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Retadas: CORREIO homenageia baianas que se destacam nas suas vidas e lutas

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  • Naiana Ribeiro

Publicado em 8 de março de 2020 às 14:14

 - Atualizado há um ano

 Hoje, Dia Internacional da Mulher, pelo terceiro ano consecutivo, o CORREIO homenageia grandes mulheres baianas. Através delas, estendemos a nossa admiração a todas aquelas enfrentam lutas diárias. Trabalham mais do que os homens e ganham menos, são chefes de família, acumulam diversas funções e ainda assim mostram que são verdadeiras guerreiras. Como se diz no bom baianês: são mulheres retadas. #RetadasNoCORREIO #Correio24h #CorreioDeFimDeSemana #DiaInternacionalDaMulher #8demarço #DiaDaMulher. Veja: 

Olívia Oliveira é uma baiana retada! Diretora do Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (Ufba), ela liderou a equipe de cientistas que identificou a origem do óleo vazado nas praias do litoral do Nordeste no ano passado. "Meu Deus, tivemos essa coragem de ir na frente de todo mundo falar que era de origem venezuelana, sabendo tudo o que podíamos ouvir. As pessoas se perguntavam: 'Será que é venezuelano mesmo?' Foi um desafio e eu nem pestanejei, estávamos no calor da análise. Eu me mostrei porque é ciência e há muita confiabilidade no laudo que produzimos", contou.

Sobrinha da freira baiana Irmã Dulce, Maria Rita Pontes, superintendente das Obras Sociais Irmã Dulce (Osid), é uma mulher retada! Formada em jornalismo, a carioca e baiana de coração foi uma das pessoas que mais lutou pela canonização da Santa Dulce dos Pobres, que aconteceu em 13 de outubro de 2019.

Nascida e criada em Juazeiro, no extremo norte da Bahia, a empreendedora Juliana Martins começou do nada, literalmente. Acredite: só com uma fruteira velha que ela usava para colocar ali os produtos de estética. No mais, tudo era emprestado, inclusive, as prateleiras da salinha que atendia suas clientes. Hoje, Juliana concorre com as próprias marcas de produtos de beleza que chegou a vender antes. Criadora da marca de cosméticos Juliage, a empreendedora faturou no último ano R$ 1 milhão e tanto e viu a venda dos itens crescer 400%, em comparação com o mesmo ano passado. “Sempre escutei a frase ‘quem essa menina do interior pensa que é? Ela pensa que vai chegar onde? Disseram que eu estava ‘viajando’ quando eu larguei o trabalho em um banco para trabalhar com estética. Minha salinha se tornou um grupo que fatura R$ 1,5 milhão junto com os cosméticos, a clínica de estética e a clínica escola que oferta cursos técnicos e livres também. Fui com a cara e a coragem”, diz ela.

“Tenho medo do racismo, tenho medo do machismo, mas não tenho medo de me expor”, diz a jornalista e humorista Maíra Azevedo, 39 anos, segura de si. Tia Má, como ficou conhecida, é verborrágica mesmo com a sociedade taxando mulheres como ela de “agressiva, problemática e barraqueira”. Retadíssima! Em entrevista ao CORREIO, a jornalista fala sobre preconceito, excesso de exposição, elogios na transmissão do Carnaval, fake news e relacionamentos abusivos, tema de seu novo livro Como se Livrar de um Relacionamento Ordinário (Agir | R$ 34,90 | 144 páginas). Além da obra, que será lançada nesta terça-feira (10), na Livraria Leitura do Shopping Bela Vista, Tia Má fala sobre autoestima e sobre ser “preta e gorda”. “Sempre entendi que a forma como me posiciono, meu caráter, sempre foi algo mais atraente que meu par de bunda que também é lindo”, gargalha.

