Uma janela temporal: as vistas para as primazias da Cidade da Bahia

Edição especial dos 472 anos de Salvador destaca o pioneirismo da cidade; leia texto de apresentação

Publicado em 29 de março de 2021 às 05:01

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Sora Maia/CORREIO

A máscara que oculta o sorriso não impede as janelas da alma soteropolitana de enxergarem um futuro melhor. Um porvir sem o vírus, que apesar de mandar nos prender em casa, não impede sonhos libertos.

Das sacadas dos sobrados da velha São Salvador, há lembranças de donzelas do tempo em que se curtia o Carnaval como se não houvesse amanhã. Ontem mesmo uma delas gritava da janela do apartamento: “eu falei, faraó!” Já faz quanto tempo?

Salvador completa hoje 472 anos. Não é momento para comemorar, até porque há mais de 1 ano está quase tudo suspenso, há muita dor e sofrimento – é por isso que o sorriso é por debaixo do pano.

Mas essa janela temporal, que impôs perdas e interditou até o mencionado Carnaval, pode ser uma janela de oportunidade para refletir sobre outros tempos. Os nossos tempos desde o primeiro momento, para que quando pudermos seguir adiante, lembremos de onde viemos, onde paramos, para onde precisaremos ir.

Eis o segredo revelado deste especial de Aniversário de Salvador, que terá como missão, nesse salão fechado e com cheiro de guardado, abrir janelas com vistas para as primazias da Cidade da Bahia. 

Várias abas para abrir no Windows e acessar os pioneirismos, as vanguardas da capital dos baianos. Em cada janelinha uma moldurinha própria, com os contornos pessoais de cada profissional do jornal e de nossos parceiros: da reportagem e da fotografia; da arte e da diagramação; da produção, redação, edição, impressão, distribuição, um grande trabalho em conjunto. Ninguém solta a mão!

A você que está esperando na janela, pra falar do seu amor pra ela, primeira capital do Brasil, sinto informar que vamos tomar a dianteira para mostrar como foi pioneira em tudo quanto é coisa que se quis e propôs.

Foi em Salvador que nasceu o trio, condutor de eletricidade da maior festa popular do mundo. Relembramos como ele surgiu, e também como foi forjada sua trilha mais apropriada, o axé, advento da escola de magia do mestre Luiz Caldas.

Revelamos ainda as missões iniciais de caridade da primeira santa brasileira. Foi sobre as palafitas dos Alagados que Irmã Dulce entrou pela porta que deu no altar da santidade.

A religiosidade, aliás, é uma marca indelével dessa terra, que nasceu numa sexta-feira (já chegou ‘sextando’), quando convém se vestir branco: relembramos os porquês dessa tradição que representa a união de três religiões: candomblé, catolicismo e islamismo.

Foi no Bonfim a primeira missa oficial? Não! Foi cá no início do cortejo, na Conceição, onde foi erguida a primeira igreja oficial de Salvador, feita de taipa e coberta de palha, a mando de Tomé de Souza. Depois virou alvenaria, e enfim pedra de lioz, montada por mais de um século, como um Lego, ao custo do que hoje daria R$ 1 bilhão.

Ali pertinho, bastando subir a ladeira, passamos pra contar como surgiu o primeiro terreiro de nação Ketu, e também o Xirê, essa roda ritual dos orixás – espécie de ONU das religiões de matriz africana –, que traz os deuses de África para dançar juntos por aqui, entre os mortais, resultando em axés e baianidades nagôs.

As conexões entre as raízes que mantêm essa cidade de pé ainda se espraiam: saindo da Barroquinha, subimos a Avenida Sete, até o Relógio de São Pedro, que contou muito tempo até encontrar um tupinambá, numa antiga urna mortuária, desenterrada no ano passado. Nos carnavais pré-coloniais se cantava em tupi? É o que tentamos descobrir.

Vamos mostrar também a história da Moça do Itamaraty, Maria José de Castro Rebello Mendes, soteropolitana que foi a primeira mulher diplomata do país. E saindo da diplomacia para a rivalidade, relembramos os bastidores do surgimento do Vitória, primeiro clube fundado apenas por brasileiros, e a trajetória do Bahia para se tornar, num 29 de março, o primeiro campeão nacional de futebol.

Dona do título de primeira faculdade do Brasil (originalmente Escola de Cirurgia da Bahia), a Fameb, no Terreiro de Jesus, também é um trunfo histórico de Salvador. Representa o cuidado tão evidenciado em Santa Dulce, mas também a resistência que nos outorgou a Independência, ou obrigou os movimentos sociais (especialmente os LGBTQIA+) a não mais se curvar diante de preconceitos e opressões. A faculdade, mesmo com aval para tal, não fechou as portas durante a pandemia, cuidou e resistiu.

Portanto, quando quer – e quase sempre é assim que é –, Salvador sabe ser suprema. Somos uma cidade que entende de viver, e de criar sentido para isso. A gente é cheio de arte, craques na criatividade, como provam os mais de 200 registros de patentes de invenção em 2 anos. Trazemos, nessa edição especial, dez bons exemplos, incluindo o respirador pulmonar com chancela da Nasa (sim, ela veio!), e a primeira “robôa” travesti da América Latina. 

A água azul de Amaralina deve ter algum elixir, mas bem pode ser uma propriedade secreta da Baía de Todos os Santos, que dizem ser a segunda maior baía do planeta. “Tenho certeza que um dia será a primeira”, torcia o saudoso dos Dois Mundos. Com o perdão da alongada apresentação, pedimos que abra o seu coração, ou a gente arromba a janela. Boa leitura!

*O Aniversário de Salvador é uma realização do jornal Correio com o patrocínio da Wilson Sons, Jotagê e CF Refrigeração e o apoio da Sotero, Salvador Shopping, Salvador Norte Shopping, JVF e AJL.