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Conheça Thaís Virgínia, a mulher que perdeu a voz há três anos

Estudante de 24 anos tem disfonia espasmódica e precisa de cirurgia para voltar a falar

  • Foto do(a) author(a) Milena Hildete
  • Milena Hildete

Publicado em 6 de maio de 2018 às 05:26

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: Foto: Marina Silva

Era final do ano de  2015. A estudante Thaís Virgínia da Costa, então com 21 anos, apresentava seu último trabalho do curso técnico de Análises Clínicas quando percebeu que alguma coisa estava errada com a sua voz. No meio da apresentação de 40 minutos, ela já não conseguia mais completar uma frase. Por mais que se esforçasse, as palavras saiam entrecortadas. Ninguém conseguia lhe entender. Ela não conseguia falar. 

Naquela tarde, a jovem teve que se calar. Foi a primeira vez que foi silenciada pela disfonia espasmódica – doença que provoca um distúrbio na voz, dificultando a projeção da fala, e caracterizada por contrações involuntárias nos músculos da laringe. A vida de Thaís mudou e um silêncio angustiante passou a ser seu companheiro.

Thaís tem um recado para você; asssita:

Passados três anos, hoje aos 24 anos, com mais de 80% da capacidade vocal comprometida pela disfonia, Thaís não consegue se comunicar com a fala. Não emite palavras ou frases. A doença afetou tanto a sua rotina que ela não vai mais para a faculdade de Recursos Humanos na Unijorge. Também deixou para trás relacionamentos amorosos e de amizade, além do emprego de vendedora na loja da tia. Só costuma sair de casa, no bairro de Cajazeiras, em Salvador, para o tratamento no Hospital das Clínicas, no Canela. Qualquer contato com o mundo externo exige de Thaís esforço e a expõe a constrangimentos. 

As pessoas com quem ela tem contato questionam, perguntam e querem uma resposta para saber o que aconteceu. “Eu quero falar. Não quero que as pessoas me perguntem ou fiquem questionando o que aconteceu com minha voz. Quero ser ouvida. Me dói ver que eu não consigo mais ter a minha vida. Eu não tive como ficar no meu emprego, porque trabalhava diretamente com vendas. Na faculdade, eu ganhei uma bolsa, mas não suportei ficar. Quanto mais os semestres iam passando, eu via que não tinha como apresentar os trabalhos e nem me comunicar com os colegas”, argumenta a estudante em entrevista ao CORREIO pelo WhatsApp.  Thaís se comunica com o mundo através das redes sociais  Foto: Marina Silva/CORREIO É em uma cirurgia de Neuromiectomia, um método que retira e reconstrói parte do músculo das cordas vocais, que a jovem deposita a esperança de voltar a falar. Para isso, está fazendo uma vaquinha virtual, até o dia 16 de junho, para reunir a quantia de R$ 40 mil e realizar a cirurgia. 

O procedimento é realizado no Hospital Albert Einstein em São Paulo.“Com a cirurgia, vou ter como voltar a falar depois de pouco tempo. Conheço algumas pessoas que já fizeram, mas não tenho como pagar pra ir fazer, porque não tenho nem como pagar uma consulta com os especialistas que são caríssimos. Eu não tenho dinheiro. Minha vida parou junto com a minha voz. Por isso, decidi fazer a vaquinha e pedi ajuda das pessoas pela internet”, explica a jovem por mensagem de texto.Por ser uma opção de tratamento para uma doença rara – a patologia atinge 1 a cada 100 mil pessoas no mundo – a cirurgia só foi feita em 70 pessoas no país. De acordo com a professora de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Natasha Andrade Braga, a disfonia espasmódica está associada ao sistema nervoso central. “Não existe uma causa definida para a doença, mas a gente acredita que tenha um fator neurológico junto com psicológico. A disfonia espasmódica não é uma doença hereditária”, explicou.  Ainda segundo a professora, a doença costuma atingir mais mulheres, entre 30 e 60 anos. 

Descoberta  Thaís passou quase dois anos sem saber a origem do seu problema com a ausência da voz. Foram três otorrinolaringologistas, três fonoaudiólogas, psicólogas e psiquiatras, mas ninguém conseguia descobrir o que a estudante tinha ou o que havia lhe tirado a voz.