Lorrane Manthele é uma baiana retadíssima! Mas recebeu o primeiro não quando ainda estava na barriga da mãe, Maria Helena Carolina. O pai abandonou ela, a mãe e um irmão. Depois, recebeu outros nãos: por ser pobre, por ser negra e por ser transexual. Por isso, a enfermeira Lorrane Manthele, 38 anos, formada pela Universidade Federal da Bahia (Ufba) - e também em Hotelaria, pelo Instituto Federal da Bahia (Ifba) - trabalha como vendedora ambulante, no bairro do Uruguai, para se manter. Na vizinhaça, Lorrane monta uma barraca onde vende artigos como blusas de times de futebol. "Como pode uma enfermeira trabalhar como ambulante?", questionou uma outra vendedora à reportagem, na Festa de Iemanjá, quando encontramos Lorrane. Ela trabalha em festas populares desde 2016. "Tem gente que não acredita", completou a enfermeira, naquele 2 de fevereiro. Na família, a maioria de Testemunhas de Jeová, a transfobia também existe. As portas de casa já foram fechadas para Lorrane. Quando tinha 18 anos, foi expulsa de casa pelo pai, o mesmo que abandonou a família com a esposa grávida e retornou para casa quando ela tinha 11 anos. Baiana retada, ela enfrenta uma luta diária para ser a mulher que é e sempre sentiu que fosse, apesar de todos os nãos.

Baiana retada, a autônoma Thaianá Alves, 31, moradora do bairro Santa Cruz e mãe de duas meninas, uma de 4 e outra de 10 anos, é a capa do #CorreioDeFimDeSemana. Thai, como ela prefere ser chamada, ficou desempregada no ano passado. A fome bateu à porta e, num desabafo com uma conhecida, achou a resposta das preces. “Conheci uma amiga que se sensibilizou com a minha história e conseguiu me empregar numa gráfica em que eu ganhava R$ 60 por semana”, lembra. Morando de aluguel, ela vivia, ao todo, com R$ 527 no mês, sendo R$ 240 do trabalho e outros R$ 282 da soma da pensão de uma das filhas com o Bolsa Família. Hoje, Thai trabalha com confecção e impressão de cartões de visitas, banners e convites de aniversário. Aprendeu tudo lá, sem nenhum curso, só de observar uma colega fazer. Mês passado, ela tomou um susto. A proprietária da gráfica decidiu deixar a Bahia e ia vender o ponto. “Eu não podia ficar desempregada de novo”, conta. Foi aí que ela decidiu alugar as máquinas e dizer para si mesma “Seja o que Deus quiser”, apostou. Agora, ela herdou os clientes e está conquistando novos. O próximo passo é entender como produzir camisas e copos.“Criar duas filhas sozinha não é fácil. Eu custeio casa, alimentação, escola. E ainda tem que cuidar da casa, fazer comida, dar carinho. A principal dificuldade para mim é dar atenção para elas, sei que elas precisam”, afirma."Preciso me desdobrar muito. Não tenho trabalho fixo, então um mês eu vendo uma coisa, outro mês vendo outra. Saio pelo bairro vendendo e a minha filha pequena vai no colo comigo porque mama e não tenho com quem deixar". É assim que a autônoma Marília Alves de Jesus, 34 anos, baiana retada, moradora do bairro Alto das Pombas, define sua rotina diária como trabalhadora, mãe de três crianças e responsável por chefiar sozinha a própria casa. Vivendo, em média, com R$ 35 por dia, Marília vende de tudo: de pasta de arear panela a batons e mini pizzas. Pelo Facebook e WhatsApp, ela anuncia para os clientes o que tem disponível no dia e sai à pé ou de ônibus para fazer as entregas. A habilidade para o comércio não veio de uma vocação, mas a partir da necessidade de criar os filhos, Isabel, de um ano, José Carlos, de 9, e Jaimson, de 12, todos nascidos prematuros. Ex-funcionária de franquias de restaurantes de shopping, Marília teve que dar seus próprios “pulos” quando se viu desempregada. Sem o apoio financeiro dos pais de duas das crianças e com aluguel para pagar, a mãe encontrou nela mesma a própria saída.

