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Hilza Cordeiro
Publicado em 2 de outubro de 2019 às 05:00
- Atualizado há 2 anos
A identificação de um parasita que infectou mais de 100 pessoas no Nordeste, sobretudo em Sergipe, já deixa em atenção a rede hospitalar de referência da Bahia para casos sugestivos relacionados à leishmaniose. O micro-organismo, identificado pela primeira vez há dez anos, provoca uma doença que atinge o baço, o fígado e causa feridas na pele, podendo provocar sangramentos em casos mais graves. Ele vem sendo estudado por pesquisadores de três universidades do país.>
Para o pesquisador Roque Pacheco Almeida, da Universidade Federal de Sergipe (UFS), um dos responsáveis pela identificação do parasita em Sergipe, a proximidade geográfica do estado vizinho com a Bahia é indicada como uma premissa de observação, já que existe a possibilidade de que o micro-organismo possa se disseminar aqui.>
Almeida chama a atenção para o trânsito de pacientes baianos no Hospital Universitário da UFS (HU), onde o parasita foi descoberto. Segundo ele, moradores da região norte da Bahia, principalmente de cidades como Olindina, Cipó e Inhambupe, costumam ser atendidos na unidade. Um caso suspeito da doença foi registrado e um paciente baiano, afirma ele.>
A Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab) informou que não há registros, até o momento, de casos no estado. O Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde (Cievs) solicitou à rede hospitalar de referência ocorrências de entrada de casos sugestivos relacionados à leishmaniose. A pasta aguarda por uma resposta. Pesquisador da Universidade Federal de Sergipe, Roque Pacheco Almeida ajudou a identificar parasita (Foto: Divulgação) Descoberta As investigações iniciais a respeito do micro-organismo foram publicadas nesta segunda-feira (30) na revista científica Emerging, por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Universidade de São Paulo (USP-Ribeirão Preto) e da UFS.>
De acordo com o professor Roque Pacheco Almeida, um paciente de 60 anos que morreu em 2011 continha o parasita no organismo. Ele recebeu tratamento para calazar, mas não reagiu ao tratamento usual - essa é uma das característica do parasita.“Como nós tratávamos o calazar [leishmaniose visceral], pensávamos que tudo era isso, mas, nesse paciente, a doença evoluiu de forma atípica e observamos que a pele dele estava repleta de parasitas”, recorda.A partir daí, o professor de Medicina intuiu que se tratava de algo diferente e iniciou uma colaboração com a UFSCar e a USP-Ribeirão Preto para estudar o genoma do parasita. >
Descobriu-se até o momento que, nos testes com camundongos, estes animais reproduziram as mesmas manifestações clínicas do paciente que faleceu em 2011. Resta confirmar se uma nova doença infecciosa está surgindo.>
Calazar? De acordo com o estudo, a leishmaniose visceral, ou calazar, é o tipo mais grave da doença e o Brasil responde por mais de 90% dos casos relatados anualmente na América Latina.>
Professor do Departamento de Medicina da UFS, Almeida diz que, ultimamente tem visto casos graves de calazar que exigem internamento em UTI e que não respondem aos tratamentos. Mas, para ele, ainda não dá para dizer que estes são casos de contaminação pelo parasita.>
“Atualmente, não temos ferramentas para dizer imediatamente. A gente ainda não consegue fazer isso direto no paciente. Quando o recebemos, temos tratado como calazar e só depois teremos essa confirmação se era ou não”, explica Almeida. (Foto: Divulgação) Medicação Hoje, o Brasil ministra dois tipos de medicamentos contra a leishmaniose visceral: o Glucantime - em pacientes com mais de 6 meses e menos de 60 anos - e o Ambisome, em menores de 6 meses e maiores de 60 anos. Segundo o estudo, são poucos os medicamentos para a leishmaniose. E, como o novo parasita não reage aos tratamentos, isso pode agravar o controle da doença. Por isso, os pesquisadores chamam a atenção no documento para a urgência de estudos de novos fármacos.>
Segundo Almeida, as modificações da vida moderna podem vir interferindo nestes últimos índices:“O crescimento das cidades tem provocado a invasão dos ambientes naturais dos mosquitos e eles se alimentam muito do cão, que é o animal de estimação, que adquire fácil a doença e não responde ao tratamento. Como nosso clima também tem piorado, isso interfere na propagação do mosquito, que gosta das nossas temperaturas tropicais”, explica o professor.Sem surto Na Bahia, a Secretaria de Saúde do Estado (Sesab) informou que não há registros da doença. O Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde (Cievs) de Sergipe informou à Sesab que os dados divulgados pelo estudo publicado são de uma série histórica de 2011 até 2019 e que Sergipe não está em surto.>
Ainda conforme o órgão, acredita-se que essa doença seja decorrente de um novo tipo de leishmaniose ou de uma mutação do vetor transmissor da doença e que não há motivo para alarme ou pânico, considerando o perfil epidemiológico atual de Sergipe. >
A Secretaria Municipal de Saúde de Salvador (SMS) também informou que na capital baiana não há nenhum caso registrado de calazar em animais ou humanos. De acordo com a bióloga Eliaci Costa, subgerente do Centro de Controle de Zoonoses (CCZ), atualmente, quando algum cidadão notifica um caso suspeito, o CCZ vai até o local, faz um teste rápido para ver se é reagente e envia amostra para o Lacen estadual.>