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Sobram tiros, falta vida: violência em Tancredo Neves tira direitos básicos de moradores

Escolas suspenderam aulas, e mais de 2 mil alunos são prejudicados

  • Foto do(a) author(a) Wendel de Novais
  • Wendel de Novais

Publicado em 14 de abril de 2023 às 05:00

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: Nara Gentil/CORREIO
Nara Gentil/CORREIO por Violência afeta vida de moradores

Comprar pão, ir ao mercadinho, passar pela praça ou ficar na porta de casa: coisas comuns, que, há uma semana, não são parte da rotina noturna de quem vive no bairro de Tancredo Neves, em Salvador. Ainda que os ônibus tenham voltado a circular nesta quinta-feira (13) e o policiamento tenha se intensificado, o medo fecha a porta para atividades normais enquanto há um conflito entre facções rivais. E por causa disso uma operação policial foi montada por tempo indeterminado.

Ir para faculdade? Nem pensar. Uma estudante universitária conta que chegou a perder boa parte das aulas na semana passada e precisou sair do bairro para não repetir as ausências nesta semana. Tudo isso porque a ida até é tranquila, mas o retorno pode acontecer em meio a confrontos e tiroteios entre facções ou operações policiais.

"Eu faço faculdade à noite, na Paralela. De quarta a sexta passada, perdi aula porque não dava pra sair. Esta semana eu fui para casa da minha tia, em outro bairro, para conseguir ir e voltar sem correr risco de passar no meio de um tiroteio. Se não fizesse isso, seriam mais três dias sem estudar", lamenta ela, sem revelar o nome por medo.

Quem não é estudante também tem a vida afetada. Outro morador, que só consegue chegar em casa no meio da noite, tem precisado pedir ao patrão para sair do serviço mais cedo. Isso para evitar o final da noite, quando os confrontos violentos são mais comuns. Apesar da repercussão, ele explica que não há muita compreensão por parte de quem o libera."Geralmente, chego aqui por volta das 21h30 porque trabalho na região do Itaigara e só saio às 20h. Agora, tô pedindo para sair mais cedo e enfrentando cara feia da chefia, que não entende, acha que é besteira. Nessa semana, tô largado às 19h e chego correndo pra dentro de casa", fala ele, que também prefere não se identificar.A maioria das lojas que funcionam durante o dia segue aberta. Alguns lojistas, porém, afirmam ter reduzido o tempo que estão abertos por conta de toda situação. Mais do que isso, apontam que confrontos ou operações que geram tiroteios fazem o movimento cair.

"Nesses dias, a gente fica mais recluso em casa. Fico na torcida pra não ter nenhuma emergência porque sair é um risco. Eu mesmo tenho uma loja, que tem ficado mais fechada do que aberta. Vários dias não abri e quando fiz, vi o movimento ficar mais curto. Por segurança, eu também não deixo ficar muito tarde, a loja não chega a passar das 18h aberta", conta um comerciante. 

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Sem direito à cidade Para além dos problemas individuais, há desdobramentos coletivos. Segundo a Secretaria de Educação do Estado da Bahia (SEC), os colégios estaduais Helena Magalhães e Edvaldo Fernandes tiveram as aula suspensas nesta quinta-feira. No total, as duas instituições somam mais de 2 mil estudantes. 

Larissa Neves, pesquisadora da Rede de Observatórios da Segurança, destaca que os moradores das periferias são colocados na linha de frente e ficam expostos à violência derivada da guerra das drogas e operações contra grupos criminosos. 

"Por isso, esses moradores precisam se proteger, abrindo mão do básico. Quando a pessoa perde o direito de permanecer no território, o direito de ir e vir, ela é afetada e perde também o direito à cidade", explica ela, que também atua como pesquisadora na Iniciativa Negra. 

Larissa pontua ainda que, mais do que escolas fechadas, mudança de rotina e preocupação com o bem-estar, períodos assim são sinônimos de inseguranças que não são trazidas apenas por grupos criminosos, mas também pelas forças policiais que atuam nestes lugares."Em nome dessa guerra, o Estado justifica uma série de violações de direitos, principalmente, contra jovens de favela e periferia. Porém, essa guerra não é de quem reside nesses territórios. Apesar de não ser quem declara a guerra, são essas moradores que morrem por conta dela", salienta Larissa. O professor de estratégia e gestão pública Sandro Cabral, que atua no Insper e na Ufba, avalia que os criminosos estão fortemente armados e que há uma incapacidade de combate por parte da segurança pública.

"Como isso afeta uma população marginalizada, não há grandes repercussões. Imagina isso na Barra, sem ninguém conseguir entrar e sair em determinado horário. Porém, o problema está na parte da cidade que é 'invisível'. É incapacidade dos governos de forma geral. Se fosse na Barra, duraria tanto tempo? Não sei, acho que não", diz o professor.

Estatística O Instituto Fogo Cruzado, que monitora a violência armada em Salvador e Região Metropolitana (RMS), indica que, nos primeiros 100 dias de 2023, houve 396 tiroteios que deixaram 294 pessoas mortas e 71 feridas. A média, até aqui, é de quatro pessoas baleadas por dia.

Somente a capital tem 284 tiroteios, 199 mortos e 52 feridos. Nos números gerais, as forças de seguranças são os principais vetores de baleados. São 109 pessoas  (30%) atingidas durante ações e operações policiais. 

A Polícia Militar da Bahia foi procurada para responder sobre apreensões e prisões realizadas em Tancredo Neves durante a operação, mas respondeu que só informará os resultados ao final da ação no bairro.