Com a ajuda da família, a jovem chegou a fazer um plano de saúde para facilitar o acesso aos médicos, mas não adiantou. Só em setembro do ano passado, durante uma consulta com uma fonoaudióloga, em Brumado, Centro Sul do estado, Thaís foi diagnosticada com a disfonia espasmódica.

Ela conta que saiu do consultório desesperada, quando soube que tinha uma doença grave e com tratamentos caro. “Eu já saí de lá chorando muito, porque pensei que nunca mais poderia falar novo. E fiquei me perguntando porque essa doença tinha me escolhido. Eu já pensei que nunca mais ia ouvir o som da minha voz”, relembrou ela.

A estudante conta que ainda consegue falar algumas palavras no início da manhã, no entanto, ao longo do dia a voz 'sumindo'. "Quando acordo, consigo falar, porque acho que as cordas vocais ficam descansadas. De noite, eu não falo, porque fica incompreensível e eu me esforço muito" explica.

O CORREIO esteve na manhã da última quarta-feira (2) na casa de Thaís. Ela coloca muita força pra falar. A voz é forte e tensa. E as palavras ficam entrecortadas na frase. Isso dificulta ouvir o que ela diz. Grande parte da entrevista foi feita na semana anterior por mensagens de texto, via WhatsApp. Ruan Cerqueira, sobrinho de Thaís, é a única pessoa que entende os sons que ela emite dentro de casa Foto: Marina Silva/CORREIO Desde que descobriu a disfonia, Thaís que, já era tímida, ficou ainda mais retraída. Sua tia, a comerciante Edna Cerqueira, com quem mora com mais um tio e um primo, diz que se preocupa com o isolamento da sobrinha. “Ela se fechou muito com as pessoas. Thaís gostava muito de sair pra festa e, agora,  consegue sair só com gente da família mesmo. Quando alguém pergunta sobre a voz, ela começa a chorar. Tenho certeza que essa doença afetou ela até na questão de ter um relacionamento. Me preocupa muito ver minha sobrinha assim, porque ela era muito ativa”, lamenta.

Atualmente, a jovem só mantém contato via redes sociais. É nos aplicativos de mensagem que ela conversa com outras pessoas, também diagnosticadas com disfonia espasmódica. É por lá, ainda, que pesquisa tudo sobre a doença. “Depois que eu entrei no grupo de WhatsApp, vi que tinha outras pessoas como eu, que já conseguiram fazer a cirurgia e que conseguiram tocar a vida”, conta. O grupo reúne 15 pacientes de todo o país.

Uma dessas pessoas é o estudante de Engenharia Civil Joab Paiva, 35 anos. Morador de Vitória da Conquista, ele é um dos poucos homens que foi diagnosticado com a doença - já que a incidência é maior em mulheres. O universitário, que já fez a cirurgia, descobriu a disfonia em 2015, enquanto se apresentava em um evento.“Na época eu trabalhava com música e cantava toda semana. Quando eu comecei a sentir os sintomas, procurei médicos, mas passei seis meses em busca de uma resposta sobre o que eu tinha. Hoje, depois da cirurgia, eu estou com 70% da minha voz", comenta ele, em áudio enviado pelo WhatsApp.Tratamento pode ser feito até com botox Segundo a fonoaudióloga Carolina Lacorte, a disfonia pode ser de três tipos. A primeira é a adutora, que atinge 90% dos pacientes diagnosticados com a doença, e acontece quando o paciente não tem controle no fechamento da prega vocal. Já a segunda, a abdutora, ocorre quando não há o controle muscular na abertura das pregas vocais. 

Ainda de acordo com Lacorte, a terceira e última classificação da disfonia é a mista. Nesse caso, o paciente não possui nem o controle para abrir nem para fechar a prega vocal. 

“A adutora a gente tem espasmos ou movimentos inesperados que levam as pregas vocais a se fecharem com mais força. A voz, nesse caso, é com mais força, tensa e estrangulada. Na abdutora, os movimentos involuntários levam as pregas vocais a abrirem durante a fonação. A voz é mais soprosa, com mais ar. A mista envolve características das duas vozes”, explica. 

Os sintomas da doença são evidentes na voz do paciente. Conforme a Carolina, a voz tensa, com quebras de sonoridade e com esforço na hora de falar são alguns sinais da disfonia espasmódica. Ao apresentar esses sintomas, a pessoa deve ir ao fonoaudiólogo e ao otorrinolaringologista. 

