após um período que varia entre 45 e 60 dias, dependendo do calor do sol.“Se tudo correr bem, 70 desses 80 ovos vão chocar e teremos 70 filhotinhos”, vibrou a bióloga do Tamar, Natália Berchieri. Ovos foram transferidos para área de incubação na base de Arembepe, no Litoral Norte (Foto: Marina Silva/CORREIO) A Tartaruga-oliva está distribuída nos mares tropicais e subtropicais, oceanos Pacífico e Índico. No Atlântico, ocorrem na América do Sul e a na costa oeste da África. Seu habitat é principalmente em águas rasas, mas também em mar aberto. A área dela de desova está localizada desde o sul de Alagoas, passado por Sergipe, até o litoral norte da Bahia. O número de ninhos no Brasil é de aproximadamente 8,7 mil por temporada.

A tartaruga chega a pesar 42 quilos e tamanho de 72 centímetros de comprimento curvilíneo de carapaça. Sobre o casco (carapaça) são seis ou mais pares de placas laterais, com coloração cinzenta (juvenis) e verde-cinzento-escuro (adultos). Tem cabeça pequena, com mandíbulas poderosas que ajudam na alimentação. Sobre as nadadeiras: dianteiras e traseiras com uma ou duas unhas visíveis, podendo ocorrer uma garra extra nas nadadeiras anteriores. É uma espécie carnívora! Isso mesmo! Alimenta-se de salpas, peixes, moluscos, crustáceos, briozoários, tunicados, águas-vivas, ovos de peixes e eventualmente algas. 

Reabilitação Uma segunda tartaruga foi encontrada encalhada na praia do Corsário, na manhã desta quarta-feira (17). Ela foi localizada por banhistas, que chamaram o Salvamar. Equipes do projeto Tamar também estiveram no local e resgataram o animal, que foi levado para a sede da entidade em Praia do Forte.

A tartaruga está em reabilitação e passa por exames. Ainda não há previsão de quanto ela será devolvida ao mar, porque depende de avaliação médica. O bicho tem aproximadamente cinco anos, idade onde ainda não é possível saber se é macho ou fêmea. Em caso de ocorrências ambientais, é possível acionar o Gepa, através do telefone (71) 3202-5312.