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Da Redação
Publicado em 13 de novembro de 2012 às 07:33
Alexandro [email protected] abrir um lava a jato basta ter uma lavadora de alta pressão, um aspirador, sabão, silicone, diesel, querosene e água, muita água. A facilidade para oferecer o serviço, que em Salvador custa, em média, R$ 15, somada à falta de fiscalização, faz com que cerca de 850 lava a jato irregulares estejam em funcionamento na cidade, de acordo com a Empresa Baiana de Água e Saneamento (Embasa).Na Avenida Magalhães Neto, Pituba, o lava a jato da localidade conhecida como Favelinha funciona há anos sem licença e sem qualquer ação efetiva de órgãos fiscalizadores“O consumo mensal é de 51 milhões de litros de água. Seria suficiente para abastecer 5,1 mil famílias de cinco pessoas”, afirma o superintendente de abastecimento de água em Salvador e Região Metropolitana, José Moreira.“Estamos falando de água tratada dentro das exigências da Organização Mundial de Saúde (OMS), própria para consumo humano, que está sendo gasta sem preocupação. E eles não pagam. É gato”, completa Moreira.A Embasa mediu o desperdício através de uma pesquisa em lava a jato regulares - atualmente são 192 licenciados pela prefeitura, segundo a Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo do Município (Sucom). O cálculo foi feito com base no gasto e na média de tempo do serviço prestado pelos estabelecimentos com funcionamento autorizado. Segundo Moreira, a Embasa deixa de arrecadar R$ 380 mil por mês. “É um valor que poderia ser investido em serviços e que pode ser maior ainda. Não temos como saber de forma precisa quantos carros esses 850 lava a jato atendem por dia. Eles não pagam, então gastam à vontade”, diz.Nem mesmo quem trabalha no ramo sabe dimensionar. “São muitos carros por dia, muitos mesmo, final de semana, então... A gente nem faz conta. Pra ter uma noção, final de semana são mais de 50 pais de família que trabalham aqui”, conta o lavador de carros Pedro Raimundo Nunes Viana, 55 anos, que há 10 mantém um lava a jato no Conjunto Paralela Park, na Paralela. Na Magalhães Neto, resíduos químicos são jogados no meio ambienteGatosSegundo o superintendente da Embasa, o local já foi alvo de vistorias, com desligamento do fornecimento clandestino de água, mas, como em outros pontos, a atividade foi retomada.“Arrancamos um gato agora e retorna ou é reaberto em outro local. A Embasa não tem poder de polícia. Hoje em dia é ainda mais difícil coibir, as equipes são ameaçadas em alguns locais”, afirma.Assim como os lavadores do Paralela Park, Carlos José Neves Pereira, 35 anos, dono de um dos três lava a jato da Rua Sérgio de Carvalho, no Parque São Braz, na Federação, garante que quer se regularizar. “Nós queremos que regularize, se for preciso pagamos a conta de água, o que não pode é deixar pai de família desempregado, sem trabalho. Só comigo, em final de semana, são sete pessoas que trabalham”, afirma o lavador. Entretanto, para ter o serviço licenciado, o lava a jato precisa funcionar num espaço com estacionamento para os carros a serem lavados e estrutura adequada para o descarte de resíduos (ler boxe). Há ainda casos como o da Travessa 2 de Julho, no Alto de Coutos. Ali, na casa de Dina Antonia da Silva, 60, falta água “volta e meia”. “Às vezes demora mais de um dia, mas na maioria dos dias a água acaba de manhã e só volta de noite”, conta ela. Entretanto, na entrada da rua, um lava a jato irregular funciona livremente, cobrando R$ 10 por veículo. Ali, ninguém quis conversar com o CORREIO. Meio AmbientePara a professora Vânia Palmeira Campos, do Instituto de Química da Ufba, a questão dos resíduos é tão relevante quanto o desperdício de água.“É uma atividade potencialmente poluidora. Estados como São Paulo, Espírito Santo e Pernambuco já controlam isso através de normas específicas e até de Termos de Ajustamento de Conduta com o Ministério Público”, diz. Ela explica que os principais danos ambientais estão relacionados ao descarte indevido dos materiais usados na limpeza, tanto de resíduos sólidos, como as estopas, que causam obstrução nas redes de tratamento, como de produtos químicos usados na limpeza.“Os poluidores dessa atividade são compostos insolúveis em água, como derivados do petróleo, graxas, gasolina, compostos tóxicos e, às vezes, cancerígenos”, lista Vânia. Vânia Campos lembra também dos detergentes usados na lavagem e substâncias com cheiro que são jateadas, se espalhando na atmosfera e podendo contaminar as pessoas através das vias respiratórias. Por fim, a especialista fala ainda de mais dois problemas: o barulho das máquinas, que incomoda a vizinhança, e as pesquisas que apontam o risco de que, daqui a 12 anos, o mundo viva uma escassez crônica de água. Pode não ter para lavar, nem para beber.Atividade está regulamentada no município desde maio deste anoEm maio deste ano, a prefeitura municipal sancionou uma lei que regulamenta a atividade de lava a jato. A legislação determina atenção aos impactos no trânsito, vizinhança e meio ambiente. Entre as principais exigências está a necessidade de um espaço para os veículos à espera de atendimento no interior do estabelecimento, sem prejudicar o trânsito local. Além disso, o lava a jato deve estar a pelo menos 200 metros de túneis, pontes e viadutos. É necessária a aprovação da Transalvador.Para que tenha permissão para funcionar, é preciso que o piso possua revestimento impermeável e resistente a derivados de petróleo e álcool, com sistema de escoamento independente da drenagem de águas pluviais. A lei já está em vigor, mas estabelece prazo de 12 meses para adequação dos estabelecimentos.Todos são obrigados a apresentar um plano com projeto, cronograma, definição das ações necessárias e prazos para execução, que não podem ultrapassar 18 meses. A lei prevê multa pelo descumprimento das normas que pode variar de R$ 1.500 a R$ 50 mil.Atualmente, a fiscalização da atividade fica por conta da Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo do Município (Sucom), quando em espaços privados, e da Secretária de Serviços Públicos e Prevenção à Violência (Sesp), quando a atividade acontece em áreas públicas - os ilegais. “Jamais vamos regulamentar a atividade na rua.Tem todo o transtorno com a água, com a segurança das pessoas que passam pelos locais, tudo exige que haja um espaço adequado para o funcionamento”, diz Paulo Viana, coordenador de licenciamento e fiscalização da Sesp. Segundo ele, o órgão age de acordo com denúncias da população e há apreensão dos equipamentos em caso de insistência de funcionamento.É possível lavar o veículo com balde ou sem utilizar águaMesmo quem não usa os serviços de um lava a jato irregular tem que estar muito atento ao desperdício de água. “Precisamos nos educar com relação ao uso controlado da nossa água, na tentativa de reverter o dramático cenário de escassez crônica que está por vir no futuro”, alerta a especialista em Química Analítica e Química Ambiental Vânia Palmeira Campos.A dica é deixar de lado as mangueiras e usar baldes na hora da lavagem. Uma mangueira aberta por 15 minutos gasta em torno de 370 litros de água, ao passo que é possível economizar 330 litros utilizando quatro baldes de 10 litros (dois para ensaboar e dois para enxaguar). Outra possibilidade é usar produtos químicos feitos à base de cera vegetal, que garantem a limpeza a seco dos veículos, através do processo de cristalização e fragmentação da sujeira.>