Terceirizada da Semge registra queixa contra colega de trabalho por intolerância religiosa

Expectativa da funcionária pública é que o acusado seja demitido e que a justiça seja feita

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  • Da Redação

Publicado em 25 de novembro de 2021 às 21:03

- Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução

Depois de ter sido constrangida com ataques de cunho racista e de intolerância religiosa por parte de um dos seus chefes, Silvana da Paixão, 41 anos, terceirizada na Secretaria de Gestão Municipal de Salvador (Semge), iniciada no candomblé há pouco mais de dois meses, registrou um boletim de ocorrência nesta quinta-feira (25), na 1° Delegacia (Barris). A expectativa da funcionária pública é que o acusado seja demitido e que a justiça seja feita.    A mãe de santo de Silvana, Rosângela de Oyá, explica que já ouviu vários relatos de pessoas do candomblé que já sofreram preconceito no ambiente de trabalho e que, por medo de perderem o emprego, não fizeram a denúncia. “Não quero que minha filha seja mais uma dessas pessoas. Quero que a justiça seja feita, que o réu pague pelo que ele fez, tendo em vista que minha filha, recém-iniciada, foi exposta a tanto constrangimento a ponto de ter crise de depressão”, declarou a religiosa.    Silvana começou a sofrer preconceito depois que passou a usar roupas brancas no trabalho. A funcionária conta que a Semge ainda não a chamou para conversar. A Associação Brasileira de Preservação da Cultura Afro-Ameríndia (AFA),  ciente do ocorrido, se juntou à causa de Silvana e enviou um ofício para a pasta sobre a situação (veja abaixo o posicionamento da secretaria).

O presidente da AFA, Leonel Monteiro, explica que o inquérito policial já foi instaurado e que a pessoa que cometeu racismo religioso contra Silvana vai ser intimada. “Nós ainda vamos acionar o Ministério Público Estadual e o Ministério Público do Trabalho também porque o caso envolve racismo religioso, intolerância religiosa e assédio moral dentro do espaço de trabalho, então, a gente também vai recorrer a outros órgãos para que um complemente o outro nesse embate”, declarou o presidente. 

Silvana, por sua vez, explica que já tem dois dias que não encontra o funcionário que a atacou, mas que não sabe o que aconteceu. O acusado seria premiado como funcionário destaque do mês, mas a premiação aconteceu ontem (24) e outra pessoa recebeu o prêmio. “Não sei informar o porquê, ninguém fala nada. A premiação dele foi adiada. Teve servidor destaque, mas não foi ele, indicaram outra pessoa, mas o motivo não foi revelado, mas eu creio que seja por causa desse processo que está repercutindo na imprensa”, contou Silvana. 

A funcionária explica que ficou extremamente abalada após o ocorrido e que teve medo de perder o emprego e, por isso, não contou para ninguém inicialmente. “Eu caí em depressão mesmo, fiquei com medo de falar com minha mãe de santo, com medo de perder meu trabalho. Minha mãe, por me conhecer, sabia que eu era uma pessoa extrovertida e que comecei a chorar e andar pelos cantos, eu não dormia de noite e passei até a tomar medicamento para dormir. Eu choro o tempo todo e não tenho amizade com as pessoas da empresa como antes”, relatou. 

Silvana conta que, no horário de almoço, quando ela comia e bebia em prato e copo de alumínio, como sua Mãe de Santo orientou nos primeiros meses como filha de Santo, seu chefe dizia que era parecia um bicho comendo. O presidente da AFA afirma que essa intolerância não atinge somente a funcionária da Semge, mas toda a comunidade adepta ao candomblé. “Quando ele fala, por exemplo, que ela estava comendo igual a um bicho no seu período de resguardo, quer dizer então que todos nós que passamos por esse período e comemos da mesma forma somos bichos também?” questiona. 

Silvana ainda explica que passou a ser excluída por outros funcionários. “Aqui sempre tem café da manhã, almoço, janta, em que todo mundo se reúne, mas ninguém me chama mais. Antigamente eu participava de qualquer brincadeirinha que tivesse no setor, hoje eles fazem as coisas e não me convidam. Quando eu venho saber, já aconteceu”, conta Silvana. “Esse funcionário público não pode ficar na secretaria sendo intolerante. Ele não tem perfil de servidor porque um servidor nunca faria isso com uma pessoa”, concluiu a funcionária. 

Providências da Semge Em nota, a Semge informou que os fatos já estão sendo apurados, com a colaboração da Secretaria Municipal da Reparação (Semur), para adoção de medidas cabíveis. “A pasta repudia atos de discriminação de qualquer natureza e vai agir no sentido de combater esse tipo de situação, garantindo o respeito no ambiente de trabalho e na prestação de serviços à população”, diz a nota.

A Polícia Civil, por sua vez, informou que deve iniciar a investigação do caso nos próximos dias. “Uma mulher registrou uma ocorrência na 1ª Delegacia, na manhã desta quinta-feira (25), relatando ter sido vítima de racismo religioso em seu local de trabalho. A vítima relatou os assédios que vem sofrendo de um funcionário da instituição. A unidade deve iniciar a apuração do caso”, escreveu a corporação. 

Na última terça (23), o prefeito Bruno Reis (DEM) garantiu que a situação de intolerância religiosa já está sendo apurada e, caso a ofensa seja confirmada, o servidor irá “responder pelas consequências dos seus atos”. De acordo com o prefeito, o servidor acusado das agressões é concursado e já foi identificado. “Conversei com o secretário Thiago Dantas. Foi feita uma denúncia e está sendo apurada. Nós não admitimos. A Prefeitura não aceita, não admite e, se precisarmos punir, vamos fazer de forma exemplar”, afirmou o gestor. 

*Com supervisão da subchefe de reportagem Monique Lôbo