Na avaliação do fonoaudiólogo, o paciente vai realizar atividade fonatória, como por exemplo falar vogais em voz alta. Já a avaliação com o médico é feita através de um exame, chamado de nasofibrolaringoscopia - utilizado para visualizar a laringe do paciente. 

O paciente que for diagnosticado com a doença tem duas opções de tratamento, afirma a professora da Ufba, Natasha Braga. O primeiro é através da aplicação de toxinas botulínicas (botox) na região. A substância é usada para diminuir o efeito da contração do músculo nos pacientes com disfonia. 

Cada ampola dessa toxina específica para o trabalho vocal custa R$ 1,2 mil. Já a aplicação com os honorários  dos médicos chega a até R$ 4 mil.

Já na cirurgia, opção recomendada para Thaís por conta da evolução da doença, os médicos retiram e queimam o músculo envolvido na situação. Nesse caso, a cirurgia pode dar certo em 60% dos casos - sendo que 33% necessitam da segunda intervenção e 7% da terceira cirurgia, de acordo com dados do Ministério da Saúde.  Thaís batalhou por dois anos em busca do diagnóstico correto Foto: Marina Silva/CORREIO Como é feita a cirurgia que pode salvar Thaís? A cirurgia que Thaís precisa fazer - a Neuromiectomia do MúsculoTireoaritenóideo -  foi feita pela primeira vez por um médico brasileiro, o professor da Universidade São Paulo (USP),  Domingos Tjusi. Ele criou a  técnica, em 2002, para pacientes que não respondem mais a toxina botulínica ou não desejam mais realizar a aplicação periódica da medicação.

A técnica cirúrgica visa diminuir cerca de metade do músculo afetado, na sua parte lateral, para produzir o enfraquecimento dessa musculatura; ao mesmo tempo, realiza-se a neurectomia do ramo tireoaritenoideo do nervo recorrente para diminuir a chance de reinervação do músculo remanescente. 

Não há atualmente cura total para a disfonia espasmódica. Os tratamentos apenas ajudam a reduzir os sintomas do distúrbio - a exemplo da cirurgia que Thaís precisa fazer para voltar a recuperar parte da capacidade vocal. 

A cirurgia corta um dos nervos das pregas vocais (o nervo laríngeo recorrente) o que melhora a voz de muitas pessoas atingidas pela disfonia espasmódica. Contudo, essa melhora é geralmente temporária, podendo durar de meses a anos, segundo estudo realizado pelo instituto de saúde dos Estados Unidos - o National Institute on Deafness and Other Communication Disorders - NIDCD. 

Com o pequeno afastamento das pregas das cordas vocais, de não mais que 1mm, ocorre um alívio na pressão de ar necessária para a emissão da voz - que fica menos tensa e confortável para o paciente.  

O tempo de recuperação é variável de acordo com o paciente. É necessária, após a cirurgia, a continuidade do tratamento com acompanhamento de equipes de fonoaudiólogos e também de otorrinolaringologistas. 

Se você quiser ajudar Thaís a arrecadar os R$ 40 mil necessários para fazer o procedimento cirúrgico você pode acessar o site através deste link, fazer sua doação e auxiliar ela falar de novo. 

Entenda a doença de ThaísO que é?  A disfonia espasmódica (DE) é um distúrbio vocal caracterizado por voz tensa-estrangulada, com quebras de sonoridade e que compromete a comunicação do indivíduo.

Quem tem? A disfonia espasmódica pode afetar qualquer pessoa. Os primeiros sinais deste distúrbio são vistos mais freqüentemente em pessoas com idade entre 30 e 50 anos. As mulheres parecem ser mais afetadas do que os homens. A  patologia atinge 1 a cada 100 mil pessoas no mundo 

Ajuda? A Secretária da Saúde do Estado da Bahia (Sesab) informou que não tem dados sobre casos de disfonia na Bahia. O  único lugar que realiza a aplicação de botox, de graça, em Salvador, é o Hospital das Clínicas, no Canela, de acordo com a indicação e avaliação feita pela equipe responsável pelos pacientes. Informações pelo telefone (71) 3283-8194. O HC, mantido pela Ufba, tenta comprar os equipamentos para fazer a cirurgia. 

*Com supervisão do chefe de reportagem Jorge Gauthier