A cientista baiana Jaqueline Goes de Jesus, uma das coordenadoras da equipe brasileira que sequenciou o genoma do coronavírus em apenas 48 horas, é retada! “Me sinto privilegiada de ter conseguido chegar nessa etapa da vida. A ciência não é fácil. A gente passa por muitas situações complicadas que nos fazem querer desistir, mas, com o auxílio da família, persisti e estou aqui”, disse. A fisioterapeuta Isabela Oliveira Conde é uma mulher retadíssima! Ela sobreviveu a 68 facadas em ataque planejado por namorado. Ela conseguiu escapar, pediu socorro e, já no hospital, conseguiu denunciá-lo à polícia. O homem acabou preso. "Eu pedia tranquilidade e eles não deram uma trégua. Ele dizia: ‘Adianta logo isso aí. Essa mulher não para de falar. Agiliza aí pra ela morrer logo", contou. Baiana, a jornalista Jéssica Senra, apresentadora da TV Bahia, é uma mulher retada! Ela ganhou ainda mais visibilidade após apresentar o Jornal Nacional (JN), no último ano, e passar a integrar a equipe de folguistas do principal jornal do país. A âncora do Bahia Meio Dia (BMD) foi uma das responsáveis pela desistência do Fluminense de Feira em contratar o goleiro Bruno, graças a um vídeo que viralizou na internet criticando a decisão da diretoria do clube. "Sempre digo que essa luta não é só coisa de mulher, precisa envolver toda a sociedade. Afinal de contas, quando uma mulher é morta, é um filho que cresce sem a mãe, um pai que enterra uma filha, um irmão que sofre a perda de uma irmã. Homens e mulheres sofrem com o feminicídio", afirmou. Luzia Mota é a nova reitora do Instituto Federal da Bahia. Ela foi eleita para o posto de reitora em dezembro de 2018, mas o Ministério da Educação (MEC) protelou a oficialização dela no cargo por um ano. "Não me sinto intimidada com a tarefa que estamos assumindo aqui e nem me intimida a incerteza de uma conjuntura adversa e, diria, perversa. Não estarei sozinha e confio plenamente nos movimentos organizados”, afirmou. Essa é retada! Conhece uma jovem retada? Anna Luísa Beserra, criadora do Aqualuz, é um exemplo. O projeto venceu prêmio Jovens Campeões da Terra, da ONU. A ideia de Anna Luísa possibilita tratamento seguro e barato da água e já beneficiou mais de 1,2 mil famílias no semiárido. Ana Verônica Bispo dos Santos, 53 anos, conhecida como Ana de Xangô, é a sucessora de Mãe Stella de Oxóssi no terreiro Ilê Axé Opô Afonjá, que fica no bairro São Gonçalo do Retiro, em Salvador. Ela foi eleita após jogo de búzios feito pelo Babalorixá Balbino Daniel de Paula, do terreiro Ilê Axé Opô Aganju, que fica em Lauro de Freitas. Há 20 anos foi iniciada no candomblé, no próprio terreiro que agora comanda, um dos mais importantes e famosos do Brasil. Hoje, a Iyalorixá é responsável por comandar o terreiro, alimentar a casa, e fazer todas as obrigações religiosas. “Não esperava, mas por obediência e necessidade me tornei filha de santo”, fala. Retadíssima! Carla Akotirene é doutoranda em Estudos de Gênero, Mulheres e Feminismos pela Ufba e autora de Interseccionalidade e Ó Paí Prezada!. Ainda como Carla Adriana da Silva Santos, ela trabalhou como cordeira e segurança do bloco afro Ilê Aiyê na década de 90. Em fevereiro deste ano, retornou à Senzala do Barro Preto como Carla Akotirene, homenageada especial da 41ª Noite da Beleza Negra, ao lado de Maíra Azevedo (Tia Má) e Leo Kret, outros nomes importantes na luta pelos direitos das mulheres negras. "Não tinha a menor pretensão de hoje ser uma escritora, terminando um doutorado, que defendo em maio. Eu que durante a minha vida recebi vários convites para trabalhar em prostituição fora do país”, conta e relembra a pesquisadora sobre como a sexualização do seu corpo, enquanto mulher negra, sempre foi uma questão enfrentada. Dona de casa e mãe do adolescente agredido por PM no subúrbio de Salvador, Karina Barros é uma mulher retada! “Eu estou segura, mas continuo magoada. Meu coração está sangrando. Dói muito essa situação”, disse. Retada, Léo Kret é mulher trans, ativista LGBTQIA+, dançarina e estudante de Direito. "Meu empoderamento vem de dentro de mim. Quando me olho no espelho, reconheço quem sou e a força que tenho", afirma. Fernanda Júlia, conhecida como Onisajé, é a primeira diretora negra a assumir uma peça na escola de teatro da Ufba. 'Pele Negra, Máscaras Brancas' foi encenada em Salvador, em 2019. "É triste ser a primeira. Tem muita mulher preta antes de mim, que me inspira, que me orienta e que fez com que eu escolhesse ser encenadora”, afirmou. Retada!

