Vídeo de corpo de miliciano foi gravado em local privado

Imagens foram divulgadas nas redes sociais pelo senador Flávio Bolsonaro

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  • Mario Bitencourt

Publicado em 19 de fevereiro de 2020 às 09:39

- Atualizado há um ano

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O vídeo divulgado nas redes sociais pelo senador Flávio Bolsonaro, que mostra o corpo do miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega em uma maca de necropsia, foi gravado em um local particular não identificado, como sugerem as secretarias de Segurança Pública da Bahia e do Rio de Janeiro.

Ambas negaram ao CORREIO nesta terça-feira (18) que o vídeo tenha sido gravado nas dependências de algum Departamento de Polícia Técnica (DPT) da Bahia ou do Rio. O vídeo divulgado por Flávio Bolsonaro mostra o corpo do miliciano nu e de costas, com a identificação numa pequena placa grudada ao cadáver.

O corpo de Nóbrega está impedido de ser enterrado por determinação judicial e, nessa terça-feira (18), a Justiça baiana determinou nova perícia. Informações da Agência Estado dão conta que o cadáver estava em um laboratório particular de embalsamento em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, contudo não se tem a confirmação de que o vídeo foi gravado nesse local.

“Perícia da Bahia (governo PT), diz não ser possível afirmar se Adriano foi torturado. Foram 7 costelas quebradas, coronhada na cabeça, queimadura com ferro quente no peito, dois tiros a queima-roupa (um na garganta de baixo p/cima e outro no tórax, que perfurou coração e pulmões”, escreveu Flávio em uma rede social, nesta terça.

Ontem, mais cedo, em entrevista coletiva, o presidente Jair Bolsonaro declarou que “pelo que estou sabendo, o Ministério Público Federal da Bahia, não tenho certeza — [que] fique bem claro: não tenho certeza — vai cobrar uma perícia independente hoje. Primeiro passo para você começar a desvendar as circunstâncias em que ele morreu e por que. Poderia interessar a alguém a queima de arquivo. O que ele teria para falar? Contra mim é que não era nada. Se fosse contra mim tenho certeza que os cuidados seriam outros para preservá-lo vivo”.

Consultado sobre a suposta perícia independente, tanto a Procuradoria Geral da República (PGR) quanto o Ministério Público Federal (MPF) da Bahia informaram nesta terça ao CORREIO que não houve nenhum procedimento instaurado sobre o assunto.

Pouco tempo depois, o Ministério Público Estadual (MP-BA) solicitou à Justiça de Esplanada determinação judicial ao Departamento de Perícia Técnica do Instituto Médico-Legal do Rio de Janeiro (DPT-RJ) para que o órgão mantenha “intacto” o corpo do miliciano  Adriano Magalhães da Nóbrega até novo exame pericial complementar.

Em reação ao vídeo divulgado por Flávio Bolsonaro, o secretário da Segurança Pública da Bahia, Maurício Barbosa, rechaçou as acusações: “a Secretaria da Segurança Pública da Bahia vai continuar com aquilo que nós começamos a fazer desde antes mesmo do dia do fato, que é o auxílio que nós prestamos à operação do Rio de Janeiro. [Vamos], agir com a máxima transparência, com a máxima intenção de ajudar instituições como o Ministério Público e a Justiça, e não trazer confusões e nem teorias políticas a respeito de um trabalho eminentemente policial”.

Barbosa destacou que o vídeo divulgado nas redes não é reconhecido como autêntico pela perícia baiana ou pela perícia do Rio de Janeiro.

“As imagens não foram feitas nas instalações oficiais do instituto médico legal. Então nós temos a clara convicção de que isso é para trazer algum tipo de dúvida, de questionamento, a um trabalho que ainda não foi concluído”, disse.

“Eu reforço aqui o posicionamento das nossas instituições, a transparência com que estamos agindo e não vamos deixar que, por uma questão política, ou por qualquer outro motivo, qualquer outro interesse que esteja por trás disso tudo, venham trazer qualquer tipo de questionamento prévio, sem antes termos a conclusão da nossa investigação, das nossas perícias, e que o Ministério Público e a Justiça se posicionem quanto a isso”.

O perito médico legista e diretor do Instituto Médico Legal Nina Rodrigues, Mário Câmara, disse que foi surpreendido com as imagens e afirmou que não é possível analisar um vídeo que não foi autenticado pela perícia.

“Não sabemos se foi adulterado, onde foi feito, não sabemos se o corpo é realmente do senhor Adriano. Então não faremos comentários sobre o vídeo. O que eu posso dizer é reiterar que o laudo pericial foi feito por um perito médico legal especialista na área, com formação e balística, muito experiente em casos como este".

Segundo Mário Câmara, o caso de Adriano não é tecnicamente difícil: “O laudo pericial descreve exatamente os orifícios de entrada, os orifícios de saída, a trajetória dos projéteis, a angulação, não há nenhum sinal de tortura no corpo, não há sinal, no corpo, de execução”.

Vice-presidente do Sindmoba (representa médicos legistas e odontolegistas da Bahia), Murilo Safira disse que imagens em vídeo não fazem parte do protocolo oficial de necropsias, apenas imagens em foto. “Geralmente, quem faz essas imagens e acaba vazando para o público são funcionários terceirizados que atuam nos DPTs. Funcionários do Estado que fazem isso estão sujeitos a punições que a depende do caso podem resultar em exoneração”, disse.