Mais conhecida como A Dama do Pagode, Allana Sarah é pagodeira e foi revelação do Carnaval 2020. Comandando a banda de nome homônimo, ela fez sete shows na folia momesca na Bahia. Com seu black, vozeirão e atitude rock and roll, chama a atenção e é um dos grandes fenômenos dos paredões de Salvador. Quem dormiu não viu quando ela, rapidinho, passou de dançarina da laje no Universo Axé, pra backing da banda O Pega e, após shows em barzinhos do Cosme de Farias e Nordeste de Amaralina, sua conversão na Dama primeira. A alcunha surgiu numa resposta à canção que anunciava que “chefe é chefe”. Replicou com “Dama é dama”, e o título pegou. ‘Ai pai, pirraça’ é a primeira música dela que pegou geral, com Márcio Victor na esteira dos que cantam.

Tertuliana Lustosa, vocalista da banda A Travestis, é mulher trans, pagodeira e camelô. Ela é retada! Nascida em Corrente, interior do Piauí, e criada em Salvador, ela fez Bacharelado em História da Arte pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj). Com diploma na mão, retornou a Salvador e acabou entrando numa estatística cruel: segundo levantamento da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), 90% das pessoas trans no Brasil recorrem à prostituição como renda por falta de oportunidades no mercado formal de trabalho. Mulher trans, Tertuliana não conseguiu escapar dessa realidade. Como não achou outra opção, virou camelô e vende brigadeiros na praia do Porto da Barra.

Ana Marcela Cunha é nadadora e tetracampeã mundial de maratonas aquáticas. Ela foi eleita a melhor nadadora do mundo na categoria. Em 2019, conquistou dois ouros no Mundial de Gwangju, na Coreia do Sul, e outra nos Jogos Pan-Americanos de Lima, no Peru. Além disso, venceu cinco etapas do circuito de maratonas aquática. Ela mira uma medalha inédita na Olimpíada de Tóquio. "'A gente sempre pode um pouco mais", pontua. Retada!

As Ganhadeiras de Itapuã, tradicional grupo de resgate, valorização e fortalecimento da cultura popular. No Carnaval deste ano, foram homenageadas no enredo da escola de Samba Unidos do Viradouro, no Rio de Janeiro. A escola venceu o Carnaval do Rio. Retadas!

Primeira e única mestra de torra da Bahia, a barista Karla Lima está à frente da torra do Café dos Três. "Os meninos dizem que sou a Smurfette do café. Não me incomoda nadinha, sou loura, linda, exclusiva. Eles usam isso pra incomodar, mas não incomoda em nada", afirma a retada.

Mais uma mulher retada! Jeane Tavares é psicóloga e professora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. Ela trabalha saúde mental da população negra e sempre reflete sobre este problema estrutural. "Apresentamos maiores níveis de estresse crônico que a população branca em todos os contextos, sendo que mulheres negras referem mais estresse que homens negros", afirma em artigo.